Flamengo joga de igual para igual, mas Liverpool leva o Mundial na prorrogação

 

Capa da Folha da Manhã de hoje (22)

 

O sonho acabou. Foi como Paul McCartney anunciou o fim dos Beatles, referência maior da cidade de Liverpool. Desde o fim de agosto, quando o Flamengo embalou de vez no Brasileirão e na Libertadores da América, um sonho era cantado por 42 milhões de almas: “E agora o seu povo/ Pede o mundo de novo”. Mas da maneira como se deu ontem (21) a decisão do Mundial de Clubes, quem sonhou pode se orgulhar da realidade. Desde 2005, quando passou a ser disputado pelos campeões de todos os continentes, o time carioca foi o primeiro a jogar de igual para igual a final contra o campeão da Europa. O título foi vencido com justiça pelo Liverpool, que criou mais chances de gol, mas teve menos posse de bola. O placar final de 1 a 0 foi alcançado no único recurso que os sul-americanos passaram a adotar para tentar vencer os europeus: o contra-ataque. E só na prorrogação, com domínio de lado a lado no movimentado empate sem gols dos 90 minutos regulamentares.

A realidade do jogo se imporia antes do seu início, no Estádio Internacional Khalifa, em Doha, no Qatar. Depois de especular que poderia poupar titulares para o Campeonato Inglês pelo qual volta a campo nesta quinta (26), o treinador alemão Jürgen Klopp desfez o mistério. Contra o Flamengo, o campeão da Europa não ousou entrar em campo sem sua força máxima. Como havia feito contra o mexicano Monterrey, na semifinal de quarta (18), quando escalou só quatro titulares e quase se complicou. Venceu por 2 a 1 com o gol de Firmino, literalmente aos 45 do segundo tempo. Ontem, o atacante brasileiro seria novamente o herói do time inglês.

Logo no início da partida, a aposta de Klopp contra o Flamengo pareceu que conduziria a um massacre. Semelhante aos 4 a 0 que o Barcelona de Messi impôs ao Santos de Neymar em 2011. Até a final de ontem, tinha sido o último campeão sul-americano a tentar jogar de igual para igual a final de um Mundial contra o campeão europeu. Oito anos depois, o começo do Liverpool foi arrasador. Nos primeiros cinco minutos da partida, criou três chances de gol em conclusões de Firmino, do meia guienense Keita e do lateral-direito Alexander-Arnold.

Foi só a primeira impressão. E não ficou. Com o mesmo autocontrole que teve para superar todos os obstáculos na conquista da Libertadores e do Brasileiro, o Flamengo encaixou a marcação para impor seu jogo ao Liverpool na maior parte do primeiro tempo. Sobretudo na velocidade de Bruno Henrique, penetrou com perigo pelo menos oito vezes na área do time inglês. Mas não colocou o goleiro brasileiro Alisson para trabalhar. Como não trabalhou Diego Alves.

A segunda etapa começou como a inicial. Logo no primeiro minuto Firmino voltou a receber um lançamento longo e quase abriu o placar. Dentro da área, ele deu um chapéu no zagueiro Rodrigo Caio com a direita e bateu de canhota. A bola explodiu na trave e cruzou a linha do gol. Aos 7, Alisson faria sua primeira grande defesa, em chute rasteiro de Gabigol dentro da área, após passe de Éverton Ribeiro. Aos 23, o centroavante flamenguista colocou o goleiro do Liverpool para trabalhar de novo, ao bater de puxeta um cruzamento de Bruno Henrique. Mas a defesa mais difícil no segundo tempo foi de Diego Alves. Aos 40, ele voou para trocar de mão e espalmar por cima do travessão o chute venenoso do meia Henderson, de fora da área.

 

Lance de Rafinha sobre Mané, que o juiz marcou pênalti depois anulado com o auxílio do VAR (Foto: Kai Pfaffenbach – Reuters)

 

Aos 45 da etapa final, o árbitro catariano Al Jassim Abdulrahman chegou a marcar um pênalti de Rafinha sobre o incansável atacante senegalês Mané, quase na linha da área. Orientado pela cabine do VAR, ele reviu o lance. Não marcou nem falta, considerando que o lateral-direito do Flamengo tocou primeiro na bola, anulando o cartão amarelo que havia lhe dado.

Veio a prorrogação. Que definiria o jogo aos 8 minutos. Após Filipe Luís tentar uma rara subida pela esquerda, o contra-ataque foi iniciado por Henderson. Ele acertou lançamento a Mané, que serviu à penetração de Firmino pela área. O brasileiro deslocou Rodrigo Caio e Diego Alves, no mesmo corte para dentro, e bateu para abrir o placar. Que quase foi ampliado dois minutos depois, em chute de fora da área do craque egípcio Salah, obrigando Diego a outra defesa difícil.

A melhor chance de empatar e levar à decisão dos pênaltis veio a menos de dois minutos do fim, quando Vitinho cruzou da direita para o jovem Lincoln, que entrara depois do gol  no lugar de Gérson. Com apenas 19 anos, coube a ele a melhor chance do Flamengo na final do Mundial. Mas, sem marcação, chutou dentro da área por cima do gol de Alisson.

Muitos lembraram que o Liverpool só dominou o jogo no segundo tempo depois que o treinador português Jorge Jesus substituiu Arrascaeta por Vitinho, e Éverton Ribeiro por Diego Ribas. Não foram substituições felizes, como haviam sido em outras oportunidades. Na coletiva, tentou justificar: “Fomos mexendo porque havia alguns jogadores com fadiga de jogo”. Sobre o saldo do time que assumiu em junho, o técnico disse: “Não foi uma temporada inesquecível, mas foi uma temporada brilhante”. Desde o Santos de Pelé, em 1963, o time de Jesus foi o primeiro a vencer a Libertadores e o Brasileiro no mesmo ano.

Em dezembro de 2019, o Liverpool conquistou seu primeiro Mundial. E se igualou ao Flamengo. Foi só 38 anos depois de tentar fazê-lo pela primeira vez. Quando levou uma goleada de 3 a 0 do mítico time de Zico. Que permanece como a temporada mais brilhante dos 124 anos da história rubro-negra.

 

(Foto: Marcelo Cortes – Flamengo)

 

Capaz de fazer com que o zagueiro Van Dijk, estrela holandesa do clube inglês, custe mais do que todo o time sul-americano batido na final do Mundial por 1 a 0, o futebol de hoje pode ser determinado pelo poder econômico. Mas parece ainda incapaz de cobrar juros àquele “dezembro de 81”.

No que merecerá lembrança de 2019, aos torcedores contra e a favor, é calcular o que ficou para além do sonho do Flamengo.

 

 

Página 12 da edição de hoje (22) da Folha

 

Publicado hoje (22) na Folha da Manhã

 

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Este post tem um comentário

  1. Cesar Peixoto

    Sou vascaíno mas fiquei triste com a derrota do flamengo, foi um jogo de alto nível valeu a pena assistir, se o flamengo virasse o jogo seria duas conquistas a taça e a bola de ouro. Parabéns toda nação rubro-negra.

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