Por Aluysio Abreu Barbosa, Cláudio Nogueira, Matheus Berriel e Ícaro Abreu Barbosa
“O Ceperj parece um misto de rachadinha e Mensalão”. Foi assim que o estrategista político Orlando Thomé Cordeiro definiu o escândalo que explodiu no governo do RJ. E que, segundo o Ministério Público, gerou mais de R$ 220 milhões em saques na boca do caixa por funcionários fantasmas, com os nomes citados de 10 dos 13 vereadores de oposição de Campos, além do deputado estadual Rodrigo Bacellar (PL). Orlando foi o entrevistado da manhã de ontem no Folha no Ar, quando analisou a política goitacá, dividida entre Garotinhos e Bacellar. E apostou que seus dois líderes, o ex-governador Anthony Garotinho (União) e Rodrigo, serão, respectivamente, o deputado federal e o estadual mais votados da região. Na eleição a senador, ele analisou o favoritismo de Romário (PL) nas pesquisas, assim como de Cláudio Castro (PL) e Marcelo Freixo (PSB) a governador. Mas, para ele, o adversário mais difícil de ser batido por Castro no segundo turno seria Rodrigo Neves (PDT), ex-prefeito de Niterói. Projetou também o segundo turno na eleição presidencial. E, mesmo reconhecendo a recuperação de Jair Bolsonaro (PL) nas pesquisas, acredita na vitória final de Lula (PT), numa batalha entre rejeições.
Política de Campos entre Garotinhos e Bacellar – Para quem é de fora da região e não acompanha, a figura de (Rodrigo) Bacellar é uma figura que não existia. O Garotinho já tinha, nos últimos 20 anos, se projetado regional e nacionalmente. Então, quando se falava de política de Campos para nós, aqui da Região Metropolitana e para fora do estado do Rio, a associação imediata era com o Garotinho. A ascensão dos Bacellar, por intermédio da sua figura mais proeminente hoje politicamente, que é o Rodrigo Bacellar, constitui uma novidade. De um lado, o Garotinho conseguiu construir a sua imagem a partir da sua competência como radialista. Garotinho, em que pesem todas as acusações e problemas que teve em seus governos e da sua esposa, é uma figura que mantém um capital político e eleitoral considerável. Tanto assim que foi objeto, neste ano, como em anos anteriores também, de todas as formas de cerceamento à sua tentativa de se candidatar ao Governo do Estado, patrocinadas pelo Bacellar e pelo governador Cláudio Castro. Porque seria ele, Castro, o maior prejudicado eleitoralmente. Garotinho é um fenômeno indiscutível, que tem um traço popular e populista. Populista na forma de governar, e popular na sua capacidade de comunicação. Já o Rodrigo Bacellar nos parece um pouco ter outro estilo: o estilo da articulação Assembleia Legislativa, onde ele está como deputado; na articulação no governo. Ele conseguiu ascender junto aos seus pares no processo de impeachment do Witzel, e isso o colocou com projeção na mídia. Mas, em termos da disputa local entre os dois, eu acompanho por conta do WhatsApp, das notícias, da Folha da Manhã, ela é muito presente na disputa na Câmara de Vereadores.
Pacificação? – Eu não diria nem pacificação. Com o enquadramento do Garotinho, que, como ele mesmo disse, foi impedido de se candidatar (a governador) pelo partido (União) e a declarar apoio ao Cláudio Castro no primeiro turno, isso deu uma amenizada. Mas é só aquela calmaria que vem antes da tempestade. Conhecendo o temperamento do próprio Anthony Garotinho, tenho a impressão de que vai ter troco. Isso não vai ficar barato, não. Mesmo não sendo nessa eleição, vai ter troco mais para frente. Até porque, o Garotinho, mesmo com todos esses conflitos, essas contradições e as brigas até no interior da própria família. Agora tem uma situação que é a Clarissa tentando se viabilizar como a candidata do Bolsonaro (ao Senado), enquanto o candidato do partido do Bolsonaro oficial é o Romário. Eu acho que esse recuo do Garotinho também tem a ver com a preservação do mandato do filho como prefeito (de Campos) e da possível eleição, da disputa eleitoral da filha.
Abraço de Castro a Garotinho – O amor é lindo, o que estraga é só a falsidade (risos).
Remanejamento do orçamento e composição da Mesa Diretora na Câmara de Campos – Cada vez mais, os legislativos têm procurado tomar para si o protagonismo da quase totalidade do orçamento. Então, quando se fala de remanejamento, é a margem que o Poder Executivo procura negociar para poder justamente fazer isso: administrar os recursos orçamentares segundo as demandas que vão surgindo ao longo do exercício anual. E quando você reduz para 5%, como eu não sabia que São João da Barra já tinha aprovado isso, a margem de manobra do Executivo é próxima de zero. Literalmente, não tem o que fazer. Até porque, boa parte do orçamento federal, estadual e municipal é composta pelas chamadas despesas obrigatórias. A relação do Executivo de Campos com a Câmara Municipal sempre conflituosa. É uma cidade que, mesmo sendo do interior, tem um peso político, um orçamento robusto, uma liderança regional. Acho que essa articulação que envolveu o Wladimir, o recuo do Anthony Garotinho, a aproximação com o Cláudio, pode ter tido como uma das contrapartidas a resolução desse impasse na Câmara de Campos. Mas, pelo que acompanhei, não necessariamente o Rodrigo Bacellar vai cumprir esse acordo, se é que ele aconteceu.
Escândalo do Ceperj – Isso surgiu há aproximadamente pouco menos de um mês, graças a uma ação jornalística investigativa de um grande jornalista, a quem mando aqui o meu abraço, que é o Ruben Berta, de quem gosto muito. Hoje está trabalhando no Grupo UOL. A partir daí, com a sucessão de denúncias que estavam ainda restritas à apuração dele e depois acompanhadas por um outro jornalista, Igor Mello, a Rede Globo de Televisão repercutiu o assunto. O Ministério Público entrou com poderes legais para fazer isso e surgiram mais informações. Foi a partir da investigação do Ministério Público que surgiu a lista dos beneficiados e do volume de dinheiro alocado para esse tipo de trabalho. Lembrando que a primeira denúncia do Ruben Berta falava do número de pessoas: tem 18 mil cargos secretos no Ceperj. É aquela história: você puxa um rabo de lagartixa e vem um jacaré. Então, o jacaré está vindo. No debate de domingo, na Band, o governador foi pouco espremido em relação a isso e acabou saindo pela tangente. O que o governo fez? O governo, depois da pressão, criou uma comissão interna, exonerou o presidente do Ceperj. Mas parece que integrantes da comissão nomeada para apurar, no passado, já receberam dinheiro na boca do caixa. Não nesse do Ceperj, mas em outras ocasiões. E o vice-presidente da comissão teria sido indicado pelo deputado (estadual) Rodrigo Amorim (PTB), aquele que quebrou a placa da Marielle em ato absolutamente absurdo, antidemocrático, desumano. E esse vice-presidente indicado teria comprado uma Mercedes usada por R$ 169 mil, mas quem pagou a operação comercial à agência que vendeu a Mercedes é um dirigente do Instituto Fair Play, que, por acaso, é um dos institutos contratados pelo Ceperj para fazer um dos programas, com recursos vultuosos. Então, acho que isso ainda vai fazer o governo sangrar. Porém, já me antecipando, sangrar não significa que será suficiente para ser derrotado. Mas, que vai sangrar, vai.
Rodrigo Bacellar vai sangrar também? – Não tenho dúvida de que vai sobrar para ele. Esse esquema me parece um misto de rachadinha, que já foi escândalo lá atrás, e Mensalão. Por que um misto? Porque ele tem no Poder Executivo o centro da distribuição do dinheiro, via Ceperj, e tem como favorecidos parlamentares e seus indicados, apadrinhados na base do governo. Então, quem foi o grande articulador do governo Cláudio Castro? Foi Rodrigo Bacellar. Aliás, é um governo que tem no seu núcleo de articulação dois Rodrigos: o Rodrigo Bacellar e o Rodrigo Abel. O Rodrigo Abel fica mais nos bastidores. Tem também um terceiro Rodrigo, que ajuda informalmente, que é o Bethlem. E um candidato que está disputando com ele (Cláudio Castro) também se chama Rodrigo, que é o Neves. Ou seja, nós estamos vivendo uma certa inflação de Rodrigos na disputa do Estado do Rio de Janeiro. Mas, eu acho que isso pode chegar no Rodrigo Bacellar, sim. Eu não conheço o Rodrigo Bacellar pessoalmente, o conheço como figura pública. O vi despontar na época impeachment do Witzel. Conversei com alguns pares, alguns parlamentares que são de minha relação pessoal, perguntando exatamente quem é essa figura, de onde surgiu, como ele é. Muita gente elogia a capacidade de articulação dele. Então, ele é um cara que tem essa virtude, essa competência. Mas, não nos esqueçamos de que a principal figura de articulação do governo Lula, na época do Mensalão, caiu, que foi o Zé Dirceu (PT). Independente do juízo de valor sobre as ações dele, indiscutivelmente tem uma competência de articulação, de análise política. E, mesmo assim, foi sacrificado. Não acho que vai ser caso de perda de mandato, nada disso, mas deve chegar ao Rodrigo Bacellar, sim.
Garotinho a federal e Bacellar a estadual como os prováveis mais votados da região – Se a gente pegar as últimas eleições gerais, Campos e região sempre conseguiram eleger representantes. Sempre. Nunca deixaram de ter. Norte tem em termos de número de eleitores, de força política, ela é limitada. Então, acho que esse conjunto enorme de candidaturas, seja para federal, seja para estadual, no frigir dos ovos, tende a se concentrar em dois federais, dois estaduais. Não se concentrar em termos de acordo entre eles, mas de resultado final da eleição. É complicado. Até o voto cair na urna, é um trabalho danado. Como dizia Tancredo Neves: “político teve voto, não tem voto, poderá ter”. É óbvio o potencial eleitoral do Garotinho para federal, do Rodrigo Bacellar para estadual, do próprio Bruno Dauaire (União), que será o candidato apoiado pelo Wladimir para estadual. O peso da máquina numa eleição como essa, ainda mais no interior do estado, tem relevância. Eu acho que elege dois federais e elege de dois a três estaduais. Falo Campos, mas é Campos região. Não sei qual é o potencial eleitoral para uma eleição legislativa, por exemplo, da Carla Machado (PT). Disputou uma a estadual e não se elegeu. Em relação ao Garotinho, em particular, eu tenho a impressão de que o Garotinho talvez tenha hoje mais votos para deputado federal na Baixada Fluminense, aqui na Região Metropolitana do Rio, do que na própria região de Campos. A liderança de Garotinho naquela região é viva até hoje. Se pegar as pesquisas de quando ele ainda estava como pré-candidato a governador, ele sempre batia ali nos dois dígitos, perto de 10%, muito por conta da Região Metropolitana e da Zona Oeste do Rio. Então, eu acho que o Garotinho tende a ser o candidato a federal mais votado da região, na minha opinião. Pensando na eleição dos estaduais, acho que, na região, o Rodrigo Bacellar vai ser o mais votado. E, na minha opinião, ele disputa entre os mais votados das 70 vagas. Acho que ele vai vir com muita força nessa eleição para estadual.
Liderança de Romário nas pesquisas a senador – O Romário é um fenômeno político interessante, peculiar. Ele foge muitas vezes a percepção dos analistas políticos. Aquela participação desastrosa na disputa para governador do Rio marcou muito a imagem de um sujeito despreparado, incompetente. O Romário é um fenômeno eleitoral tanto pelo passado dele como jogador de futebol quanto, vamos dizer assim, pela língua solta… apesar dele ter língua presa. Ele fala as coisas e ele não tem nenhum compromisso com coerência. Já deu pancada no Bolsonaro, hoje apoia o Bolsonaro, já deu pancada no Eduardo Paes, já apoiou Eduardo Paes. Mas ele tem um trabalho parlamentar que viabiliza muitas emendas parlamentares e ele se tornou uma figura relevante, reconhecida no apoio às pessoas com deficiência. Causa em que atua até por conta da filha dele. Não me surpreende que o Romário esteja na frente nas pesquisas; é um voto popular e que não tem nada a ver com, vamos dizer assim, narrativa política ou com questão ideológica. É uma figura mítica, é um ídolo. Agora, ele está reeleito? Eu o considero favorito. Mas acho que é possível que surja algum nome para enfrentá-lo.
Eleição a governador – Bom, a eleição para governo do Rio de Janeiro apesar das pesquisas estimuladas apontarem hoje uma disputa concentrada em Castro e Freixo, Freixo e Castro, está longe de estar resolvida. A grande maioria da população não tem candidato a governador, podemos considerar que há um grau de desconhecimento alto. O indicador na minha opinião mais importante para colocar na mesa é o que as pesquisas indicam como percentual de rejeição, no qual Freixo é campeão. Então esse é o esse é o grande problema para ele. Ele está fazendo uma um esforço desde que saiu do Psol e foi para o PSB. Trouxe o César Maia (PSDB) para ser vice, trouxe figuras importantes como Armínio Fraga (ex-presidente do Banco central no governo Fernando Henrique) para apoiá-lo, na perspectiva de ser uma alternativa mais ao centro. Com uma visão progressista, não radical. A questão é, mesmo considerando o esforço, a imagem do Freixo ainda está muito associada à época de Psol. O Cláudio Castro com a máquina, a não ser que se descubra um escândalo muito maior do que esse do Ceperj, está no segundo turno. A disputa é o seguinte: quem vai para o segundo turno com ele? Freixo, que hoje é o favorito a ocupar essa posição, ou Rodrigo Neves? Se o Freixo for para o segundo turno contra Cláudio Castro, as chances de vitória do Castro aumentam. Se o Rodrigo Neves for para o segundo turno, as chances de vitória do Castro diminuem.
Recuperação de Bolsonaro na pesquisa BTG/FSB – A grande maioria que declara voto em Bolsonaro o faz não porque seja bolsonarista raiz, mas porque não quer a volta do PT e do Lula. E uma parte considerável dos apoiadores de Lula não é formado por lulopetistas, mas por gente que quer tirar o Bolsonaro, que é um grande risco para a democracia mesmo. Então no primeiro turno nós já vamos ter uma eleição polarizada pela rejeição e não pelo apoio das ideias. Mas o Bolsonaro é competitivo. Ele é competitivo, mas não é o favorito. Eu acho que mesmo essa recuperação tende a não ser suficiente para lhe garantir a vitória no segundo turno. E aquele sonho de uma noite de verão que muita gente falava “uau, vamos votar no Lula para ganhar no primeiro turno” não vai se não vai se concretizar. O Lula, mesmo quando estava no auge da popularidade do governo, foi para o segundo turno. Quando ele lançou a Dilma (PT), em 2010, teve segundo turno. Até porque ao contrário do que muitos petistas querem desconhecer, a rejeição ao PT e ao Lula não acabou. Com tudo isso, eu acho que Bolsonaro não ganha essa eleição. Porque boa parte do eleitor que não vota no Lula no primeiro turno, no segundo turno entre Bolsonaro e um cachorro, vota no cachorro.
Perfeita análise..Isenta. Trazendo apenas apenas a realidade que os anos nos demonstram ate a presente data. Nada mudou . As mesmas práticas com os mesmos protagonistas e ou seus representantes.