Como jornalista e homem, Ícaro Barbosa por suas fontes

 

Quem foi Ícaro Paes Pasco Abreu Barbosa, em seus 23 anos de vida? Você, leitor da Folha da Manhã, o conheceu através das suas muitas reportagens, desde que ele iniciou sua carreira no jornalismo, a partir de 2019. Como os seguidores dos veículos do Grupo Folha de comunicação o conheceram pela dinamização que, como alguém da sua geração, ele imprimiu ao assumir em 2021 as redes sociais do Folha1, da Folha FM 98,3, da Plena TV. E conferiu a elas níveis de alcance e engajamento virtuais ainda inéditos, numa história real de 45 anos de jornalismo.

Para conhecer um pouco mais da história desse jovem, morto precocemente no último dia 13 e que teve por ofício contar as histórias dos outros, o programa Folha no Ar da manhã de ontem buscou algumas fontes da sua vida. Tão breve quanto marcante à delegada de Polícia Civil Madeleine Dykeman, ao vereador Nildo Cardoso, ao repórter-fotográfico Genilson Pessanha, à jornalista Joseli Matias, ao estudante João Marcelo Coutinho, ao empresário André Pinto e ao radialista Cláudio Nogueira. Que falaram também por outros. E puderam revelar, mesmo a quem amou Ícaro desde o ventre da sua mãe, novas faces do profissional de imprensa e do homem que ele se tornou.

 

Ícaro Barbosa uniu tecnologia à tradição no jornalismo de Campos, sentado na mesa do seu avô, o jornalista Aluysio Barbosa, na redação da Folha da Manhã (Foto: Genilson Pessanha/Folha da Manhã)

 

 

Madeleine Dykeman – Conheci Ícaro, na verdade, primeiro pelo texto dele. Só depois que eu fui conhecer a pessoa dele. Na época, eu era delegada de São João da Barra e atuei com uma investigação complexa, de um roubo, em que a gente teve várias frontes de investigação. Prendemos parte de uma quadrilha, no outro dia prendemos outra parte, e no final fizemos prisões no Espírito Santo. De modo que a investigação era complexa, envolvia muitos fatos. Ao final, fiz uma coletiva contando toda a narrativa. Ao final, eu ainda não conhecia o Ícaro pessoalmente. O meu sogro me mandou e falou: “Olha que reportagem bacana na Folha”. E nesse momento, quando eu li aquele texto, falei assim: Que gênio foi esse que escreveu esse texto? Porque ele conseguiu fazer isso de uma forma objetiva, simples, e, principalmente: todas as ideias centrais daquela investigação estavam ali contidas. Aquilo me impactou. Naquele momento, eu vi que tinha sido Ícaro, e o meu marido já o conhecia. Foi aí que eu pedi para ele me apresentar o Ícaro, e tivemos nosso primeiro encontro entre jornalista e fonte. Felizmente, eu tive a oportunidade de dizer ao Ícaro o quanto ele era brilhante, o quanto eu realmente sentia isso no meu coração. Toda vez que eu tinha uma investigação importante, de repercussão, sempre a primeira matéria que eu ia buscar, de referência, era aquela que ele escrevia. Eu costumava dizer que Ícaro não precisava mais assinar aquilo que ele escrevia, porque era tão destacável que, ao ler as reportagens dele, eu já sabia que era ele quem tinha escrito. E a gente foi construindo uma relação de amizade. Nós não éramos íntimos de estar nos mesmos ambientes, mas ele tinha uma forma de se aproximar de mim como nenhum outro jornalista ousou ter. Eu falo que ele era uma pessoa doce, ao mesmo tempo marcante. Ao longo do tempo, essa minha admiração por ele foi crescendo. Eu senti que existia uma admiração muito recíproca sobre nós, cada um com a sua função, mas existia esse respeito pela profissão um do outro, por aquilo que o outro representava dentro do seu âmbito de trabalho. Houve esse sentido de construção de confiança. Eu tinha confiança nas coisas que eu falava para ele, assim como eu sinto que ele tinha confiança quando me pedia algo, assim como quando eu também não podia falar, porque há casos sigilosos, em que a gente não pode antecipar a investigação. Ele sempre muito gentil, entendia. Quando eu soube da partida do Ícaro, foi um impacto, porque eu me vi chorando como criança naquela madrugada. Um menino brilhante que nos deixou. Eu tenho no meu coração que ele deixou um grande legado para os que o conheceram; deixou um grande legado para os jornalistas que atuaram com ele; deixou um grande legado também para você, Aluysio, que certamente se tornou um homem melhor por ter sido pai do Ícaro, por ele ter sido o seu amor.

Nildo Cardoso – A gente já vinha acompanhando o trabalho de Ícaro. Há dois anos, ele e o Genilson foram fazer uma matéria na minha residência, em Poço Gordo, sobre energia solar, fotovoltaica, que estava sendo instalada em três empresas nossas. Isso foi motivo de um caderno da Folha. Eu não sabia quem iria fazer a matéria. Quando cheguei e me deparei com ele, foi uma surpresa, porque era uma pessoa que eu tinha vontade de conhecer pessoalmente, por tudo o que a gente ouvia falar, e também porque a Dora, quem eu não poderia deixar de citar, estava fazendo a cobertura na Câmara sobre a questão política. E o Ícaro chegou lá em casa com Genilson, fotógrafo, e nós levamos pelo menos duas horas conversando. Falamos sobre tudo: pandemia, eleições, o setor cerâmico, e ele atento, ligado a tudo. Ele não era centrado em apenas uma matéria. Tinha um âmbito muito mais amplo dentro do jornalismo do que as pessoas podem imaginar. Eu senti ali uma experiência de uma pessoa que tinha, naquela época, 21 anos. Era uma pessoa que ouvia, tinha sua opinião própria, mas dava atenção a todos. Ele era um uma pessoa interessante no sentido de receber e dar atenção, independente da idade. Respeitava as opiniões. Aí nós fomos para a matéria, fomos para a cerâmica conversando, levamos ali praticamente metade da tarde desse dia. Tomamos café e fomos conversando até chegar de fato ao campo, já que toda a instalação foi feita em terra. Ali ficaria mais fácil fazer fotos para a matéria, que ficou excelente. Eu guardo esse caderno com muito carinho. Ao fazer essa homenagem a Ícaro na Câmara, parecia que a Câmara tinha perdido uma pessoa daqui de dentro, pela manifestação de todos que ocuparam a tribuna naquele momento para falar sobre ele. Ícaro tinha um conhecimento acima da média. Era um menino muito maduro para a sua idade.

Genilson Pessanha – Ícaro era um garoto brilhante. Chegou à redação com aquele jeito dele, muito calmo, tranquilo. Até a pedido seu, Aluysio, sempre dei alguma orientação a ele na rua, trabalhando com ele, por ser o repórter fotográfico mais antigo da Folha. Senti em Ícaro um potencial muito grande. Ele chegava fazendo muitas perguntas, querendo saber das coisas. No início, ele meio acanhado, mas um garoto inteligente, um garoto amoroso. Foi um filho que eu ganhei, com que Deus me presenteou nesse tempo em que a gente trabalhou junto. Tive oportunidade de aprender com ele também, por causa das suas ideias. Ele tinha sempre uma ideia à frente. Eu tinha uma experiência de rua, e ele sempre muito atento às coisas. Quando nós tínhamos alguma pauta no dia seguinte, ele se preocupava e me passava mensagem no dia ou na noite anterior, combinando de nos encontrar tal hora. Foi uma relação muito boa, uma experiência ímpar, com um ser humano incrível. Como foi colocado por Nildo e pela doutora Madeleine, ele foi uma pessoa que impressionava pela idade dele. Muitos jovens são deslumbrados, mas ele era muito centrado, focado, preocupado com o resultado das matérias. Vivemos momentos bons! Ficou um buraco tremendo. Ele marcou muito a minha vida e a minha família. Como você disse em seu texto, Aluysio, o Ícaro voou. Fica uma lacuna muito grande para o jornalismo. Um jovem de 23 anos, com um futuro brilhante pela frente. Tenho vários registros dele atuando, como também em momentos de descontração. A pandemia foi marcante para muitas pessoas, perdemos muitas pessoas queridas, conhecidas, e nós atuamos no front. Eu sempre costumava dizer que era no front, sem frescura, sem moleza. Ícaro jamais será esquecido.

Joseli Matias – Apesar de o jornalismo vir de berço para ele, que frequentava a redação desde pequenininho, no início ele não demonstrava ter muito interesse no jornalismo. Era muito tímido, gostava de ficar na redação desenhando. Ele era muito bom nisso. Em 2019, quando ele chegou à Folha para trabalhar como repórter, a partir do momento em que ele assumiu aquele posto, você não via mais o Ícaro tímido. Ele ia para a rua, mantinha contato com as fontes, não tinha timidez. Ele enfrentava aquilo e era um grande repórter. Também percebi que ele já chegou dinamizando a Folha. A gente já trabalhava há algum tempo com o jornal online, mas tinha uma dificuldade de implantar multimídia, tinha dificuldade de fazer aquela interface com as redes sociais, e ele chegou fazendo isso. Na rua, além da matéria, ele pensava no vídeo para a rede social, na foto ideal para rede social. Ele tinha esse pensamento que, até então, a maioria dos repórteres não tinha. Ícaro gostava sempre de inovar. Ele tinha sempre uma visão diferente em suas sugestões de pauta. O que ele sugeria, a gente parava e pensava: nossa, por que eu não pensei nisso? Depois que ele assumiu as redes sociais da Folha, elas cresceram por causa dessa visão. Apesar de muito novo, Ícaro era muito inteligente, muito estudioso. Sempre foi muito curioso também, gostava de aprender. Quando não sabia de alguma coisa, ele perguntava. Tinha uma relação muito boa com o pessoal da redação. Ele gostava de ficar na redação. Ficava de manhã, no turno da tarde ele continuava e ficava com o pessoal da edição. Era muito receptivo quando a gente fazia alguma observação em relação ao trabalho, e isso tudo permitiu que ele evoluísse muito rápido. Ele mudou totalmente a cara das redes sociais da Folha, que hoje são um sucesso por conta desse trabalho de Ícaro.

João Marcelo Coutinho – Estudei com Ícaro desde o segundo período, desde 2004, 2003, até o 9º ano, em 2014. Na mesma sala, tomando esporro, eu e ele fazendo bagunça, estudando. A gente sempre teve muitos gostos em comum, como videogame, música. A gente sempre gostou de uma música mais antiga; rock dos anos 60, 70. Uma das minhas músicas preferidas, “Faroeste Caboclo”, foi ele quem me apresentou. Ele sabia cantar a música inteira, a gente cantava junto. Filmes também. Me lembro que, na época do João e Maria (ensino fundamental), em 2008, 2009, por aí, a gente fez uma viagem para Petrópolis. Fomos juntos no ônibus. Eu tinha um DVD portátil, ele falou para eu levar, que ele levaria um filme maneiro para a gente ver na viagem. Eu tinha 8 anos, ele devia ter 9, porque era quase um ano mais velho que eu. Ele levou “Cemitério maldito”. Eu inocente, fui ver com ele e fiquei quase uma semana sem dormir depois de assistir ao filme (risos). Como a gente sempre teve gostos em comum, depois de mais velhos também, por política, economia, foi se criando uma amizade natural. A gente era amigo antes de descobrir que você (Aluysio) é amigo do meu pai, meus tios; meu avô era amigo do seu pai e tal. Depois que descobrimos isso, fomos ficando mais amigos. Como cresci com ele, fui pegando as fases dele. Como muita gente, ele não gostava muito de estudar, eu também não gostava. Mas nas coisas que ele gostava, virava praticamente uma enciclopédia. Me lembro de que, quando criança, ele era apaixonado por tubarão. Sabia tudo. Tem informações sobre tubarão que eu sei até hoje por causa dele: tubarão maior, menor, o mais agressivo, o menos agressivo. Ele sabia cada coisa! Teve até um show de talentos lá no João e Maria, em que ele deu uma palestra sobre tubarão, com 9 anos de idade. Meus primos mais velhos ficaram assustados com a oratória dele, uma criança falando daquele jeito. Também sempre desenhou muito bem, gostava muito de desenhar. Um pouco depois da viagem que vocês fizeram à Grécia, Aluysio, ele começou a ficar apaixonado por mitologia grega, Esparta, Atenas. O cara sabia tudo. Com uns 12 anos, podia dar uma palestra de 2h falando sobre isso. Ele sempre se aprofundava, sabia tudo sobre os assuntos dos quais gostava. E depois, mais velho, começou a pegar gosto por leitura, por Hemingway. Ele até me indicou um livro, “O velho e o mar”. Eu achava que ler Hemingway era difícil, mas ele falou que não, que era um autor com uma linguagem tranquila. Do Hunter Thompson, ele falou para eu ler “Medo e delírio em Las Vegas”. Foi um jornalista em quem ele se inspirou, do estilo dele: bloquinho na mão, escrevendo, uma coisa mais raiz. Ícaro sempre foi um cara diferente, sempre conseguiu fazer amizade com um pessoal mais velho, pela cabeça que ele tinha. O cara era fora de série mesmo, era diferente.

André Pinto – Ícaro chegou do nada aqui (no bar Bicho André), me foi apresentado por um amigo: “Esse é Ícaro, filho de Aluysio”. A primeira impressão que eu tive foi de que, por ser filho de fulano, deveria ser um rapaz meio esnobe. Mas ele, não. Ele foi uma pessoa simples, cativou a todo mundo de estalo. Com o passar dos dias, fui tendo uma identificação com ele, com os gostos dele a respeito de filmes, de música, rock and roll e tudo mais. Ele era um cara de 23 anos, mas com cabeça de uns 30. De tudo o que se conversava, ele sabia: filmes, música, rock, blues, Eric Clapton, The Doors. Ele só foi nos conquistando, a cada dia mais. Frequentava tanto o bar quanto a minha casa. E conquistou também a turma daqui, os fregueses, pessoas de 70, 60 e poucos anos. Ele se enturmou com todos. Achava ele engraçado, autêntico, até pela maneira de vestir. Eu até zoava ele, por usar umas camisas psicodélicas, extravagantes. Era um cara de opinião fortíssima, não estava nem aí para o que os outros pensavam. Até coloquei um apelido nele, de Agostinho Carrara. Ele levava na sacanagem, sempre com alto astral. Nunca vi Ícaro de baixo astral. Estava sempre transbordando alegria, energia positiva. Eu só tenho lembranças de alegria com ele. Foi fora de série! Não esquentava a cabeça. Poderiam sacanear ele, que não estava nem aí. Um cara maduro, amigo, companheiro.

 

Fontes da vida de Ícaro como jornalista e homem: a delegada de Polícia Civil Madeleine Dykeman, o vereador Nildo Cardoso, o repórter-fotográfico Genilson Pessanha, a jornalista Joseli Matias, o estudante João Marcelo Coutinho e o empresário André Pinto (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

Madeleine – Ícaro era diferente. Apesar de ele ser um menino calmo, introspectivo, pelo menos em seu ambiente de trabalho, sua presença no local era determinante. Não por ele ser da Folha da Manhã, que é um órgão de imprensa tão importante em nossa cidade. Foi pelo talento e pela competência que ele conseguiu conquistar seu lugar. Ele nunca se utilizou do instrumento Folha da Manhã para se apresentar. Ele ganhou todos os espaços pela pessoa dele, e isso é o mais determinante. Isso nos traz a alegria de dizer às pessoas o quão magnífico Ícaro era. Ele será lembrado como esse profissional exemplar, essa pessoa marcante nos nossos corações, independente do tempo.

Nildo – Como profissional, Ícaro dispensa comentários. E como homem também. Ninguém ficaria duas horas sentado, tomando café, conversando sobre vários assuntos, se não tivesse uma bagagem. Ele era um cara preparado para discutir, debater, para estar em qualquer ambiente. Com todas as ocupações que a gente tem, não só na vida pública, mas também nos negócios da gente, que tira um dia para ficar na roça, e ali você não para. Ali, a gente começou a se encantar com um jovem. Eu tenho um filho de 40 anos, outro de 39, outro de 35, e todos trabalham dentro do setor de cerâmica, cada um toma conta da sua empresa, cada um tem a sua formação. E você se depara com um jovem de 21 anos. Cheguei a comentar sobre a capacidade da formação e do futuro que estava por vir. É um profissional do qual você, Aluysio, tem que se orgulhar, como todos nós que estamos aqui hoje, por falar sobre Ícaro. A convivência com ele foi um aprendizado para mim. Gerou uma admiração que vou carregar para o resto da minha vida.

Cláudio Nogueira – A gente tem aqui, na rádio, durante o dia, vários flashes, no “Direto da Redação”, justamente fazendo essa sinergia entre os veículos do Grupo Folha. E sinergia foi algo que ele já chegou implantando entre as empresas do grupo, que tem a Folha FM, a Folha da Manhã, a Plena TV, a Inter TV, a Hits Macaé. Ele criou esse laço direto entre a gente. Como a Joseli falou, não era raro ele fazer o plantão da manhã e mandar flash também no plantão da tarde. O que fica para a gente, que é mais experiente, mais velho, é que a gente se sente meio que pai. Ainda mais eu, que tenho três filhos homens, dois com 26 anos, praticamente a mesma idade do Ícaro. Não é que a gente quer ser pai, mas, automaticamente, o dobro da idade nos dá a condição de experiência para tentar ensinar a esses jovens. É interessante que não tenho história triste com Ícaro. Inclusive, numa reunião da diretoria do Grupo Folha, em que eu participei, com você (Aluysio), Diva, Christiano e Ícaro, em que ele ensinava para nós detalhes da internet. Toda vez que eu vejo uma postagem de um cachorrinho, de um animal, eu me lembro do Ícaro. Ele falou: “Tendo animal, tendo um cachorrinho, um gatinho, isso é engajamento bruto”. Essa coisa desse linguajar mais específico dessa geração, que é a geração da internet. Eles já pegaram esse caminho sem volta, que é o caminho da tecnologia. Ele ia implantando as coisas nesse caminho digital. Era outro ser humano, diferente, mas com a sua inteligência, puxando você e o seu pai, o velho Aluysio, e a mãe também, a Dora. Ele juntava esse conhecimento, essa cultura dele, que era vasta, apesar da pouca idade, com o carisma, com aquele jeito diferente. Ele era diferente e era marcante. Aqui, na rádio, sempre que terminava um flash ele perguntava como estava a sua dicção. Todo dia ele falava aquilo, e eu dizia que era só falar mais pausadamente, mais tranquilo. E ele falava: “Eu estou na rua, um corre-corre danado”. E eu falava para ficar tranquilo, que Nelson Gonçalves era gago, mas na hora de cantar tinha a voz mais bonita do Brasil. Ele deu muita risada. Para encerrar: uma das qualidades que mais percebi no Ícaro é que ele não andava sob a sua luz (Aluysio). A doutora Madeleine falou que ele não usava o jornal Folha da Manhã para se apresentar em nada, ele se apresentava como Ícaro Barbosa. E não por ele não se orgulhar. Mas, por ter luz própria. Ter um menino novo, de 23 anos, com luz própria, é muito difícil.

Genilson – Pela manhã, trabalhávamos eu, Ícaro e Fabiano, que é tio do Ícaro. Havia aquela aproximação, por ser tio e tal, mas também respeitando sempre. Ele zoava um pouco o Ícaro. Toda vez que Ícaro entrava no carro, ele perguntava: “E aí, Ícaro, hoje vai ter aquele bordão? ‘Eu sou Ícaro Barbosa, falando diretamente aqui da redação da Folha da Manhã’ (risos)”. Foram momentos muitos que a gente viveu. É inexplicável. Teve um final de semana lá em casa, em que marcamos de fazer um hambúrguer artesanal. Fomos eu, ele, Fabiano com a família, e ficamos lá batendo papo. Foi uma tarde descontraída, com muita zoação. Momentos que marcaram muito. A gente passava muito tempo junto na redação, na rua, e ele sempre me cobrando fontes que ele não conseguia por ser novo. Teve um dia, no meu aniversário, em que foi até surpresa. Juntou um pessoal da manhã, e ele chegou com um bolo na mão: “Aí, seu ‘coroavírus’”, por causa da cobertura que a gente fez da pandemia. E como Madeleine falou, ele nunca fez questão de dizer que era Ícaro Barbosa do jornal Folha da Manhã. Ele era Ícaro. Como Cláudio Nogueira falou, a luz era dele. Nas pautas, a gente estava sempre junto, falando a mesma linguagem, apesar da diferença de idade. Agradeço a Deus pela oportunidade de eu ter estado, de ter vivido esses momentos com ele. Vai ser meu eterno Ícaro. Cada vez que olhar para o céu, vou saber que tem uma estrela brilhando. Ele brilhou para nós todos, com uma luz que contagiou e emanou. Um excelente profissional, um garoto desprovido de vaidades. Ícaro deixou sua marca conosco.

Joseli – Ícaro tinha muito potencial e gostava de aprender. Ele estava sempre em contato com a gente, o pessoal mais velho. Até a chegada das estagiárias, ele era o mais novo da redação, mas assumiu a edição e a direção das redes sociais com muita competência. Ícaro percebia a importância de ser tudo muito rápido, tudo imediato. As coisas aconteciam e ele era o primeiro a vibrar, pedir que enviassem o vídeo. Enquanto a gente ia fazendo a matéria, ele já ia editando o vídeo, sempre com muita empolgação. E apesar de começar e gostar de fazer polícia, Ícaro também sempre teve uma sensibilidade muito grande, com matérias mais humanas. Ele estava sempre atento às redes sociais, que acabam sendo um canal do leitor com a Folha da Manhã. Quando a pessoa não tinha mais a quem recorrer, já tinha ido ao poder público, recorria à Folha através das redes sociais. E Ícaro estava sempre atento. Quando esses apelos chegavam, ele era de uma sensibilidade extraordinária. Pegava aquilo de forma imediata e já pautava. Se não tivesse alguém para fazer a pauta, ele mesmo fazia. A gente teve retorno de pessoas que foram ajudadas por matérias da Folha; e a maioria delas por essa sensibilidade. Ele estava sempre ali, o tempo inteiro, com as redes sociais: dia de semana, final de semana, ele mantendo esse contato com nossos leitores. Apesar de muito novo, ele tinha essa coisa de dar a resposta. Ele sempre dava um retorno muito rápido. Abraçava essas pautas. Na hora da edição, a gente ia ver a matéria de Ícaro, e aquilo tinha crescido de uma forma. A matéria se transformava e ganhava uma proporção gigantesca. Ele mantinha essa rotina dele de repórter, gostava de continuar escrevendo. Muitas vezes, era ele quem dava o ritmo para a redação, porque ele corria, adiantava a edição do vídeo enquanto a gente escrevia. Estava sempre correndo e tinha uma sensibilidade emocionante. Como Madeleine e Genilson falaram, ele nunca usou o sobrenome dele para se impor ou adquirir qualquer vantagem que fosse. Estava sempre ali disposto a aprender, aberto a críticas, e por isso evoluiu muito rápido. Era muito bonito ver como ele se divertia na redação, gostava da redação. Às vezes ele ficava até o fechamento. Aí chegava Souza, a quem ele chamava de irmão, que também entrava nas brincadeiras. Mesmo muito novo, a gente via como foi rápido para ele fazer fontes. Ícaro tinha acesso a informações privilegiadas; coisas que a gente não tinha acesso, ele tinha e passava para a gente. Isso mostra um pouco de Ícaro. Ele vai fazer muita falta.

João Marcelo – Na história em que enchemos a sala do apartamento do Rio de areia, no carnaval, eu culpava ele e ele me culpava. Até hoje não sei quem levou a praia toda para casa. Mas, pelo menos a gente limpou lá, deixou tudo direitinho (risos). Estava me lembrando agora também de uma história em uma das excursões que a gente fazia pela escola. Acho que essa foi em 2010. Fomos a um museu e, na volta, passamos em uma fábrica de chocolate. A gente sempre lembrava dessa história quando estava junto. Ele comprou uns bombons, mas começou a comer os bombons. Já tinha comido os cinco e foi me dar um. Quando fui comer, senti um gosto estranho, azedo, e falei que o bombom estava estragado. Fomos perguntar à mulher, ela falou: “Menino, isso é bombom de licor!” E ele já tinha comido uns cinco, com 10 anos de idade. Só sei que depois ele foi dormindo no ônibus, apagadão (risos).

André – Ele não perdia a linha. Sempre com aquela classe. O que eu tenho para falar é que você (Aluysio) era o ídolo dele. Você estava sempre presente nas conversas dele, com histórias. Até comentei com você a respeito de uma história, de um sufoco que você passou no Pontal, para atravessar a nado à Ilha da Convivência. Ele contava sempre, falava de você com o maior orgulho. E nosso negócio aqui era mais baseado no rock and roll, em filmes. Tem filmes antigos que eu falava: como esse cara assistiu a esses filmes? Ele assistiu “Cidadão Kane”, coisas antigas. Cativou a mim e aos fregueses do bar dessa maneira.

João Marcelo – Foram 20 anos de amizade, praticamente. O acompanhei desde criança bobona até o jornalista que ele virou. Fiquei surpreso também. Eu conhecia todo o gosto dele por leitura, por cultura e tal. Mas, quando comecei a ler os textos dele… Mano, tenho certeza que esse cara ia acabar fazendo algum livro em alguma época, por estar escrevendo muito bem. Ele sempre postava nos stories muitos textos do Hemingway, dos autores que ele gostava, e geralmente eu lia. E tinha alguns que eu começava a ler e achava maneiros, e no final ele assinava I.A.B., que era como assinava os textos. Eu pensava que fossem de caras que ele lia, mas no final eram dele. Teve um dia em que eu vi que ele estava virando um jornalista bravo mesmo. Em alguma segunda-feira de manhã, ele me ligou 8h30, 9h, e falou: “estou aqui em Tocos”. Eu falei: “fazendo o que aqui?” E ele: “Vim fazer uma matéria sobre as vans, com motoristas de van”. Alguns jornalistas poderiam ligar para o motorista e marcar uma reunião, conversar por telefone, tomar um café e tal. Mas ele foi, entrou na van, começou a conversar com o motorista, fazendo uma matéria sobre ele. Aí veio para cá, me ligou, tomou um café comigo, colocou o papo em dia, porque a gente estava há um tempo sem se ver. Com 20 anos de amizade, é aquilo tipo de amizade que você pode ficar seis meses sem ver a pessoa, mas quando vê, parece que tinham se visto ontem. O cara era jornalista raiz mesmo, vivenciando na veia o que a fonte vivencia para colocar o melhor na matéria. Agradeço porque foram 20 anos de amizade. Muitas risadas, tomamos muito esporro junto, fomos para a coordenação várias vezes. Foi bom demais enquanto durou. André falou que você (Aluysio) era o ídolo dele. E ele te deu um apelido que eu achava o máximo. Ele falava: “O Big Boss está vindo aí”. Ficava te chamando de Big Boss.

André – O que eu tenho pra falar é o seguinte: nesses dois últimos anos,
tive o prazer de conhecer o Ícaro, e ele entrou no rol dos meus melhores amigos, de 50, 60 anos, entendeu? Ele faz parte disso. Vai estar no meu coração. Nunca vou desejar a você (Aluysio) e a Dora os sentimentos… Dou a você e a Dora os parabéns por terem colocado no mundo esse filho maravilhoso, além do tempo, com quem eu tive o prazer de conviver por esses dois anos. Eu sei que o tempo vai passar, mas a dor nunca vai passar, vai ser eterna. Mas, que dê um pouquinho, um pinguinho de conforto para vocês. Obrigado por essa oportunidade. Ícaro ficará eternamente em nossos corações. Não só no meu, mas nos de todos os amigos que ele cultivou aqui.

 

Página 6 da edição de hoje da Folha da Manhã

 

Página 7 da edição de hoje da Folha da Manhã

 

Confira, em três blocos, a íntegra com os vídeos do Folha no Ar de ontem, em edição especial, sobre a vida do jornalista Ícaro Barbosa:

 

 

 

 

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