O poder das palavras
Quando desceu do palanque da convenção do União que a lançou candidata a prefeita de Campos, em 26 de julho, a delegada Madeleine Dykeman foi filmada dizendo “vai acontecer, porra”. Repetiu seu slogan de campanha e o pontuou com uma palavra que, se de baixo calão, dificilmente geraria questionamento se estivesse na boca de um candidato homem. Esse vídeo teria sido usado por grupos de WhatsApp da militância de Wladimir Garotinho (PP), chamando a adversária evangélica e conservadora de “boca suja”. E gerou resposta do inspetor de Polícia Civil Cristiano Dykeman, marido de Madeleine.
Mais palavras
Em status do WhatsApp, que sai do ar após 24 horas, Cristiano escreveu: “O problema não é xingar! O problema é roubar por anos um povo e ter os pais presos #vaiacontecer. Sua hora está chegando! Sivis pacem para bellum (‘se você quer paz, prepare-se para a guerra’)”. O que Wladimir entendeu como ameaça e representou (confira aqui) contra o policial no Ministério Público e na Corregedoria de Polícia Civil. Cristiano preferiu só falar do caso nas representações. Por sua vez, Madeleine postou ontem (9) no Instagram: “Não vai ser com intimidação que vão me calar. Honro minha família, não tenho medo de bandido e farei tudo para protegê-la”.
E as palavras saúde, transporte e educação?
A “guerra”, como definiu seu maior teórico moderno, o alemão Carl von Clausewitz, “é a política por outros meios”. Pode tanto ser entendida como metáfora ao enfretamento político natural de uma eleição, como por esses “outros meios”. Wladimir assim entendeu: “não vão transformar a política de Campos nesse vale tudo, não vão mesmo. Política não é lugar de intimidação e ameaça, nem a mim e nem a nenhum outro candidato”. Os ânimos estão acirrados, hoje, só a 57 dias das urnas de 6 de outubro. Para serená-los, dentro do que interessa ao eleitor, como saúde, transporte e educação, lamentável o tratamento mútuo entre “boca suja” e “bandido”.
O que é uma ameaça?
Mas o que é, de fato, uma ameaça? O advogado criminalista Felipe Drumond definiu juridicamente à coluna: “O crime de ameaça se configura com a promessa a alguém, por palavras, escritos, gestos ou qualquer meio simbólico, de causar mal injusto e grave. O delito tem por objetivo proteger a tranquilidade e a paz de espírito de cada indivíduo. Para que ocorra o crime de ameaça não se exige que a promessa consista na prática de um crime, mas é preciso que se identifique a presença de menção a uma conduta que seja capaz de gerar dano à pessoa ameaçada ou a qualquer terceiro com quem tenha vínculos afetivos”.
Publicado hoje na Folha da Manhã.