“Estamos preocupados com a possibilidade de os partidos políticos não cumprirem a cota mínima de 30% de candidaturas femininas exigida por lei e praticar novas fraudes contra o sistema de cotas”. É o que disse o promotor eleitoral Fabiano Moreira, sobre as nominatas à Câmara Municipal de Campos. Em que seis vereadores foram afastados pela Justiça (relembre aqui) na atual Legislatura por fraude nas cotas femininas na eleição municipal de 2020. Ele advertiu que se as candidaturas a vereadora indeferidas não forem substituídas por outras mulheres até as urnas de 6 de outubro, para preencher o mínimo de 30%, os responsáveis podem ser condenados à impugnação de candidaturas e inelegibilidade.
— Isso denota evidente abuso, um novo capítulo ao sistema de fraudes à exigência legal ao número de candidaturas femininas. A lei não só exige que os partidos registrem 30% de candidatas mulheres, mas também que esse percentual seja mantido até o dia da eleição. Se os partidos não substituírem essas candidatas por outras mulheres, poderão enfrentar sanções, incluindo a impugnação das candidaturas dos respectivos DRAPS (Demonstrativos de Regularidade de Atos Partidários) e possíveis inelegibilidades dos responsáveis, notadamente os representantes dos partidos — disse o promotor eleitoral. Que foi adiante:
— Observamos que muitos partidos, ao registrarem suas candidaturas, indicaram exatamente o mínimo de 30% de mulheres exigidos pela lei. Isso ainda é uma preocupação e demonstra a desigualdade entre os sexos e a falibilidade do sistema com a baixa participação feminina nesse processo democrático — disse Fabiano. Que foi além em sua advertência:
— O que é ruim pode ser ainda pior. Ao analisar os registros de candidaturas e as condições de elegibilidade e inelegibilidade de cada um dos candidatos, temos observado número elevado de indeferimento de candidaturas femininas em Campos, algumas até por clara falta de interesse, o que notamos nos casos de renúncia e ausência da simples apresentação de documentos. Essa diferença é bem expressiva e desproporcional aos indeferimentos masculinos — comparou Fabiano.
Ele disse que o Ministério público vem orientando os partidos para que, ao longo do processo eleitoral, monitorem suas candidaturas e façam as substituições necessárias de forma adequada e em tempo hábil. “O que deve ser feito a partir de agora para os casos já conhecidos. Isso é essencial para garantir que a lei seja cumprida e que as mulheres tenham a devida participação no pleito. Queremos que a sociedade entenda a importância desse tema. A presença feminina na política é fundamental, e o respeito à cota de gênero é uma conquista que deve ser preservada”, completou o promotor eleitoral de Campos.
A posição do Ministério Público em defesa da cota feminina nas eleições municipais de Campos recebeu apoio. Como o do cientista político George Gomes Coutinho, professor da UFF-Campos:
— A preocupação do MP é a preocupação de todos nós que seguimos vigilantes com a qualidade da democracia brasileira. Nosso sistema, dentre outras definições, é chamado de “democracia representativa”. Portanto, se espera que o poder político constituído “represente” sua população. Isso implica que os agentes políticos realmente existentes, aqueles em exercício, de alguma maneira “tenham a cara” da população que vota e os mantém com pagamento de impostos diretos e indiretos. Em um país cuja maioria é de mulheres é um contrassenso termos uma classe política majoritariamente masculina. Idem com relação ao que verdadeiramente somos em termos raciais e de classe social — disse George. Que seguiu:
— A classe política brasileira ainda é desproporcionalmente branca e economicamente privilegiada, o que gera o fenômeno da super-representação desses interesses em detrimento de nossas maiorias concretas em termos populacionais. Inclusive esta falta de representatividade, por óbvio, leva água ao moinho para o que chamamos de “crise das democracias contemporâneas”. Não é crível criticarmos o eleitor quanto este se queixa de não se enxergar na classe política. O fenômeno da super-representação de setores ajuda a compreendermos esse alheamento de parte da sociedade, faticamente sub-representada, com relação ao poder político exercido formalmente — completou o cientista político.