Por Mário Sérgio Júnior e Aluysio Abreu Barbosa
Promotor eleitoral de Campos, Fabiano Rangel Moreira fez um balanço do trabalho de fiscalização do Ministério Público Eleitoral (MPE) no processo eleitoral até a decisão soberana e secreta do eleitor na urna de hoje (6). A missão do MPE, segundo ele, “é manter a imparcialidade e garantir que sua atuação não seja indevidamente utilizada para perseguições políticas ou para provocar injustiças. Cabe à instituição zelar pelo equilíbrio do pleito, respeitando as disputas legítimas travadas entre as partes, sem que sua intervenção favoreça um lado em detrimento do outro. Essa ponderação deve ser feita cuidadosamente em cada caso, e, na maioria das vezes, baseia-se em situações semelhantes já analisadas pelos tribunais superiores, essencial à segurança e equilíbrio. Neste cenário, há muitas situações que consideramos ‘injustas’, mas não há o que ser feito”, lamentou o promotor. Que, entre as irregularidades combatidas, destacou: “a ampliação do uso de plataformas digitais e de reclamações relacionadas às fake news, que agora constituem uma parcela significativa das demandas processadas. Dentre as irregularidades mais graves, as denúncias envolvendo abuso no uso de recursos financeiros e candidaturas patrocinadas por organizações criminosas”.
Folha da Manhã — Qual avaliação pode fazer sobre o processo eleitoral até o momento?
Fabiano Rangel Moreira — O Ministério Público entende que o processo eleitoral vem se mantendo dentro da legalidade, sobretudo na verificação da propaganda eleitoral, no registro de candidaturas e na apuração de denúncias. No entanto, há uma série de questões novas, algumas de maior complexidade, como o uso inapropriado de meios tecnológicos, o interesse de organizações criminosas na ocupação de espaços políticos e situações não previstas em leis ou resoluções do TSE.
Folha — O que mais pesou no trabalho do MPE nas eleições deste ano em Campos e região?
Fabiano — A vasta extensão territorial de Campos, aliada à acirrada rivalidade política entre partidos e candidatos, configura um cenário particularmente desafiador. Um dos maiores obstáculos enfrentados pelo Ministério Público Eleitoral é manter a imparcialidade e garantir que sua atuação não seja indevidamente utilizada para perseguições políticas ou para provocar injustiças. Cabe à instituição zelar pelo equilíbrio do pleito, respeitando as disputas legítimas travadas entre as partes, sem que sua intervenção favoreça um lado em detrimento do outro. Essa ponderação deve ser feita cuidadosamente em cada caso, e, na maioria das vezes, baseia-se em situações semelhantes já analisadas pelos tribunais superiores, essencial à segurança e equilíbrio. Neste cenário, há muitas situações que consideramos “injustas”, mas não há o que ser feito. Um dos exemplos é a interpretação, por muitos considerada leniente, da Lei da Ficha Limpa. Além disso, o Ministério Público Eleitoral precisou enfrentar questões práticas de grande relevância, como a fiscalização em áreas de difícil acesso, situações de desvio ou não da máquina pública, o abuso de poder econômico e político nas mais diversas formas, a crescente utilização de mídias digitais e formas de materialização da prova, dentre outras.
Folha — O número de denúncias foi maior ou menor em comparação com a última eleição municipal? Destacaria as mais comuns e as mais graves?
Fabiano — Não temos dados ou sistema que contextualize denúncias entre eleições, sobretudo em razão de haver muitas disparidades entre as matérias. Foi possível perceber uma ampliação do uso de plataformas digitais e de reclamações relacionadas às fake news, que agora constituem uma parcela significativa das demandas processadas. Dentre as irregularidades mais graves, as denúncias envolvendo abuso no uso de recursos financeiros e candidaturas patrocinadas por organizações criminosas.
Folha — Houve muita fake news na campanha eleitoral? Qual a maneira mais eficaz de combatê-las?
Fabiano — A proliferação de fake news se destacou como uma das maiores preocupações neste período eleitoral, exigindo ações do Ministério Público, da Justiça Eleitoral e das plataformas digitais. A Resolução nº 23.610 do TSE oferece ferramentas para uma resposta rápida a conteúdos falsos, incluindo o direito de resposta e a remoção imediata de materiais fraudulentos. A parceria com empresas tecnológicas, como o grupo Meta (Facebook e Instagram), o papel proativo dos advogados eleitorais e a atuação integrada com a Polícia Federal são elementos cruciais no combate à desinformação, reforçando a transparência e a legitimidade do processo eleitoral.
Folha — Quais as principais irregularidades identificadas pelo MPE nas eleições de 2024 em Campos e região?
Fabiano — A maioria das irregularidades verificadas até o momento está relacionada ao uso indevido de recursos de campanha em propagandas digitais, sem a devida comunicação à Justiça Eleitoral. Muitos candidatos não declararam a intenção de utilizar redes sociais para fins eleitorais, mas realizam impulsionamentos pagos, o que viola as regras de transparência previstas na legislação eleitoral.
Folha — Na questão da cota de gênero houve muita diferença entre candidaturas femininas e masculinas?
Fabiano — A cota de gênero, que prevê a reserva mínima de 30% das candidaturas para mulheres, tem sido fiscalizada rigorosamente pelo MPE. Contudo, ainda persiste uma clara disparidade na participação feminina, com indícios de candidaturas laranjas sendo investigadas.
Folha — A fiscalização da lei eleitoral se destaca da cível e da criminal pela celeridade das ações. Como conjugar celeridade com eficiência e capacidade de resolução?
Fabiano — A celeridade da Justiça Eleitoral é assegurada por procedimentos próprios que agilizam a tramitação de ações, como as representações eleitorais e as ações de investigação judicial eleitoral. O uso de sistemas eletrônicos, aliados à estrutura híbrida do Ministério Público, permite uma atuação rápida e eficiente, sem que isso comprometa a qualidade. Isso não impede que haja interpretações divergentes, como em todas as demais esferas processuais.
Folha — Qual sua expectativa do processo eleitoral até as urnas de 6 de outubro?
Fabiano — A expectativa é que, com o fortalecimento das ações de fiscalização e a cooperação com entidades de monitoramento digital, o processo eleitoral se desenvolva de forma mais transparente e com menor interferência de práticas ilícitas. Prevemos um aumento nas denúncias, principalmente relacionadas à propaganda irregular e ao abuso de poder econômico. A principal dificuldade enfrentada pelo MPE é a análise de denúncias anônimas, muitas vezes sem fundamentação jurídica suficiente, o que dificulta as investigações da Polícia Federal, da equipe de fiscalização e do grupo de agentes policiais que auxilia os promotores. Nosso objetivo é garantir que o processo eleitoral seja justo, seguro aos eleitores e transparente, assegurando que o eleitor tenha plena liberdade para votar de forma livre.
Folha — Qual o papel do MPE no exercício e manutenção da democracia através do voto popular?
Fabiano — O Ministério Público Eleitoral desempenha um papel essencial na preservação da democracia, assegurando a legalidade e a integridade do processo eleitoral. Desde a fiscalização das candidaturas até o combate à corrupção eleitoral, o MPE atua em todas as fases, garantindo que o voto seja exercido de forma livre e consciente. A independência do Ministério Público e a imparcialidade da magistratura são fundamentais para resguardar o voto, para que o processo eleitoral continue se desenvolvendo em conformidade com os princípios democráticos.
Publicado hoje na Folha da Manhã.