Onde os fracos não têm vez

Nesta semana, publiquei três textos de outros autores, por tê-los julgados lapidares nos assuntos que tratavam: dois de Christiano Abreu Barbosa (aqui), postados primeiro em seu blog “Ponto de Vista” (aqui e aqui), esmiuçando o assunto jornal,  e um do Paulo Caxinguelê (aqui), publicado na última segunda-feira como colaboração semanal na edição impressa da Folha, sobre a conturbada política interna do Instituto Federal Fluminense (IFF), pré e pós eleições nos campi Campos-Centro e Macaé.

Dentro dessa mesma linha, segue abaixo o artigo “Anonimato”, da Fernanda Huguenin, postado hoje em seu blog  “O Cru e o Cozido” (aqui), também hospedado na Folha Online, que será publicado amanhã, na edição impressa da Folha Dois. Fruto das mesmas duas mãos que têm semeado, já há algum tempo, alguns dos melhores escritos na mídia impressa e virtual desta terra de planície, o novo texto de Fernanda é capaz de de arrancar com uma das mãos as máscaras dos covardes, enquanto reserva a outra para desferir um dialético e estalado tapa na cara de quem há muito faz por (e talvez deseje) merecê-lo. E tudo na mais alta classe de uma mulher que não teme homens e deles não precisa para se defender.

Pois coberta de razão está a antropóloga e blogueira: “No mundo virtual, pode até ser que o anonimato esconda certas fraquezas, sobretudo, as de caráter. Mas no mundo real, os fracos não têm vez”.

Abaixo, a íntegra do texto:

 

Anonimato

Por fernanda, em 08-04-2010 – 10h24

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Uma das principais características das sociedades urbanas é o anonimato. Transitando por viadutos ou morando em edifícios lotados, o indivíduo jamais espera cumprimentar um conhecido no shopping e sequer sabe o nome do vizinho que encontra todo dia dentro do elevador. Isso é o que ocorre em grandes cidades como o Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília. O anonimato restringe o controle social e, por isso, é uma faca de dois gumes: por um lado, libera o indivíduo para a realização de seus desejos sem os olhares repressivos da moral, por outro, o transforma em mais um solitário na multidão sem vínculos de solidariedade.     

Em sociedades ainda provincianas e tradicionais como Campos, o anonimato não chegou. Ou se chegou, é ainda muito frágil. Entre as elites, as colunas sociais dão conta de adornar brasões ou fabricar celebridades instantâneas. Entre as classes polulares, o controle da familia e da vizinhança chega a ser rigoroso através de instrumentos como o machismo e a fofoca.  Caberia às camadas médias, portanto, a ênfase do individualismo, conferindo à família e às instituições um lugar englobado pelo fluxo e refluxo de um acionar de relações centrado na vontade e no interesse do indivíduo. Mas a classe média campista não atua neste sentido extamente porque o anonimato aqui é muito esparsado e, consequentemente, as repressões morais funcionam através da desaprovação e do repúdio social.

O mundo virtual, diante deste cenário, funciona como válvula de escape. Protegidos pelos apelidos e pela invisibilidade da tela, os indivíduos saem dos armários de seus recalques sem medo do retorno da crítica. É isso o que acontece nas salas de bate-papo do ciberespaço. E é isso também o que chega para nós, blogueiros da Folha: opiniões mal educadas, acusatórias e ofensivas de pessoas que se escondem atrás de apelidos no mínimo inusitados, para não dizer ridículos. A pergunta que me faço é: quais são os temores desses pseudoanônimos se vivemos numa sociedade democrática? Sim! Absolutamente democrática, contando que as identidades sejam reveladas para que direitos e deveres sejam requeridos.

N’o cru e o cozido, posto todos os comentários, ainda que criticamente contrários ao que escrevo, desde que os leitores se revelem. Isso é regra básica e não censura. Não escrevo no anonimato. O meu rosto e o meu nome estão estampados no jornal toda semana, expostos a toda sorte de antipatias. Então, o mínimo que posso exigir é uma relação de igual pra igual. Uma crítica devidamente assinada revelaria o bom senso e a abertura para o diálogo daqueles que escrevem. É fácil ser agressivo mascarado, da mesma forma que é confortável soltar a franga nas megalópolis. Não é para o Rio, quando não para Europa, que vão muitos campistas no fim de semana?        

Esse anonimato que produz falas de viés é próprio de gente que arrota democracia, mas, no fundo, está ruminando sua própria tirania. Ao contrário da “Noite dos mascarados”, cantada por Chico Buarque e Nara Leão, nem preciso saber “quem é você” porque, não tenho dúvida, os anônimos são sempre os que, no dilema do prisioneiro da teoria dos jogos, optam pela covardia. São vergonhosas fraudes. Caso contrário, não temeriam a própria assinatura. No mundo virtual, pode até ser que o anonimato esconda certas fraquezas, sobretudo, as de caráter. Mas no mundo real, os fracos não têm vez.

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Este post tem 2 comentários

  1. Aluysio

    Caro “Torquemada” (das 9h48, IP: 187.116.84.135),

    Pelo visto, o tapa na cara desferido pela Fernanda está ardendo até agora… (rs)
    De qualquer maneira, em nenhum dos blogs hospedados na Folha, como bem definiu a antopóloga, há espaço ao anonimato que esconde as fraquezas, sobretudo as de caráter.

    Abraço e grato pela colaboração!

    Aluysio

  2. Aluysio

    Caro “Torquemada” (da 1h32 e 1h35, IP: 187.116.83.75)

    Meu assíduo leitor, após o tapa na cara dialético desferido pela Fernanda, dar a outra face — seja por cristianismo enrustido, “síndrome de Estocolmo”, ou simples constatação de inferioridade intelectual e moral — só confirma a reincidência no desejo de apanhar já diagnosticado pelo blog… (rs)
    Ademais, sua insistência em querer participar das discussões deste espaço virtual, manifestada até por IP’s distintos, evidencia talvez uma patologia, pela pretensão de subverter uma regra bem conhecida pelos milhares de leitores diários da Folha Online e dos blogs nela hospedados, resumida pela antropóloga em definição lapidar, que repetimos pela última vez: aqui não há espaço para o anonimato que esconde certas fraquezas, sobretudo as de caráter.
    Ao fim e ao cabo, fica o limite do blog estabelecido pelo vaticínio de um dos nossos tantos leitores com coragem para se assumir quando querem também ser lidos, o Newton Guimarães de Almeida, em comentário de hoje, cinco posts abaixo: “acho a Folha da Manhã democrática até demais com certos comentários que, a gente que escreve, conhece pelo estilo e chegam da mesma fonte, anonimamente por apelidos”.

    Abraço e grato pelas reiteradas tentativas de participação,

    Aluysio

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