O crime encurrala governos e cidadãos de bem. Nos últimos dias, na favela da Rocinha, capital do Rio de Janeiro, traficantes de drogas e armas demonstraram, mais uma vez, do que são capazes. Por outro lado, o governador Luiz Fernando Pezão, o secretário de Segurança Pública e a Polícia Militar demonstraram outra vez do que são incapazes: combater ou impedir crimes de violência urbana. Chamem o Exército. A falência do estado do Rio de Janeiro serve como indicador da falta de autoridade das autoridades legitimadas e do colapso político iminente em todo o Brasil.
Governos que não governam, legislativos e judiciários que atendem a interesses corporativistas (incluindo os de criminosos), e não os da população: para que servem? Estão no poder e têm acesso a bilhões, trilhões, zilhões de reais em orçamentos públicos, mas a tal da corrupção e os desvios de recursos da Nação são práticas recorrentes, utilizadas sob o estigma do “rouba, mas faz”. Até quando a sociedade aguenta estas violências todas de uma “guerra” que parece não ter fim? O Rock in Rio e a “Rockcinha” in Rio apavorante dividiram holofotes. Festa e guerra genuinamente cariocas.
É mera sorte estar vivo em meio ao terror imposto por bandidos, pela omissão e ineficiência do Estado. A insegurança pública, seja na capital fluminense, em Campos ou em qualquer lugar do Brasil, é só um dos problemas graves enfrentados pela população. O desemprego, a desigualdade social, a péssima educação oferecida, a saúde pública em constante agonia, além da destruição de nossos recursos naturais, deterioração de cidades e espaços púbicos, o caos nosso de cada dia nos sufoca e nos mata de um jeito ou de outro. A presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, disse que os problemas dos brasileiros só podem ser resolvidos pelos brasileiros. Como?
Penso que, se os representantes eleitos democraticamente, e se as instituições legalmente constituídas não solucionam coisas básicas como escola, hospital, transporte, segurança, desenvolvimento e bem-estar, caberá à sociedade desunida, estratificada, hierarquizada e individualista achar uma saída? Os acontecimentos que sinalizam para uma convulsão social afligem e afastam entendimentos, diálogos e confiança a curto prazo, me parece. Otimismo não costuma funcionar no meio de tiroteios, balas perdidas ou direcionadas. Se alguém leu este texto até aqui, merece ser cumprimentado. Afinal, vivo está. Sorte. O pior está por vir, já avisou o mega traficante preso Fernandinho Beira-Mar.
Até setembro de 2017, mais de 100 policiais morreram no estado do Rio de Janeiro em confrontos com bandidos. Por dia, em média, 16 pessoas são vítimas de criminosos por balas perdidas, assaltos e assassinatos na capital, a deslumbrante Cidade Maravilhosa, “purgatório da beleza e do caos, capital do sangue quente, do melhor e do pior do Brasil”, segundo Fausto Fawcett. De dois em dois anos, elegemos homens e mulheres para governarem as cidades, os estados e o país, além de representantes nos parlamentos municipais, estaduais e federal. Não tem funcionado.
Por termos políticos ineficientes e corruptos, o fantasma dos golpes militares volta a rondar o país (como se militar fosse sempre sinônimo de honestidade e garantia de qualquer coisa boa e ordeira, veja que ingenuidade). Pessoas sem instrução ou com bastante escolaridade apelam para os extremos de esquerda ou de direita, se valendo de discursos raivosos e intolerantes, como o do presidenciável Jair Bolsonaro. Apontado por alguns como o novo salvador da Pátria, considero-os, me perdoem, no mínimo imbecis. Sei que está difícil eleger qualquer político brasileiro. Não culpo simpatizantes de Bolsonaro, Lula, Ciro ou Marina, pois temos tradição em eleger messias imbecis para nos salvar, ou, para nos dar alguma vantagem pessoal. Figuras como Temer, Lula, Garotinho, Rosinha, Dilma, Aécio, Cabral, Cunha, Maia e seus pares representam o pior de uma sociedade investida de malícia, astúcia, encenação, gana para perpetuação no poder, além de mentiras e traições contratuais.
Estamos no fundo do poço, mas alguém ainda acredita que eleições diretas já ou em 2018 mudarão alguma coisa. Infelizmente, ainda não. Quem precisa mudar (e muito, e para muito melhor) é o povo brasileiro cheio de qualidades e de graves defeitos. Quem estará disposto a sacrificar-se a si próprio, a família, os bens ou os sonhos em favor de um país?
Não faz muito tempo que a palavra “paradigma” passou a fazer parte do vocabulário de nove entre dez pessoas que se diziam informadas, instruídas e convictas de mudanças ou transformações sociopolíticas. O termo vinha precedido do verbo “quebrar”. Virou lugar comum a expressão. Repetida diversas vezes na mídia, nas palestras, nas salas de aula, nas igrejas, nos partidos políticos, a necessidade de “quebrar paradigmas” ficou batida pelo caminho. Com as trapalhadas da política brasileira e a incompetência de diversas instituições, arrisco dizer que, esfarelaram os paradigmas já antes quebrados.
Com modelos fracassados e desmoralizados, estamos agora em busca de “empoderamento”, a nova expressão de ordem, da vez ou da hora. O empoderamento da mulher, o empoderamento dos gays, o empoderamento dos negros, o empoderamento de religiosos, o empoderamento de ateus, o empoderamento das minorias, o empoderamento dos sem voz e dos sem vez. Assim como “paradigma”, o tal do “empoderamento” me irrita, confesso, devido à uma certa vulgaridade ou vã repetição exercidas em rodas intelectualizadas e em discursos de ativistas.
Sou a favor dos que defendem qualquer causa, veja bem, da liberdade de expressão, da escolha e da prática de qualquer idioma ou vocabulário que sirvam para comunicar, educar, transformar, elevar a vida de qualquer pessoa, animais ou da própria Natureza que carece de todos os cuidados, zelos e ações. Todavia, ainda me baseio na Constituição Federal cidadã que diz “todo poder emana do povo”. Ingenuidade e poesia textuais? O povo poderoso e empoderado não é legitimado pela Carta Magna? Revestido de tanto e de todo o poder, por que ainda vivemos atolados em sujeiras e chiqueiros, submetidos às minúsculas elites que se apoderam de tudo?
Confesso não entender até hoje a necessidade de empoderamento das mulheres nos últimos anos no Ocidente, pelo menos. Desde pequeno, minha mãe e as mulheres da minha família sempre foram de personalidade forte, além de grandes gestoras de pessoas e de finanças, donas de opiniões e argumentos. Eram e são referências de mulheres de poder, apesar de não se intitularem feministas (talvez desconheçam o significado). Não é muito diferente o matriarcado brasileiro, pois há décadas, mulheres chefiam famílias e administram casa e trabalho como nenhum homem consegue. Se elas recebem salários menores que os homens, também não entendo.
Ainda não compreendo como uma sociedade pode ser machista quando é de maioria feminina. Se temos homens educados sistemática e significativamente por mulheres (mães, avós, tias e professoras), por que o nível de igualdade entre homens e mulheres não se equipara? Historicamente, temos (poucas, é verdade) mulheres que se destacaram à frente de influentes países. Na antiga Inglaterra, Elizabeth I; Em Israel, Golda Meir; no Reino Unido, Elizabeth II e Margaret Thatcher; na Nicarágua, Violeta Chamorro; no muçulmano Paquistão, Benazir Buttho; na machista Índia, Indhira Gandhi; e mais recentemente, a icônica chanceler Ângela Merkel que governa a Alemanha há doze anos e terá mais quatro de mandato. Mulheres empoderadas causam inveja ou servem de exemplo para outras mulheres e outros homens do mundo? Algumas dessas líderes mundiais experimentaram poder e perseguição, algumas morreram assassinadas. Empoderamento ou poder têm muitos riscos.
Talvez, por influência de Nossa Senhora, costumamos olhar para mulheres poderosas como Maria, mãe de Jesus, associando-as à figura idealizada da mulher sinônimo de força, nobreza e pureza incorruptível. As mulheres já foram apontadas como uma solução moralizadora na política. Entretanto, não é bem assim. A atriz Marília Pêra, que já foi ridicularizada por ter votado em Fernando Collor em 1989, passou a ser patrulhada a cada nova eleição presidencial pelo voto infeliz que declarou. Quando Dilma Rousseff se tornou candidata à presidência, um jornalista procurou a atriz para que opinasse sobre as mulheres no poder. Temerosa por novas críticas, e julgando-se ignorante politicamente, a grande diva brasileira respondeu assim ao jornal O Globo: “Não sei de onde tiraram a ideia de que mulheres na política significa mais honestidade. Isto não é uma garantia, pois as mulheres são terríveis, e eu sei disso, sou uma mulher”.
Sem querer gerar intriga feminina e feminista, não posso deixar de questionar: afinal, o que querem as mulheres? Eu penso que mulheres, homens, gays, negros, deficientes físicos, religiosos e ateus, todos, não carecem de mais empoderamentos, mas antes de qualquer coisa, precisam de respeito, respeitarem e serem respeitados em suas diferenças e semelhanças.
Se todos merecem respeito, os ex-governadores Rosinha e Anthony Garotinho também merecem, desde que respeitem outras pessoas, as instituições e as autoridades judiciais, como qualquer cidadão com ou sem foro privilegiado. A sentença que condenou Garotinho à prisão domiciliar com uso de tornozeleira eletrônica vem causando mexericos, piadas, discussões, críticas e ataques via mídias sociais. Grandes comunicadores e mobilizadores de massas, o casal Garotinho protagoniza mais um episódio barulhento na política.
Poderosos ou empoderados, marido e mulher fazem história há algumas décadas em acontecimentos escandalosos em suas gestões, e nas grandes disputas eleitorais. Ainda não sabemos se o casal chegou ao fim de carreira. Rosinha vem aparecendo como uma espécie de viúva de marido vivo, em tom dramático, quase argentino, de viúva de marido morto, como a ex-presidente da Argentina, Cristina Kirchner um dia se fez. A ex-governadora do Rio diz que ela e seu marido sofrem perseguição e são vítimas de injustiças por parte daqueles que condenaram Garotinho.
Por ser uma mulher poderosa e empoderada, Rosinha não se intimida em denunciar “a injustiça” sem maquiagem e sem retocar a raiz do cabelo, seja na porta de casa, em entrevistas coletivas ou no Facebook com vídeos caseiros, assumindo, aliás, que tem dopado o marido com calmantes para ele não sofrer ou morrer de tristeza pela “injusta” condenação que o mantém isolado, proibido de usar telefones ou internet, e de receber visitas apenas da família e advogados.
Entre as denúncias de perseguição, Rosinha se defende em vídeo desesperado e histérico, da acusação de violação da tornozeleira utilizada pelo ex-governador. Confessa que contrariou orientações de advogados para que não fizesse vídeos e não postasse nas redes sociais. Porém, devido ao “terrorismo” que vem sofrendo, ela precisava compartilhar com a população, com seus eleitores, com a imprensa e com as autoridades, a “mentira” que inventaram de Garotinho ter deixado a prisão domiciliar sem autorização da justiça ou polícia federal. Rosinha me comoveu, confesso. Qual homem que não se constrange quando uma mulher chora?
Não sabemos ainda o desfecho ou os desdobramentos das acusações e julgamentos de processos que envolvem o casal de políticos mais emblemático do estado do Rio de Janeiro. A calçada em frente à casa rosa da Lapa virou ponto de peregrinação e muro das lamentações. Porém, Garotinho foi dopado. Adormecido, deve sonhar com a liberdade e à volta aos braços do povo se reelegendo ao governo estadual, se elegendo presidente do Brasil ou da ONU, um dia.
Ainda não compreendo a falta de tornozeleiras eletrônicas no Brasil ou a falha do equipamento utilizado por criminosos condenados pela Justiça. O Supremo Tribunal Federal e o Ministério da Justiça poderiam assistir ao filme americano de 1991, Aliança Mortal (Wedlock), dirigido por Lewis Teague, e estrelado pelo extraordinário ator holandês Rutger Hauer, para solucionar o grave problema das cadeias e prisões brasileiras com um super equipamento eletrônico.
Na trama cinematográfica, cada prisioneiro tem um parceiro desconhecido e todos usam um colar explosivo. Caso o preso se afaste do grupo ou do par anônimo por uma determinada distância. o explosivo é acionado matando os dois condenados. Bum!!! Fuga possível, mas com risco de morte provocada pelos próprios criminosos sem a participação do Estado. É ficção, mas como diz Rita Lee, a rainha das mulheres poderosas e empoderadas do Brasil, “toda lenda é pura verdade” (ou deveria ser, penso). Fica a dica para os magistrados. Por falar em Rita Lee, a roqueira genial de Sampa é autora de uma canção extraordinária chamada “Todas as mulheres do mundo”, de 1993. O refrão diz o seguinte:
“…Toda mulher quer ser amada, toda mulher quer ser feliz, toda mulher se faz de coitada, toda mulher é meio Leila Diniz…”
A letra diz ainda “Elas querem é poder”, em outro trecho. Se elas querem, elas podem. Se Rita Lee pode; se Rosinha Garotinho pode; qualquer mulher pode, qualquer homem também pode. Ou não podem?
Não vai dar tempo de falar muito sobre a “cura gay” (que não existe). Eu apoio qualquer pessoa que se sinta infeliz com sua sexualidade e queira buscar apoio em qualquer consultório de psicologia, psicanálise, igreja, templo, terreiro de umbanda e afins. Tudo é valido para que ninguém seja infeliz, porém, que fique bem claro, ser homossexual não é motivo de vergonha, não é doença, não é anormal e não tem remédio ou cura. Ser heterossexual ou bissexual também não tem cura, e não deveria incomodar a ninguém.
A sexualidade é uma característica individual. Dá para ser feliz praticando sexo ou abrindo mão de sexo (esta não é a coisa mais importante da vida, pois cedo ou tarde, todo mundo broxa). Bom mesmo é se apaixonar, amar e cultivar amizade. Ninguém deve ser obrigado a nada, mas se amar e se aceitar do seu jeito, creio, é bem melhor. É algo poderoso desfrutar a liberdade, as bênçãos da vida e o prazer do corpo e da mente. Amor sempre ajuda em qualquer ocasião. Nossos governantes poderosos precisam aprender o que é amar seu país e sua gente. A população também precisa aprender o mesmo.
Depois de 36 textos, de dezenas ou centenas de opiniões distribuídas nesses escritos, despeço-me do blog Opiniões hoje. Por um ano e meio, escrever neste espaço me renovou e me motivou. Agradeço a generosidade de Aluysio Abreu Barbosa, amigo que admiro, ao jornal Folha da Manhã que publicou e imprimiu alguns destes textos, aos colegas escritores-colaboradores, e especialmente aos leitores, pois sem estes nada faz sentido para quem escreve. Foi uma honra. Fernando Pessoa diz que “viver não é preciso”, mas eu necessito viver e navegar outros mares imprecisos, cuidar da saúde e seguir adiante. Aporto um dia.
Foi um enorme prazer dividir contigo e com nossos colegas colaboradores o espaço democrático do Blog Opiniões, meu caro Ocinei. Saúde pra ti. Não nos percamos. Como ensina o gauche, Drmmond, “… vamos de mãos dadas. Abraço fraterno.