Quem assistiu à longa entrevista do ex-governador Anthony Garotinho (PR) exibida na noite de domingo, pelo SBT, com o jornalista Roberto Cabrini, deve ter reconhecido o estilo teatral. A intervenção de Rosinha para impedir que o marido revelasse uma “denúncia bombástica”, por receio de supostas represálias, lembrou os tempos em que o casal da Lapa era mais conhecido como atores amadores do Teatro de Bolso (TB) Procópio Ferreira. Independente dos seus reais motivos, a entrevista serviu para Garotinho tentar não só se colocar em rede nacional como antagonista do ex-governador Sérgio Cabral (PMDB), como causador da sua prisão.
Cabral x Bretas
Bem verdade que a determinação ontem da transferência de Cabral, de Benfica para um presídio federal fora do Estado, ainda a ser definido, beneficia Garotinho, por ter se dado no dia seguinte à entrevista. Mas a decisão e seu motivo revelam quem Cabral considera, de fato, seu algoz: o titular da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, juiz Marcelo Bretas. Em audiência ontem sobre a compra de joias para lavagem de dinheiro, o ex-governador respondeu ao magistrado: “Não se lava dinheiro comprando joias. Vossa excelência tem um relativo conhecimento sobre o assunto, porque sua família mexe com bijuterias”.
https://www.youtube.com/watch?v=4DZZ8ENfOVE
Calvários
Bretas não gostou e questionou se não se trataria de uma ameaça velada de Cabral, que estaria tendo acesso a informações, mesmo preso desde 17 de novembro do ano passado. Por isso acatou o pedido do Ministério Público Federal (MPF) pela transferência do ex-governador. Antes, este chegou a dizer ao juiz: “Eu estou sendo injustiçado. O senhor está encontrando em mim uma possibilidade de gerar uma projeção pessoal, e me fazendo um calvário”. Curiosamente, lembra aquilo que Garotinho também acusa o juiz eleitoral de Campos Ralph Manhães, que o condenou a 9 anos e 11 meses de cadeia, na Chequinho.
Bastidor da peça
Antes de tentar pegar carona no “calvário” que o próprio Cabral atribuí a Bretas, Garotinho teve na última quinta (19) uma mostra do que lhe espera, caso tente outra vez retornar ao Palácio Guanabara. Ao lançar sua pré-candidatura a governador pelo PR, no Rio, ele não contou com a presença de nenhum dos sete deputados federais do partido no Estado. Dos três deputados estaduais do PR, só Bruno Dauaire apareceu. E, dos sete prefeitos fluminenses da legenda, Amarildo do Hospital, de São Fidélis, foi o único presente. O vazio não foi exibido em rede nacional pelo SBT, mas é o bastidor que definirá o elenco e o texto da peça em 2018.
Alerta na rede
O caso do pedófilo preso em flagrante em Campos aliciando uma menina de apenas 10 anos pela internet traz à luz uma discussão que não pode ficar à sombra da evolução tecnológica da comunicação. Os avanços e os benefícios são inegáveis, porém, o caso lembra do alerta permanente que os pais devem ter com os filhos menores de idade que possuem contato direto com as redes sociais. Muitos criminosos se escondem em perfis fakes para atrair a atenção das crianças e adolescente e o anonimato da rede, aliado com a falta de aparato de fiscalização do Estado, tornam a internet um prato cheio para esses criminosos, o que redobra a responsabilidade e cuidados que os pais precisam ter.
Preservação
A superintendência de Igualdade Racial de Campos promoveu ontem uma reunião com representantes de diversas secretarias e superintendências municipais para debater propostas de ações integradas em benefício das comunidades remanescentes de quilombolas. A proposta é definir projetos que colaborem para a melhoria da qualidade de vida dos descendentes de escravos, promovendo a preservação de sua cultura. Segundo a superintendente Lucia Talabi, estão sendo definidos ações para levar ações de resgate e preservação de identidade cultural dessas comunidades.
Perdas
Músicos de Campos, como o maestro Ethmar Filho e o professor Hélio Coelho externaram pesar pela morte do trombonista Roberto Marques, campista que alcançou projeção nacional, tendo participado de espetáculos antológicos, como “Tom, Vinicius, Toquinho e Miúcha”, “Ópera do Malandro”, de Chico Buarque , além de ter atuado com Roberto Carlos, Bethânia, Roberto Carlos, Milton Nascimento, Caetano Veloso, Ney Matogrosso, Simone, Alcione, Martinho da Vila, Nelson Gonçalves. Outro que partiu foi o narrador esportivo Diney Monteiro que atuou em rádios de Campos, São Paulo, Minas, Bahia e Paraná.
Com os jornalistas Aldir Sales e Paulo Renato Porto
Todos aquele que não vivem em Marte já perceberam que há algo de muito diferente no debate cultural brasileiro. Da quase censura informal a um atual estágio de domínio nas redes sociais, o discurso de direita renasceu no Brasil com força total nos últimos anos. Nas mais diversas áreas como literatura, teatro, televisão, cinema e internet, dezenas de personalidades que adotam abertamente posições conservadoras e liberais já lideram as curtidas e repercussões nas redes sociais. A incapacidade da esquerda em entender o sucesso da nova direita é, ela mesma, a própria natureza do problema.
Como é comum a todo regime autoritário de supressão de liberdades, a ditadura imposta pelos militares ao país a partir de 1964 elegeu a cultura e a academia como válvulas de escape da tensão social. Com a oposição política reduzida a meros ruídos, o discurso de esquerda encontrou nas universidades e nos ambientes artísticos terreno fértil para prosperar. Terminado o regime militar, décadas de hegemonia de pensamento formaram batalhões de profissionais e personalidades ávidas para pôr em prática suas ideias. Daí para o aparelhamento de órgãos de representação, entidades estatais e paraestatais, redações, curadorias etc foi um pulo.
Em posse das correias de transmissão do conhecimento e dos instrumentos de poder que colocam em prática as políticas públicas, as ideais esquerdistas pautaram o debate político nos últimos 30 anos. Qualquer dissidência ao novo status quo era rapidamente classificada como reacionária e lançada fora da arena de debate ou obrigada a se retratar. A deformação ideológica sofrida no Brasil foi tão grande que chegamos ao ponto de tratar como direita os tucanos da social-democracia, que, em sua origem europeia, fora uma tentativa desesperada de sobrevivência dos ideais socialistas pós-queda do muro de Berlim. Como foi possível, então, uma ascensão tão rápida e silenciosa da nova direita?
Entra em cena a chave do recente sucesso do discurso conservador e liberal: o povo. Não aquela massa indefinida em nome da qual a esquerda pensa representar e em nome de quem pretensamente fala. Mas o povo enquanto reunião de milhões de indivíduos de carne e osso, cada um com suas próprias contingências. Indivíduos preocupados com a possibilidade real de levar um tiro durante um assalto e que nada aconteça ao seu algoz. Indivíduos que não suportam o custo de sustentar um Estado incapaz de fornecer algo próximo do básico de serviços essenciais e que não atrapalhe suas vidas. Pessoas que cansaram das promessas de redenção através da política porque sabem que, invariavelmente, pagarão em dobro pelo fracasso. Pessoas que, cansadas dos problemas reais, assistem “especialistas” de telejornal despejarem soluções ineficazes originárias de debates acadêmicos em que todos concordam. Pessoas que foram censuradas e a quem foi dito que há coisas que não podemos falar porque é ofensivo ferir a sensibilidade alheia. Pessoas que, com seus vícios e virtudes, cansaram-se da acusação de que seu modo de vida e seus valores representam o atraso e deu origem ao que há de mais reprovável no mundo.
O povo, tão bajulado no discurso e nos livros, há muito tempo foi relegado ao papel de justificador de toda solução fracassada da esquerda. Ao observar a total desconexão entre o que era dito em seu nome e o que ocorria em suas vidas, o povo encontrou novamente um discurso para chamar de seu.
A nova direita faz sucesso porque exige que a lei seja aplicada de forma dura e indistinguível. Porque afirma que os políticos e o estado, quando muito, podem atrapalhar pouco a vida do cidadão comum; porque reconhece que o modo de vida de cada um não objeto de discussão conquanto não agrida outras pessoas; porque reconhece a contribuição para a liberdade e prosperidade legadas pelos valores que definem a maior parte do povo brasileiro. A nova direita faz sucesso porque ousa dizer o que deixou de ser dito, faz sucesso porque ridiculariza os novos consensos e relativiza os novos tabus.
O caricato reacionário saudoso da ditadura só existe no espantalho criado pelo discurso esquerdista para disparar as velhas armas retóricas. Em vão. Ser de direita, no Brasil, é a nova revolução.
Num Brasil de debate político bipolar, a 11 meses da eleição presidencial de 7 de outubro de 2018, tentar enxergar as áeras cinzentas entre os supostos preto e branco é um esforço necessário. E, às vezes, mesmo na curta evergadura de um blog e um jornal do interior, é trabalho recompensado. Sobretudo quando se constata que a tentativa de análise do quadro nacional, feita de Campos, caminha lado a lado, ao mesmo tempo, com alguns dos principais jornais e jornalistas do Brasil.
Nesse sentido, algumas observações feitas na matéria de análise intitulada “Brasil entre Lula e Bolsonaro?”, publicada na postagem abaixo do blog e na edição dominical da Folha da Manhã de hoje (22), tiveram abordagem muito parecida pela Folha de São Paulo e O Globo, no mesmo dia. E algumas vezes partindo da mesma fonte, como o diretor do Datafolha Mauro Paulino.
Feita pelo insitituto de pesquisa, entre 27 e 28 de setembro, com 2.772 pessoas, em 194 cidades do país, a consulta Datafolha à corrida presidencial de 2018 resgitrou a liderança do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do deputado federal Jair Bolsonaro (PSC).
Quem não leu a matéria da Folha (da Manhã) pode fazê-lo aqui. E quem quiser confirmar alguns dos seus principais pontos a partir de O Globo (aqui e aqui) e da Folha de São Paulo (aqui) pode conferir nas suas repoduções abaixo:
Sobre João Doria:
Sobre os eleitores de Lula e Bolsonaro:
Por Gabriel Cariello e Marco Grillo
Uma combinação ideologicamente improvável foi identificada pelo Datafolha, que divulgou no início do mês mais uma pesquisa de intenção de voto para a eleição presidencial de 2018: o voto “Lulanaro” ou “BolsoLula” — o eleitor de Lula que votaria em Bolsonaro e vice-versa.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lidera em todos os cenários apresentados pela pesquisa, com até 36%. Nas simulações em que ele não aparece, 6% dos seus apoiadores afirmam que escolheriam o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ). No sentido contrário, a migração é maior: até 13% dos eleitores que votariam no parlamentar (sem Lula na disputa) responderam que apoiariam o petista caso ele estivesse no páreo.
— Existem eleitores que, diante do cenário de muita corrupção, crise econômica, se tornam mais pragmáticos. Vão olhar aquele que vai resolver a situação de forma como ele entende mais rápida e eficiente, independentemente da corrente política — analisa o diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino.
De modo geral, os perfis dos eleitores médios de cada um são opostos. Lula tem mais apoio entre os menos escolarizados e com renda mais baixa; já Bolsonaro tem seu melhor desempenho nas faixas de renda mais altas e entre os mais escolarizados. Para Paulino, a busca por uma solução imediata faz com que determinada parcela do eleitorado tenha escolhas que, numa análise ideológica, seriam inconciliáveis:
— Acho que isso hoje é preponderante. O eleitor não está preocupado se (o candidato) é de direita ou esquerda, se defende pena de morte ou não, mas preocupado em ter de volta as conquistas que perdeu. No caso dos eleitores do Lula, têm saudade do tempo em que as coisas andavam melhor e eram associadas ao governo dele. Mas, se ele (Lula) não puder ser candidato, podem até votar no Bolsonaro, desde que se convençam de que o Bolsonaro pode resolver os problemas, como a violência, por exemplo.
O sociólogo Paulo Baía, professor da UFRJ, afirma que existe um recorte do eleitorado que escolhe seu candidato mais por razões emocionais.
— Assim, em muitos casos, as razões pelas quais se vota no Lula, no Bolsonaro, na Marina (Silva), no (João) Doria, no Ciro (Gomes) podem ser as mesmas razões. É um eleitorado não ideológico, em que a politização é emocional, e o voto é dado até com uma certa irritação.
A maior parte do eleitorado de Lula, no entanto, segue um caminho mais tradicional e escolhe candidatos mais alinhados quando o ex-presidente não aparece como uma opção: Marina Silva (25%) e Ciro Gomes (14%) — ambos foram ministros durante o governo do petista. Outros 29% dos eleitores de Lula declaram que pretendem anular ou votar em branco se ele não estiver na disputa. Nessa hipótese, apenas 4% dos eleitorado de Lula escolheriam outro possível candidato do PT, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, que ocupou o Ministério da Educação na gestão do PT. Para Paulino, a explicação está na baixa taxa de conhecimento de Haddad pelo eleitorado e no fato de Lula não ter deixado claro que o ex-prefeito será seu candidato caso ele não possa concorrer.
— Não há ainda apoio explícito do Lula ao Haddad, que é pouco conhecido. E 26% dos eleitores responderam que votariam com certeza no candidato indicado pelo Lula. Entre os que nós testamos, é o que tem maior potencial de transferência de votos. Por isso que ele é a figura central da eleição.
Para Paulo Baía, além do desconhecimento, o resultado ruim de Haddad no ano passado — tentou se reeleger e perdeu a eleição no primeiro turno para Doria — levou o petista para um patamar inferior.
— Ele se saiu muito mal e perdeu densidade eleitoral. Acredito que, se o Lula não for candidato, o PT poderá escolher o Jaques Wagner (ex-governador da Bahia), que vem de um estado importante e onde o partido ainda tem relevância — disse Baía, em referência ao fato de o estado ser governado pelo petista Rui Costa.
“É interessante que os jornalistas americanos tenham subestimado Donald Trump. O que me perguntam frequentemente é se o público ou a mídia deveriam levar a sério candidatos bizarros como ele. Minha resposta é: sim, nós temos que levar essas pessoas a sério”. Foi o que advertiu (aqui) o jornalista Ryan Lizza, correspondente em Washington da conceituada revista New Yorker, que esteve durante a semana no Rio para uma palestra.
Levada a sério a última pesquisa DataFolha sobre a disputa à presidência do Brasil em 2018, feita entre 27 e 28 de setembro, com 2.772 pessoas, em 194 cidades do país, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é apresentado (aqui) como candidato em três situações de primeiro turno. E, vence em todas, chegando ao máximo de 36% das intenções de voto.
A vitória de Lula seria confirmada nas quatro simulações de segundo turno com seu nome. Nestas, dentro da margem de erro de dois pontos percentuais para mais ou menos, o líder petista só ficaria em empate técnico (44% a 42%) contra o juiz federal Sérgio Moro, que não é filiado a nenhum partido e já disse reiteradas vezes (aqui) que não participará da eleição.
O fato do nome de Moro estar na consulta, deixa dúvida da intenção. Outra dúvida, muito mais importante, é matemática. Segundo o Datafolha, 54% dos brasileiros acham (aqui) que Lula merece ser preso pelos crimes pelos quais já foi condenado, em julho, pelo próprio Moro, ou por aqueles em que é réu em outras cinco ações penais. Da aritmética dos processos à da pesquisa, a contraposição dos seus números sugere uma questão surreal: 15% dos brasileiros pretendem que seu próximo presidente governe da cadeia?
Caso contrário, os 54% do eleitorado que querem Lula preso parecem remeter aos 44% (10 pontos percentuais a menos) da rejeição (aqui) de Anthony Garotinho (PR), quando este tentou retornar ao Palácio Guanabara em 2014. Foram estes números que, no voto, barraram o ex-governador do segundo turno, dando início à sua derrocada política e (aqui) financeira de Campos.
Entre prós e contras eleitorais, a primeira ameaça à pré-candidatura de Lula é jurídica. Ele foi sentenciado por Moro (aqui) a nove anos e meio de prisão, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no caso do triplex no Guarujá. Como a Lei do Ficha Limpa exige condenação colegiada, a elegibilidade (ou não) do ex-presidente será definida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF 4), que deu previsão (aqui) de julgar o caso até agosto.
Presidente do TRF 4, o desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz já declarou (aqui) que a sentença de Moro “é tecnicamente irrepreensível, fez exame minucioso e irretocável da prova dos autos e vai entrar para a história do Brasil”. Por mais que ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) como Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello sejam conhecidos pela capacidade de surpreender, a situação jurídica do ex-presidente parece difícil.
Ciente da gravidade da situação, o presidenciável alternativo da esquerda Ciro Gomes (PDT), ministro de Lula entre 2003 e 2006, desde o mês passado já não se furtava em atacar publicamente (aqui) o ex-presidente e a versão petista dos fatos:
— Não é possível insultar a inteligência do povo brasileiro e manter essa narrativa (de perseguição política). Nós estamos ferindo de morte a narrativa central de que ainda dava a nós alguma respeitabilidade na opinião pública progressista brasileira, que é a ideia de que o Brasil está sob um golpe de estado. Como é que eu posso então assistir o Lula abraçado com Renan Calheiros (PMDB/AL), que era senador e votou pelo impeachment?
De volta à pesquisa Datafolha, ela apontou também a desidratação da pré-candidatura presidencial do prefeito paulistano João Doria (por enquanto, PSDB). Ele já sofre críticas administrativas, não apenas da esquerda, pelos 10 primeiros meses de governo. Sua volatilidade ao sabor das redes sociais e, sobretudo, sua aproximação com o presidente Michel Temer (PMDB) — que tem 3% de aprovação popular, segundo (aqui) pesquisa Ibope/CNI de setembro —, igualaram Doria ao ex-padrinho e governador paulista Geraldo Alckmin (PSDB).
Nos cenários da consulta Datafolha contra Lula, os dois tucanos não passam dos 8% das intenções de voto no primeiro turno.
Melhor, a ambientalista Marina Silva (Rede) apareceu em terceiro nas duas simulações Datafolha com Lula. Sem ele, ela chegou a liderar no cenário com a opção petista mais provável (aqui): o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad.
Mas Marina pode ter perdido sua melhor chance no primeiro turno da eleição presidencial de 2014, quando chegou a pontear a corrida. E confirmou sua criticada fragilidade após ser imprensada na cerca pelos dois candidatos que romperam na reta do segundo turno: a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e o senador Aécio Neves (PSDB).
Diante à incerteza jurídica da candidatura de Lula, à ausência de Marina nos principais debates nacionais, aos rompantes de desequilíbrio (aqui) de Ciro, ao PSDB e PMDB reduzidos a fiadores da aliança (aqui) entre Aécio e Temer para fugir da Lava Jato, o centro busca um nome. Quem poderia ser o Emmanuel Macron, presidente francês eleito em maio último, em versão tupiniquim? A 11 meses das urnas brasileiras de 7 de outubro de 2018, só terá chance quem já for conhecido nacionalmente. Isto, somado ao desgaste do establishment político, faz com que se cogite nomes como Joaquim Barbosa e até Luciano Huck.
Figura de proa no julgamento do Mensalão — que Moro admitiu (aqui) ter inspirado a Lava Jato e toda a magistratura brasileira —, depois dele Barbosa saiu do STF por motivos ainda misteriosos. Sobre 2018, já abriu (aqui) e negou (aqui) a possibilidade. Ele seria o candidato a vice dos sonhos de Marina, que busca alguém do Judiciário para compor sua chapa. E teve o nome aventado até no PT, do qual já foi considerado algoz.
Já Luciano Huck tem mantido (aqui) conversas com o DEM. Entretanto, por mais popular que seja o apresentador de TV, custa crer que a política nacional tenha regredido ao ponto de ter uma metáfora do Brasil como “Lata Velha” na próxima campanha presidencial.
Enquanto a esquerda e o centro se dividem em dúvidas, a direita acena com as assertivas do polêmico deputado federal Jair Bolsonaro (PSC). A direção sinaliza ao mundo na placa da eleição do empresário Donald Trump à presidência dos EUA, em novembro de 2016. E, mesmo na Alemanha, o partido de extrema direita AfD ficou (aqui) em terceiro nas eleições legislativas de setembro deste ano, com 12,9% do eleitorado.
É a primeira vez que o discurso de xenofobia nacionalista ocupa cadeiras no Parlamento alemão, desde a derrocada do nazismo em 1945, ao final da II Guerra Mundial.
A cartilha anti-imigração de Trump e do alemão AfD já é pregada no Brasil (aqui) por Bolsonaro, cujos pais eram de ascendência italiana. Em visita recente aos EUA, ele reconheceu (aqui) em Boston, a emigrantes brasileiros: “O Trump serve de exemplo para mim”. Na verdade, segundo seus aliados, a viagem foi (aqui) uma tentativa de desfazer junto aos investidores internacionais sua imagem de estatista, associada à Ditadura Militar (1964/85) brasileira, que o ex-capitão do Exército defende e nega ter existido.
No esforço de se vender economicamente liberal ao capital internacional, durante entrevista à agência Bloomberg, em Nova York, Bolsonaro admitiu (aqui) privatizar a Petrobras — “menos para a China”, principal parceiro comercial (aqui) do Brasil. Novo defensor do estado mínimo, o pré-candidato quer deixar para trás aquele jovem deputado federal de 44 anos que, em 28 de dezembro de 1999, declarou (aqui) a militares que o então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) merecia “pena de fuzilamento” pelas privatizações do seu governo.
Antes do tour pelos EUA, na pesquisa Datafolha do final de setembro, Bolsonaro só ficou atrás de Lula, embora em empate técnico com Marina. Quando Haddad é colocado como candidato petista, o ex-capitão é ultrapassado pela líder ambientalista na liderança, mas também no empate dentro na margem de erro.
Marco da vitória de Barack Obama à presidência dos EUA, em 2008, a prevalência das redes sociais (aqui) sobre a TV ameaça acontecer pela primeira vez, uma década depois, numa eleição presidencial do Brasil. E esta tem sido, até aqui, a grande vantagem de Bolsonaro sobre os demais postulantes ao Palácio do Planalto: o uso massivo e competente (aqui) das redes sociais.
Quem duvida da sua força para outubro de 2018, teve uma prévia em setembro deste ano, com o cancelamento (aqui) da exposição do “Queermuseu” pelo Santander, em Porto Alegre, após pressão popular. A polêmica seguiu com os protestos (aqui) diante ao Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo, após uma mãe deixar a filha de 5 anos tocar um homem adulto nu, numa performance artística.
Viralizada nas redes sociais por grupos como MBL e seguidores do filósofo Olavo de Carvalho, a discussão não se ateve à necessidade de observância do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). E avançou para (aqui) a condenação moral e religiosa das questões de gênero, além da própria conceituação de arte por gente pouco capacitada a fazê-lo, numa cruzada virtual contra a classe artística brasileira.
É uma agenda que nenhum presidenciável, além de Bolsonaro, teria coragem de assumir.
A vantagem nesse novo flanco virtual, mas de importância real na estratégia da campanha de 2018, é reflexo do eleitorado. Diretor do Datafolha, Mauro Paulino destacou (aqui) ao jornal El País que 60% dos que declaram intenção de voto em Bolsonaro têm entre 16 e 33 anos.
Nascidos após a Ditadura, esses jovens não viveram a hiperinflação legada por ela, nem a estabilização econômica por FHC, mas lembram da corrupção sistêmica dos governos lulopetistas, eviscerada pela Lava Jato. Tanto na idade inferior, como no nível de escolaridade e renda familiar mais altos, são opostos ao eleitor padrão de Lula. Mas enquanto este tem seu reduto nas regiões Nordeste e Norte, que relativiza a corrupção e é saudoso da prosperidade do primeiro governo do ex-retirante, os simpatizantes do pré-candidato da direita são pulverizados pelo país.
Enquanto o centro não apresenta seu nome, ou comete a estupidez eleitoral de multiplicá-lo, o “nós contra eles” que passou a dividir o Brasil, nos 13 anos do PT no poder, parece ter encontrado gente disposta a jogar o mesmo jogo — dentro de regras de devoção acrítica e maniqueísmo semelhantes por oposição. E foi tratar Bolsonaro como bufão que o promoveu, de rival do deputado federal Jean Wyllys (Psol), para surgir hoje como sério opositor do político mais popular do Brasil, desde Getúlio Vargas (1882/1954).
Quem não seguir o conselho da imprensa dos EUA, nem que seja a revelação do segredo do cadeado após a porta arrombada por Trump, corre o mesmo risco.
Publicado hoje (22) na Folha da Manhã
A partir desta segunda (23/10), até 04/11, os colaboradores deste “Opiniões” vão trazer suas visões sobre o tema eleito pela maioria: o avanço da direita no Brasil
Em uma de suas músicas Nando Reis reflete: “o mundo está ao contrário e ninguém reparou”. Hoje, com as redes sociais, convivemos com especialistas sobre todos os assuntos e, em alguns casos, chega a ser assustador descobrir o que algumas pessoas pensam sobre temas polêmicos. Racistas, homofóbicos e extremistas avançam e encontram seus pares. Na política, a busca insana pelo poder revela criaturas capazes de tudo. Recentemente, em Campos, um político megalomaníaco usou o assassinato de uma mulher, baleada pelas costas diante da filha menor de idade, para atacar um adversário.
Esse surto coletivo me fez revisitar “Ensaio sobre a cegueira”, livro de José Saramago. A obra começa com um homem que fica cego enquanto estava parado no semáforo. A partir de então, a cegueira contagiosa se alastra rapidamente até que as autoridades decidem isolar as pessoas “contaminadas” em um manicômio abandonado. Neste ambiente, eles devem se organizar para viver pacificamente. Mas o número vai crescendo até que começam a ocorrer disparidades e conflitos por comida. Quando conseguem sair do local, encaram uma cidade em estado de colapso, onde os instintos estão aflorados.
O livro possui diversos trechos que revelam a intenção metafórica da obra, como “a responsabilidade de ter olhos quando os outros os perderam” ou quando uma moça sugere que eles sempre estiveram cegos, mas nunca perceberam. Saramago demonstra que a maldade não vem de fora, mas se trata de algo bem particular. Faz parte da nossa natureza e aflora de acordo com a forma que a alimentamos. Há um personagem que se transforma em um brutal explorador, usando seu poder de distribuir comida para fazer com que os outros cumpram sua vontade.
Trata-se de uma investigação corajosa da natureza e de sentimentos humanos como egoísmo, oportunismo e indiferença. O livro nos convida a refletir sobre o ser humano e seus instintos mais primitivos. Saramago lança perguntas do tipo: Como falar de olhos a um mundo cego? E quais são os caminhos para curar essa “cegueira” da humanidade?
Na história, muitos seres humanos já demonstraram cinismo e passividade diante de crueldades. Um exemplo foi a forma como alguns internautas comentaram, recentemente, a morte de crianças em uma creche incendiada por um vigia em Minas Gerais e agora com o menino que matou dois colegas em uma escola de Goiânia. Algo tão insuportável quanto os abutres que se aproveitaram dos episódios para ganhar acessos. Mas afinal, existe cura para a cegueira moral? O primeiro passo é “sair da ilha”, como ensinava Saramago: “É necessário sair da ilha para ver a ilha. Não nos vemos se não saímos de nós”.
Dedico este artigo as admiráveis companheiras educadoras de nossa cidade — Campos dos Goytacazes, que, numa triste coincidência, faleceram neste mês de outubro, mês do(a) Professor(a) – REGINA SARDINHA (03), MARIA THEREZA VENÂNCIO (14) e LÚCIA BASTOS L. BARRETO (16): perdas incalculáveis!
Estamos finalizando uma semana, que teve no seu início as “comemorações”(?) do ‘DIA DO(A) PROFESSOR(A). É unânime nos discursos e nas pautas políticas a importância da EDUCAÇÃO, a relevância da ESCOLA na formação das pessoas, das comunidades, das sociedades. Observando atentamente a História da Educação Brasileira esta pauta como Política Pública é nova, ela não se deu no século XVI – nos primórdios de nossa formação ocidentalizada. Inicia-se lentamente, muito lentamente, no século XX. Ela está estreitamente vinculada a transição de uma economia primário-exportadora para uma economia urbano-industrial, que se consolida fragilmente nos anos da Ditadura Civil-Militar, e, que, hoje, sofre uma inflexão socioeconômica desindustrializante, primário-exportadora, financeirizada-especulativa.
Há de se lembrar que este processo de modernização da economia e da sociedade brasileira, caracterizou-se pela dependência externa, por um lugar subalterno na Divisão Internacional do Trabalho. Há que se destacar, que não existiu e nem existe a ‘belíndia’ por aqui. Não há no Brasil uma dicotomia ou contradição entre os binômios, ‘atraso-moderno’, ‘campo-cidade’, ‘periferia-centro’, ‘pobre-rico’, é uma maneira muito superficial para explicar nossa condição. Esses ‘binômios’ representam o ‘jeito construído’ da nossa modernização, onde, articulados e interdependentes, todos eles, realizaram o que se denomina ‘modernização conservadora’. Aqui, um, não é a negação do outro. Eles se complementam, eles se auto reproduzem. Da mesma forma ocorre com as diversas frações do empresariado. O ‘novo’ é continuamente ressignificado, traduzido, à luz dessa secular estrutura histórica escravista, patriarcal, provinciana, dependente, subalterna, infelizmente não superada até 2017.
Por isso, ao avaliarmos o âmbito da Educação Brasileira não podemos desconsiderar criticamente este ‘pano de fundo’. Por estar umbilicalmente ligada à estrutura sócio-econômico-cultural, e, se, esta é DESIGUAL, a Educação será predominantemente marcada pela DESIGUALDADE E DUALIDADE em suas diversas expressões ao longo do tempo. A modernização urbano-industrial necessitou colocar o ‘povo’ na Escola. Não há dúvidas sobre isso. Daí o início dos exercícios de Políticas Públicas e de Legislações mais estruturadas e ampliadas. Entretanto, o que vem marcando a ‘forma’ nos conteúdos, pautas e discursos políticos é o que Paolo Nosella denomina de ‘Populismo Educacional’ – abre-se a porta da Escola para o povo, escancara-se o acesso, mas, a permanência e a qualidade socialmente referenciada, saem na mesma proporção por outras portas e janelas!
Assim, explicitamente ou não, teremos ao longo do tempo ‘duas escolas’ interdependentes, articuladas e consolidadas nos aspectos legais e de legitimidade, refletindo a desigualdade-dualidade. Esta ‘dualidade interdependente’ se explicita o tempo todo em Legislações ‘truncadas’, para atender as demandas do setor produtivo e aos atores dirigentes das Instituições, Sistemas e Redes educacionais de qualquer nível e modalidade de Ensino, a saber – Público-Estatal, Confessional e Privado. No atendimento a atores tão diversos, e, na maioria das vezes, tão incompatíveis em suas ‘missões’ e necessidades, observamos a hegemonia da lógica privada no pensar, no formular e no executar o Ensino, mais uma vez, em todos os seus níveis e suas modalidades.
É o que se denomina – ‘mercantilização da Educação’. Não apenas observando o número de matrículas e de estabelecimentos, e, nem, quem ocupa os cargos dos diversos Conselhos Educacionais e suas representatividades. É muito mais que isso! Estou falando de lógica, de pensamento, de projeto de vida, de valores, de ética, de convencimento, que perpassam o público-estatal, o confessional e o particular. O que é ‘estudar para o mercado de trabalho’? O que é ‘estudar para ser competitivo’? O que é ‘estudar para ser vitorioso’? O que é ‘estudar para o empreendedorismo individual’?
Não é à toa que o Banco Mundial se tornou o ‘pedagogo do capital’ a partir da década de 1990 até hoje, inspirador das mudanças educacionais para os países subalternos; não é à toa o fenômeno atual dos Sistemas educacionais privados, articulados a grandes investidores externos, abrirem seus capitais ao jogo especulativo, portanto, estéril para a maioria da sociedade, nas Bolsas de Valores. Na disputa pela Educação, presente, especialmente, nos debates duros das formulações legais, a hegemonia, a vitória, é a da lógica do mercado.
Podemos, e, devemos até replicar. Não é bem assim! Afinal, tivemos e temos espaços para inclusão de novas teorias e metodologias educacionais/pedagógicas nas Escolas, inclusive, inspirados em pensadores críticos da Educação, da Psicologia, da Psicopedagogia, da Neurociência, etc, etc. É verdade! Mas esta inclusão é feita ‘remendo novo em pano velho’; são adaptações e ressignificações necessárias frente a desigualdade-dualidade estrutural, lembram-se? Na maioria das vezes são verdadeiros ‘monstros didático-pedagógicos’, ‘vendidos’ como algo novo e libertador; ‘vendidos’ como modernidade criadora; ‘vendidos’ como panaceia para solucionar os problemas da Educação Brasileira. Não há começo, meio e fim, de forma coerente!
E assim o ‘Populismo Educacional’ avança, desmedidamente, agora assumindo o discurso da busca da qualidade socialmente referenciada, sobreposto ao Direito de acesso diferenciado, e, aos problemas não resolvidos da permanência, e muito mais! Incorporando e importando teses, ideias, conceitos, autores, inclusive, tidos como do campo progressista. Quanta interpretação equivocada, quanta ressignificação oportunista, etc, etc!
E nós Educadores neste contexto apresentado da Educação Brasileira? Considero-os o principal MEDIADOR do conhecimento técnico-científico-humanista, bem como, o principal mediador da visão de mundo hegemônica. O seu PODER é imenso, como é imenso o poder da apropriação e da produção do conhecimento técnico-científico-humanista. Por isso, e, não por outra razão, ele é exaltado. Entretanto, exatamente a partir da ‘abertura das portas das escolas para o povo’, verificamos ao longo do tempo alguns processos em suas vidas, aparentemente contraditórios – a profissionalização e organização reconhecidas, convivendo passo-a-passo com um tripé em ‘3 Ds’ – a desvalorização, a desqualificação e a desmoralização! Isso não é natural, é histórico! É desta forma, não sendo a única razão, que nós servimos a reprodução e a perpetuação do status-quo.
Jamais serei romântica ou corporativa com a minha categoria docente, exatamente porque sei objetivamente do nosso papel na sociedade e porque fui privilegiada em poder escolher livremente esta profissão, no lugar da medicina que já iniciara! Gosto demais de ser professora, por isso ‘cuido’ e dou atenção a tudo que envolve o seu mundo do trabalho. Somos um POTENCIAL imenso de mudança para a construção de uma contrahegemonia que realize a Educação Pública, de Qualidade socialmente referenciada e Emancipadora! Até agora, só potencial!
Alguns elementos podem explicar esta condição perpetuadora do trabalho docente, esta ‘esquizofrenia’ que oscila entre a exaltação/consideração e a realidade concreta dos ‘3Ds’. Para começar destaco a nossa FORMAÇÃO – ela é também carimbada com a ‘dualidade interdependente’. Quantas e quantas vezes, encontramos professores que detestam assuntos que envolvem a Educação! Para eles o que importa é o conteúdo específico de sua formação ‘técnica’ – matemática, história, física, geografia, eletricidade, língua portuguesa, mecatrônica, literatura, educação física, etc! É a versão da divisão social do trabalho docente – uns pensam a área em sua totalidade, e, outros, executam o conhecimento de forma fragmentada. Pior ainda, quando, enquanto professor de determinada disciplina, rejeitamos e fazemos pouco dessa aprendizagem! E quando são hierarquizadas as disciplinas e/ou os cursos? Uns são mais importantes que outros, etc, etc!
Ah, se soubéssemos que essa condição é reveladora da reprodução e da produção minimalista e subalterna do conhecimento, portanto, da Educação!
Outro aspecto que destaco no caráter perpetuador da profissão docente, é a sua CONDIÇÃO E SEU LUGAR DE CLASSE. Estudos apontam que os professores, em sua maioria, pertencem a frações da classe média. Trazendo dentro de si e para fora, algumas caraterísticas desse meio, marcadas pela insegurança de seu ‘lugar no mundo’ (o horror do rebaixamento econômico-social!); pela tendência a se identificar com a visão de mundo das elites dominantes, já que não existe uma visão de mundo própria enquanto fração de classe média; portanto, é forte a sua tendência ao conservadorismo, e, às vezes, ao reacionarismo, devido ao ‘entre-dois’ de sua condição de classe. Somos uma ‘metamorfose ambulante’, somos ‘gelatinosos’, somos a ‘contradição social em ação’, somos ‘ventríloquos’!
Assim, quando trabalhamos com a camada popular, nas Escolas Públicas das periferias ou não, carregamos diversos preconceitos que se concretizam em atitudes, ora assistencialistas, ora descuidadas, ora fortemente marcadas pelo pedantismo e arrogância. Comportamento diverso quando atuamos nas Escolas Privadas e/ou Confessionais – parece que a gente se encontra nesse ambiente, nos tornamos ‘cordeiros’ convivendo com os ‘leões’ do Ensino. Um exemplo incontestável desse ‘entre-dois’, é quando grande parte de nós, ao não confiarmos no trabalho desenvolvido nos espaços públicos, onde a maioria de nós trabalhamos, colocamos nossos filhos nas Escolas Privadas e/ou Confessionais, especialmente na Educação Básica! No Ensino Superior, há uma tendência a inversão, não é mesmo? Por que?
É claro que existem exceções, brilhantes e heroicas exceções, mas são ‘pontos fora da curva’! Reafirmam a nossa condição descrita.
Ah, se soubéssemos que a precariedade, a privação, as fragmentações didático-pedagógicas e o desmonte de nossas Instituições Públicas de Educação articulados aos ‘3Ds” da condição dos educadores, fazem parte do utilitarismo burguês associado-dependente, é seu projeto de Educação! Que nossa estrutura socioeconômica, como é medíocre e subalterna dentro da ordem do capital, não exige qualidade de formação para a maioria, mesmo em tempos de reestruturação ‘fina’ do sistema produtivo. Nosso lugar no mundo ainda é periférico e interdependente. Por isso tudo em Educação, de todos os níveis e todas as modalidades, é tratado sem seriedade e de forma populista!
Ah, se soubéssemos que essa condição é reveladora da reprodução e da produção minimalista e subalterna do conhecimento, portanto da Educação!
Numa autocrítica rigorosa e generosa, encontraríamos em nós, um ‘tesouro’ explicativo – o individualismo de tipo ‘meritocrático’, que deveria ser extirpado de nossas consciências, pois, este, aparentemente inofensivo, nos faz compreender que a Desigualdade é fruto das diferenças de capacidade, de esforço, de oportunidade, de dedicação individual, em resumo, de dons e méritos. Se assim continuarmos, pouco avançaremos em nossa valorização, em nossa qualificação e no respeito e na dignidade que temos direito. As lutas no nível econômico, por salários, devem continuar, mas não podemos resumir nossas reivindicações a um ‘prato de lentilhas’!
Portanto, nesta semana de outubro que vai se encerrando, a minha celebração enquanto professora-educadora, é a celebração do conhecimento ‘decifrado’ e contrahegemônico, da autocrítica generosa e do potencial mobilizador e emancipador dos educadores e educadoras, alimentador da Esperança equilibrista de quem pode revelar um ‘coração’ solidário e competente para as justas transformações urgentes em nosso mundo, em nosso país, em nosso município!
Há tanto tempo, não sou feliz. Nem me lembro o gosto, o gozo, o jeito da felicidade. Sinto que, em determinadas ocasiões, passa ao meu lado. Corta árvores. Transpõe paredes. Invade casas, quartos, camas, casais. Deita-se ao lado destes. Entrelaça os amantes em seus leitos. Transita por mãos, braços, pés, rostos, sexos. Corações. Por vezes, esbarra na minha porta. “Desculpe. Era engano”, grita quando avista meus olhos.
Engano. Sempre engano.
Ainda me lembro de quando era possível senti-la plenamente. Acredito que esteve comigo na casa em que cresci. Enquanto eu corria pelo quintal. Até nas vezes em que machuquei os dedos dos pés ao chutar o chão, em tentativas de jogar futebol com meus irmãos. O sangue era a felicidade, mesmo acompanhada por lágrimas e dor. Mas era. Ah, como lamento não ter compreendido na época. Perdi tempo com sisudez. Ficava facilmente emburrada. E era feliz. Eu era.
Posso me recordar de outros bons e breves momentos em que ela, a felicidade, passeou de mãos dadas comigo por parques e praças. A cada olhar lançado àquele menino bonito que paquerei na escola. Nunca soube seu nome. Nunca contei às minhas amigas. Nunca confiei nas pessoas para me abrir desta forma tão íntima. Só de observá-lo, eu me considerava feliz. E era.
As manhãs de sol de domingo — em minha memória, todas eram ensolaradas; às vezes, deliciosas; outras, incômodas — vividas dentro e fora de casa, com comidas, doces e refrigerantes. O gosto da minha infância. À tarde, as corridas pelo quintal para saber quem seria a mulher do padre. Meus irmãos, mais velhos e fortes, sempre me ganhavam. Saíam em disparada antes do apito de mamãe. Riam enquanto me observavam chegar com esforço ao ponto final. Eu, novamente emburrada, gritava com eles. Dizia que eram os preferidos de nossa mãe.
— É injusto! — e cruzava os braços em um gesto de indignação sem fim.
— Mãe não tem filho preferido. Todos são iguais — dizia ela, rindo, com meus irmãos, de minha fúria. — Isso é amor, filha. É ser feliz.
— Não é! — eu respondia de forma malcriada. Mas era.
Com o tempo, o quintal ficou para trás. Preferíamos assistir a filmes e conversar sobre eles depois. Íamos aos bailes de carnaval organizados pela vizinhança. Brincávamos. Eu, talentosa para a dança, rodava entre meninos e meninas, sorrindo com os aplausos. No olhar de meus pais, via certo orgulho. E era feliz. Imensamente feliz com a saia branca, uniforme em festas, envolvendo meu corpo no meio do salão. Com o tempo, eles, todos eles, ficaram para trás.
Sentada em frente à porta, consigo, ainda, avistar o quintal de cimento em que costumávamos correr, brincar, rir e chorar. Deu lugar a um jardim que floresceu por tempos e era regado por mim. Sob o teto de meus pais e meus irmãos, vivo. Uma mulher estranha à criança criada entre aquelas paredes. Ela era feliz.
Num blog alimentado quase diariamente por seus colaboradores, nas últimas semanas alguns deles saíram, outros entraram, enquanto outros retornaram. Exemplo do último caso, a jornalista e escritora campista Paula Vigneron retoma amanhã sua colaboração neste “Opiniões”, onde se revezará quinzenalmente com outro jornalista e escritor: o itaperunense Guilherme Carvalhal.
Abaixo, em palavras próprias, o que você, leitor, pode esperar do regresso da Paula, que mantém seu próprio blog, “Vigneron”, hospedado aqui, no Folha 1:
Sou formada em jornalismo pelo Centro Universitário Fluminense (Uniflu). Atualmente, curso pós-graduação em Língua Portuguesa pela Universidade Candido Mendes (Ucam) e trabalho como repórter da Folha da Manhã. Pela editora Autografia, publiquei, em 2015, o livro “Sete balas ao luar”, que reúne 32 contos. Após meses de ausência do “Opiniões” — e acompanhando de perto os colegas colaboradores e as notícias veiculadas —, tive a oportunidade de retornar ao blog, a convite do poeta e jornalista Aluysio Abreu Barbosa (a quem muito agradeço), para mostrar, em contos e crônicas, um pouco do que observo, escuto e aprendo no dia a dia.