Gustavo Alejandro Oviedo — Hominem te esse memento

 

 

 

LEMBRE-SE DE QUE VOCÊ É UM HOMEM. O escritor Tertuliano atribui essa frase ao que o escravo dizia, no dia do desfile triunfal, para o general romano enquanto segurava sob a cabeça deste a coroa de louros. Outros alegam que a frase era ‘Memento Mori’ (Lembre-se de que você é mortal). Em qualquer caso, e ainda suspeitando que na realidade nunca tenha existido nenhum escravo por detrás do militar, a ideia de que se devesse recordar ao vitorioso de que ele não é uma divindade é uma daquelas licenças históricas que gostaríamos que fosse verdade.

Se a frase tivesse sido colocada como cabeçalho no grupo de Whatsapp onde os juízes conversam, talvez o magistrado Glaucenir não tivesse realizado aquele depoimento que certamente trará alguma consequência para sua carreira.

Qualquer mortal intui que atribuir publicamente a um ministro do STF, e presidente do TSE, o crime de corrupção passiva não sai de graça. Isso, quando não consegue ser provado, chama-se calúnia, e é um dos crimes contra a honra tipificados no Código Penal. Para sua consumação, basta que um terceiro leia ou ouça a imputação que é atribuída à vitima (no caso, Gilmar Mendes).

Nesse sentido, é curioso que a agrupação de reúne os magistrados criminais (FONAJUC) tenha tentado defender a conduta do juiz alegando que a sua declaração deu-se no âmbito de uma ‘conversa privada’.  Não apenas ignora que uma manifestação que se grava no Whatsapp tem o potencial de viralizar exponencialmente, mas também que a calúnia se consumou assim que os integrantes do grupo ouviram a gravação — e a divulgaram. No mais, a declaração do Fonajuc confirma que a gravação era mesmo de Glaucenir.

O episódio, de quebra, deu a chance de fortalecer duas figuras pelas quais eu, e muitas outras pessoas, não nutrimos simpatia: Anthony Garotinho e Gilmar Mendes. Para Garotinho, a declaração do juiz foi mais favorável para sua situação processual do que a agressão que sofrera em Benfica, mais do que nada porque o áudio do juiz existe no mundo real. Gilmar, que provavelmente é a figura mais impopular do poder judiciário, terá a chance de obter um necessitado reconhecimento, seja através de uma desculpa pública ou uma sanção para aquele que o ofendeu.

Garotinho e Gilmar obterão triunfos com a imprudente gravação. Mas é uma pena que não tenham ninguém que murmure pra eles enquanto curtem a vitória. Afinal, como o juiz Glaucenir, são apenas homens.

 

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