Começa o mês de junho e, aparentemente, o país volta à normalidade (?) após duas semanas de passar por uma grave crise de abastecimento. Do que ficou conhecido como “Greve dos Caminhoneiros” pela imprensa sobrou, entre outras consequências, uma pequena conta pendurada de R$ 9,5 bilhões.
Numa coletiva impagável, o ministro Eliseu Padilha disse que o governo “pagaria (parte do subsídio) do próprio bolso”. Como bem sabe qualquer pessoa que não tenha nascido anteontem, uma vez que o Estado não gera riqueza, há a certeza que a fatura tem endereço certo para chegar: nosso bolso. A única dúvida é se o moço do guichê vai passar no débito (aumento de impostos) ou no crédito (emissão de dívida).
Como sempre ocorreu na história do Brasil, uma corporação (do transporte rodoviário) se organizou e espremeu o governo contra a parede em busca da obtenção de privilégios legais em detrimento do restante da sociedade. Não há nada de inovador na tentativa de socializar prejuízos e apropriar-se de parte da renda da população através de reservas de mercado, preços tabelados ou tendo parte de seus custos bancados pela Viúva. Na verdade, a busca por fatias do orçamento público é uma expressão da nossa brasilidade e tem raízes coloniais.
A inovação ficou por conta do inédito apoio popular à mobilização que, até certo momento, crescia na velocidade com que faltavam produtos nas prateleiras e combustíveis nos reservatórios. Mensagens compartilhadas nas redes sociais incentivavam os caminhoneiros a “continuarem firmes de lá, que continuaríamos firmes daqui”. Falta de combustível? Estamos firmes. Cirurgias remarcadas? Firmes. Verduras e legumes em falta? Não arredamos o pé. Mais impostos e dívida para bancar a conta dos caminhoneiros? Pois não! Definitivamente, o comprimento do rolo de papel de trouxa do brasileiro parece infinito.
A incapacidade dos brasileiros de entender quem ficaria responsável por pagar a conta só encontrou paralelo na palermice do governo que, após ter anunciado o fechamento de um acordo com lideranças do movimento, precisou voltar à mesa para conceder ainda mais benefícios pois, aparentemente, havia negociado com líderes fake da primeira vez.
Além de conceder subsídios para os combustíveis, o governo irá tabelar preços de fretes, reonerar folhas de pagamento de diversos setores, isentar do pedágio eixos suspensos de caminhões e reservar parte das cargas para motoristas autônomos. Como também sabe qualquer um, já que não existe almoço grátis, essa parte da conta virá na forma de produtos e pedágios mais caros e aumento (ainda que marginal) no já alto desemprego. Numa só tacada, Temer resolveu repetir todos os erros de política econômica da antecessora.
A desgraça é que o período de testes no Venezuela Simulator nos custará muito mais que os bilhões de gastos públicos. Os prejuízos privados de ainda não podem ser calculados. Enquanto produtores deixavam vazar milhões de litros de leite pela falta de transporte, vazavam do Brasil bilhões de reais de investidores assustados com o que se passava e, principalmente, com a ingerência do governo na Petrobras.
Eleito inimigo número um dos brasileiros por políticos da envergadura de Eunício Oliveira, Ciro Gomes, Jair Bolsonaro, Rodrigo Maia e outros, o executivo Pedro Parente pediu demissão do cargo de presidente da companhia na última sexta-feira. Após ter atingido o maior valor de mercado em sete anos, a Petrobras afundou nas duas últimas semanas. Como desgraça pouca para pagador de impostos é bobagem, além do custo mais elevado dos combustíveis nas bombas, quem tornou-se acionista da estatal no último dia 16 até hoje, a perda patrimonial acumulada supera 40%. Perde o acionista direto, perdemos você e eu, leitor, acionistas indiretos obrigatórios.
Muito se podia argumentar a respeito da política de preços da companhia — uma bandeira da gestão Parente que se dedicou a recuperar uma empresa colossal que respirava por aparelhos após mais de uma década de espoliação e uso político para mascarar índices inflacionários. Entre a crítica qualificada e o anticapitalismo tacanho, mais uma vez, ficamos com o segundo. Entre a discussão institucional do papel da estatal e o oportunismo político, ficamos com esse.
Num país continental tão carente de infraestrutura ferroviária, o único trem que não perdemos é o do atraso.