Artigo do domingo — Surdez levará à vitória de Bolsonaro

 

Eleição de Donald Trump, 09/11/16 (Foto de Joe Skipper – Reuters)

 

Por Aluysio Abreu Barbosa

 

Correspondente da revista “New Yorker” em Washington, jornalista Ryan Lyzza

“É interessante que os jornalistas americanos tenham subestimado Donald Trump. O que me perguntam frequentemente é se o público ou a mídia deveriam levar a sério candidatos bizarros como ele. Minha resposta é: sim, nós temos que levar essas pessoas a sério”. A advertência do jornalista Ryan Lizza, da conceituada revista New Yorker, foi a abertura (aqui) de uma matéria sobre a eleição presidencial brasileira que se definirá no próximo domingo. Assinada por mim, ela foi publicada na Folha em 22 de outubro de 2017, exato um ano atrás.

O título daquela matéria foi “Brasil entre Lula e Bolsonaro”. Era relativa à pesquisa Datafolha então mais recente, mostrando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o deputado federal Jair Bolsonaro (PSL) como líderes na corrida ao Palácio do Planalto. Que, segundo todas as pesquisas de agora, o ex-capitão do Exército deverá ocupar a partir de 1º de janeiro de 2019.

Sobre Lula, naquela matéria da Folha de outubro de 2017, foram antecipadas as dificuldades: “Ele (Lula) foi sentenciado por Moro (em 12/07/17) a nove anos e meio de prisão, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no caso do triplex no Guarujá. Como a Lei do Ficha Limpa exige condenação colegiada, a elegibilidade ou não do ex-presidente será definida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que deu previsão (em 06/08/17) de julgar o caso até agosto (de 2018)”.

Pouco mais de um mês pouco depois, tive a chance de ouvir pessoalmente Lula. Foi em 6 de dezembro de 2017, quando ele fazia uma visita de pré-campanha a Campos. Fui fazer uma entrevista, não inquisição de William Bonner no Jornal Nacional. E, apesar de ter franqueado ao entrevistado a chance de apresentar a sua versão dos fatos, creio ter sido um dos poucos jornalistas brasileiros a lhe perguntar diretamente sobre sua já difícil situação jurídica.

 

(Foto: Ricardo Stuckert)

 

A entrevista exclusiva (aqui) foi viralizada (aqui, aqui, aqui e aqui) na mídia nacional, antes mesmo de ser publicada na Folha. Esse foi o trecho:

“Folha — (…) Inicialmente o TRF-4 tinha previsão para julgar até agosto seu recurso à condenação de Moro. No domingo (03), o Lauro Jardim noticiou em O Globo que o prazo foi abreviado para março ou abril. (…) Como o senhor enxerga isso? Qual é a sua expectativa?

Lula — Aluysio, na verdade, prefiro nem enxergar. Desde que começou essa bandidagem comigo, essa cretinice…

Folha — Quando o senhor fala em bandidagem, se refere a quê?

Lula — Eles inventaram uma mentira. O procurador (da República, Deltan) Dallagnol inventou uma mentira. Ele construiu a tese do power point. E, com base na tese do power point, ele fica procurando coisas para tentar jogar dentro do balaio. E obriga os empresários a dizerem que todo o dinheiro que utilizou em campanha é propina. Que as contas que os empresários têm na Suíça não são evasão fiscal; são propina. E, até agora, o máximo que eles conseguiram foi o cara dizer ‘o Lula sabia, o Lula sabia’. Ora, eu estou muito tranquilo porque estou desafiando eles a provarem alguma coisa. Não venham com essa de que ‘Lula sabia’. (…) Então, eu tenho a consciência muito tranquila. Por que eu não me preocupo? Porque, desde que começou esse processo, os caras falam que eu tenho que ser condenado. A peça do Moro me condenando é, segundo todos os advogados que leram, simplesmente ridícula. Ela não tem sustentação jurídica em nenhum lugar (…) eu estou lendo todo dia que eu já estou condenado. Se eu ficar preocupado com isso, não durmo (…) Não vou ficar batendo boca. Quem bate boca são os meus advogados. Eu vou continuar trabalhando. O que quero dizer para você é o seguinte: se o PT quiser, eu estarei candidato a presidente da República.”

Como hoje todos sabem, o PT bem que quis, mas Lula não pode ser candidato. Como antecipado naquela entrevista de dezembro, ele seria julgado pelo TRF-4 em 24 de janeiro, que confirmou por unanimidade sua condenação e aumentou sua pena para 12 anos e um mês de prisão. Preso em 7 de abril na sede da Polícia Federal de Curitiba, o ex-presidente teve o registro da sua candidatura negado pelo TSE na madrugada de 1º de setembro.

Naquela matéria da Folha de um ano atrás, o substituto do PT também já havia sido antecipado: “Ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad é a opção presidencial mais provável do PT, se Lula não puder concorrer”. Depois do ex-presidente transferir seus votos, mas também sua rejeição, Haddad chegou ao segundo turno. Mas todas as pesquisas indicam que que deve perder por larga margem para o candidato que melhor soube surfar não só o antipetismo, mas o anti-establishment e a reação conservadora aos avanços das minorias.

Na matéria de outubro de 2017, ainda reverberava pelo mundo a vitória do republicano Donald Trump na eleição presidencial dos EUA, um ano antes. Na época, entre público e mídia brasileiros, não eram poucos que indagavam, incrédulos: “Mas como isso pode acontecer nos EUA, na eleição ao cargo mais importante da Terra?”.

São os mesmos que, não sem razão e a despeito das diferenças, identificavam semelhanças entre Trump e Bolsonaro. Entretanto, durante toda a campanha presidencial brasileira, os opositores de Bolsonaro se mostraram surdos à advertência do jornalista Ryan Lizza sobre o que levou Trump à vitória nos EUA.

 

Praça São Salvador, 29/09/18 (Foto: Folha da Manhã)

 

Em 29 de setembro deste ano, já às vésperas das urnas do primeiro turno, manifestações de mulheres saíram às ruas e praças do Brasil, inclusive em Campos, para gritar “Ele Não”. E o resultado prático, registrado na pesquisa Ibope divulgada dois dias depois, foi que o presidenciável chamado de machista e misógino cresceu seis pontos percentuais no voto feminino. Ele liderou e continua a liderar também entre as mulheres.

Consumado o primeiro turno de 7 de outubro, quando Bolsonaro comandou uma onda eleitoral sem precedentes na história recente do país, a tática para enfrentá-lo, que já tinha dado errado, mudou pouco ou nada. Para o segundo turno, os eleitores de Haddad propuseram o pretensioso confronto “barbárie x civilização”. E, à exceção da mendicância exitosa de likes dos já convertidos, o resultado fora das redes sociais foi nenhum. E nada indica que algo vá mudar na próxima semana.

Abandonada à própria sorte pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), pelos ex-candidatos a presidente Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede), além do ex-presidente do STF Joaquim Barbosa, a campanha do PT abandonou uma “Frente Democrática” natimorta. O único fato novo criado foi a matéria da Folha de São Paulo da última quinta (17), dando conta de empresas que bancariam uma guerrilha virtual no WhatsApp contra Haddad para favorecer Bolsonaro.

O TSE aceitou a denúncia do PT e a PF vai investigar o caso. Mas, até pelo tempo, não é nada que deva interferir nas urnas do próximo dia 28. O que poderia ter surtido algum efeito foi preconizado no último parágrafo daquela matéria da Folha publicada há um ano. Mas, talvez por soberba, permaneceu solenemente ignorado de lá para cá. Sobretudo por quem mais deveria ter prestado atenção:

— Quem não seguir o conselho da imprensa dos EUA, nem que seja a revelação do segredo do cadeado após a porta arrombada por Trump, corre o mesmo risco.

 

Publicado hoje (21) na Folha da Manhã

 

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Este post tem um comentário

  1. Enoque

    JÁ PERCEBERAM QUE QUANTO MAIS O PT ATACA BOLSONARO, MAIS ELE CRESCE NAS PESQUIZAS?
    POIS BEM, DIA 28 BOLSONARO VAI GANHAR DE LAVADA NÃO SÓ DO HADDAD, MAS DE TODA SUA QUADRILHA PETRALHA, QUE DEVEM SER EXTIRPADO DO BRASIL.
    O BRASIL NÃO SUPORTA MAIS O GOVERNO DO PT, UM GOVERNO COMUNISTA, O BRASIL PRECISA MUDAR E AGORA É A CHANCE DE MUDARMOS NO VOTO. QUEM MANDA NO PAÍS NÃO É O GOVERNO, É O POVO BRASILEIRO!

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