Acabou. Primeiro foi a Copa do Mundo de junho a julho. Em sequência, na ligação direta, as eleições brasileiras. Foram cinco meses de atividade intensa. Em vinte finais de semana, foram quase todos os sábados e domingos dedicados ao trabalho.
Com a capacidade de análise condicionada em outras Copas e eleições, a despeito da torcida pessoal, os resultados confirmaram os favoritismos que apontei (aqui e aqui) antes das respectivas bolas rolarem: a França foi campeã e Jair Bolsonaro, eleito presidente.
O que não deu para (ninguém) prever, pelo menos não antes do primeiro turno, foi Wilson Witzel eleito governador do Rio.
Isso posto, não dá para deixar de desabafar o asco pelas manifestações do brasileiro médio nas redes sociais durante os dois eventos. Desde a Copa, como encarar alguém formado em história que declarou torcida pela França multirracial contra os “nazistas” da Croácia? Como alguém que se pretende historiador pode ignorar o que foi o colaboracionismo aberto da França de Vichy (1940/44) com a Alemanha de Adolf Hitler? E, de quebra, tratar o povo eslavo da Croácia com o mesmo preconceito que lhe dedicou o nazismo.
Da Copa às eleições, as acusações de nazismo se somaram às de fascismo, racismo, machismo, misoginia e homofobia que, independente dos motivos, serviram a um fim prático: eleger Bolsonaro. Entre seus eleitores mais entusiasmados, como encarar pessoas com as quais se convive desde a juventude, na qual cometeram todo tipo de excessos em sexo, álcool e drogas ilícitas, agora convertidos em defensores da moral, dos bons costumes e da família tradicional?
Político liberal de brilho intelectual, a despeito do apoio à ditadura militar no Brasil, Roberto Campos (1917/2001) dizia que “a burrice não tem fronteira ideológica”. O mais grave é ver isso confirmado por gente inteligente, cega pela dor de corno política desde a prisão de Lula, em 7 de abril, por corrupção e lavagem de dinheiro. Como reagir quando essa passionalidade se sobrepõe à própria família, independente das suas mazelas, e se expõe até os pais nas redes sociais, em mendicância exitosa de likes lacradores?
Nem a burrice, nem a hipocrisia. Desde a eleição presidencial de 2014, como olhar militantes de esquerda, que desde tenra idade deram contribuições generosas ao PIB da Colômbia e da Bolívia, chamando Aécio Neves de “cheirador”? E que, ao colher os resultados dos próprios erros políticos acumulados nos quatro anos seguintes, no lugar do mea culpa, respondem: “A Hitlerzinha aqui vai voltar pra Europa. Madame, né? Sabe como é”. Na dúvida da necessidade de passagem de volta, o bloqueio virtual é demanda de salubridade.
Mas o barato é vibrar com show do Roger Waters, ignorar seu antissemitismo e vê-lo promovido no Brasil a Mick Jagger. E ainda se corre o risco de ser taxado de “direita” por essa gente sorridente em suas selfies, enquanto chora na cama quente e culpa os outros pela derrota política que fabricou. Ainda que menos exitosa, é a cópia em papel carbono do que há de mais abjeto no bolsonarismo, com que se é obrigado a deparar em comentários bloqueados no blog, tipo: “Comunista!” ou “Por que não vai para Cuba ou Venezuela com seu iPhone?”.
Bolsonaro não venceu com os votos de quem é nazista, fascista, racista, machista, misógino e homofóbico, bééé, bééé, bééé. Sua vitória foi dada por uma ampla maioria que, na incerteza de todos esses balidos de ordem, optou por arriscar. E escolheu não votar na sua certeza da corrupção do PT.
Quem não enxerga isso se nivela ao jênio que disse ter previsto a vitória do capitão. Mas dois meses depois votou em Haddad no primeiro turno, tirou Ciro Gomes do segundo e com ele a única possibilidade real da esquerda em eleger o presidente. Para esse tipo de Nostradamus, não há como “prever” nada diferente do que Lula mandar. E ele mandou muito mal!
Não se pode negar a importância de Lula ou do PT, que ainda elegeram a maior bancada na Câmara Federal. Mas, como no mito grego, só quando “matar” seu “pai”, uma nova esquerda poderá reassumir qualquer protagonismo nos destinos do Brasil. Que não pode ser lançado na aventura, como pregam os Boulos da vida, de forçar Bolsonaro a ser o “MAL” que justifique o “BEM” de quem não sabe perder.
Foi a arrogância do “nunca antes na história deste país” que nos conduziu à maior e mais ampla vitória eleitoral da direita, talvez de todos os tempos. Derrotados duas vezes no primeiro turno presidencial, Lula e o PT passaram os oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso taxando-o de direita. E levaram os 13 anos seguintes, mais os dois do companheiro de chapa Michel Temer, empenhados em fabricar uma direita de verdade.
Como Dr. Frankenstein, conseguiram! E o “monstro” agora está solto. Reagir contra ele repetindo tudo que deu errado até aqui, é a melhor maneira de garantir que continue no poder após os próximos quatro anos.
Por ressentimento mesquinho aos protestos que levaram ao impeachment de Dilma, que nem Haddad agora chama mais de “golpe”, a esquerda deu a quem se revelaria seu maior adversário a bandeira do Brasil. E, com ela, entregou junto o país.
Para recuperá-lo, será preciso muito mais do que repintar vermelho de verde e amarelo.
Concluídos cinco meses de muito trabalho, impotência amargada diante do resultado, agora é descansar um pouco. O jornal continua sob comando de Diva e Christiano Abreu Barbosa, com a redação capitaneada pelo Arnaldo Neto e a Joseli Matias.
O blog fará uma pausa. E, na demanda de desintoxicação, as postagens nas redes sociais se tornarão raras, pessoais e restritas. Não que espere nada muito diferente quando voltar.
Depois destes últimos cinco meses, pra não dizer que não falei das flores, confesso: deu um prazer danado ver o croata Luka Modric jogar.
Inté!