Em análise crítica, poeta Adriano Moura defende identitarismo e “lugar de fala”

 

Escrito e publicado no último domingo, com base em poema do mestre pernambucano João Cabral de Melo Neto, o artigo “O identitarismo e seus três mal amados” teve uma repercussão bem acima do esperado. Gerou várias manifestações favoráveis, inclusive dentro do pensamento progressista, onde a política identitária habita “com a pretensão burguesa de transformar o mundo em sua sala de estar”, como já definiu a ensaísta e crítica cultural estadunidense Camille Paglia. Pela polêmica do tema, o texto gerou também discordâncias. Entre elas, a do poeta, dramaturgo professor de literatura Adriano Moura, defensor do identitarismo.

Em respeito ao debate democrático, pedi ao Adriano para publicar seu texto neste Opiniões. Não sem discordar da validação que ele faz ao final do conceito do “lugar de fala”, tão questionado dentro do próprio pensamento progressista. Sobretudo pela oposição de base à essa pretensão binária de dividir a humanidade entre “nós” e “eles”, “bem” e “mal”, em moralismo dogmático mais ao gosto das religiões e regimes autoritários, que do pensamento social. E que, por oposição, tem feito tão bem à extrema-direita, no Brasil e no mundo.

Isso posto, segue abaixo a análise crítica feita pelo Adriano sobre meu texto. Com quem dialogar, mesmo na discordância, é sempre um prazer. Não só por seu embasamento e capacidade de articulação, como pelo fato dele provar que a divergência de opiniões pode ser veemente, sem precisar ser ofensiva ou desonesta. O que, infelizmente, não é a regra para os dois espectros políticos tão afeitos ao tema:

 

Símbolo do movimento identitário
Símbolo do movimento identitário

 

Adriano Moura, poeta, dramaturgo e professor

Discordo que a “divisão das pessoas por raça, gênero e orientação sexual” seja prerrogativa dos movimentos identitários. Ora, muito antes desses movimentos emergirem, a sociedade brasileira já era dividida com base nesses critérios desde sempre. Porém nunca se questionou a exclusão de negros, mulheres, gays e outras minorias do acesso democrático a direitos, cargos, funções e serviços nunca negados à população branca — ou branca apenas para os padrões brasileiros.

Entendo que há alguns radicalismos por parte de certos grupos e lideranças. E que o conceito de identidade é amplo, relativo, contraditório e que precisa ser pensado mais pelo caminho da diversidade e liberdade dos sujeitos do que do dogma. Por outro lado é preciso reforçar uma coisa: héteros, brancos, cristãos, de classe média ou ricos, nunca tiveram suas identidades violentadas, negadas, nem criminalizadas, o que talvez dificulte o entendimento da reação das minorias que veem, a cada dia, um retrocesso em relação às conquistas de espaços dos últimos 30 anos.

Acho que me alonguei um pouco. Seu texto como sempre é primoroso e a alusão ao texto de João Cabral um deleite para quem conhece. Entretanto, mesmo que negue a validade do conceito, seu “lugar de fala”, que eu prefiro chamar
“Enunciação” está bem demarcado. Abração!

 

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