Muita expectativa, 40 minutos de entrevista no Jornal Nacional e seis temas: 1) democracia, 2) pandemia, 3) economia, 4) desmatamento, 5) Centrão e 6) corrupção. O presidente Jair Bolsonaro (PL) sobreviveu aos jornalistas William Bonner e Renata Vasconcellos. E, em um deles, na economia, pareceu se sair melhor. Sobretudo no momento em que a sensação de redução no preço dos combustíveis e a queda das taxas ainda altas de desemprego têm virado as intenções de voto da classe média brasileira ao seu favor nas pesquisas eleitorais.
Sobre o tema democracia, onde foi mais acossado por Bonner, o capitão chamou de fake news a lembrança de que xingou ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Para depois ser forçado a admitir que chamou Alexandre Moraes, também presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de “canalha”. Mas, ao final, disse que aceitará o resultado das urnas independente do resultado, “desde que as eleições sejam limpas e transparentes”. Seja lá o que isso queira dizer, deu a impressão de que, ao seu estilo morde e assopra, aceitou por ora os conselhos para baixar a bola.
No segundo tema, à insistência de Renata com a pergunta se estava arrependido por ter imitado um paciente terminal de Covid sufocando, disse que não teve “uma atitude politicamente correta”. Defendeu o tratamento precoce e a liberdade da clínica dos médicos que o prescreveram, mesmo depois de provado pela ciência e a OMS como absolutamente inútil, e mataram brasileiros. E lembrou do Auxílio Emergencial criado em 2020, transformado em outro dos seus trunfos eleitorais de 2022: o Auxílio Brasil que, desde 9 de agosto, votou ao valor de R$ 600,00.
No terceiro tema, o presidente eleito em 2018 admitindo não entender nada de economia, sempre a evocar seu “Posto Ipiranga” Paulo Guedes, se saiu bem. No quarto, sobre os recordes de desmatamento na Amazônia em seu governo, Bolsonaro conseguiu sair só com queimaduras de 1º grau. No quinto, sobre corrupção e os dois pastores que, sem cargo público, pediam propina dentro do ministério da Educação para liberar verbas federais a prefeitos, Bolsonaro indagou: “A questão de ter dois pastores, qual é o problema?”
Sobre o Centrão, Bonner só lembrou de passagem o episódio recente em que o capitão foi chamado publicamente de “tchuthcuca do Centrão” por um youtuber, sem citar o termo. Mas foi argumentativo demais na pergunta, quando deveria guardar o fato (e o termo) para encaixá-lo depois. E ouviu como resposta uma típica bravata de Bolsonaro, para os seus eleitores bradarem “mitou” nas redes sociais: “Você quer que eu me torne um ditador?”. O fato é que, dessa vez, não mentiu: desde Fernando Henrique Cardoso (PSDB) nos anos 1990, nenhum presidente consegue governar sem o Centrão.
Nas suas considerações finais de 1 minuto, Bolsonaro não voltou a constranger a Rede Globo com fez em 2018. Quando leu ao vivo o editorial do jornal O Globo, após o golpe civil-militar de 1964, escrito e publicado em seu apoio. No lugar do outsider fake de 4 anos atrás, preferiu falar como o que é: o candidato da situação, do sistema, do Centrão. E, além de voltar a falar em redução do preço dos combustíveis e do novo Auxílio Brasil, que já dão resultados nas pesquisas, chamou de seu o PIX projetado no governo Michel Temer (MDB).
Bolsonaro não deve ter perdido ou ganho nenhum eleitor com sua entrevista no Jornal Nacional. Mas não cometeu nenhuma gafe imperdoável que já não tenha normalizado na vida política nacional. Provavelmente, a bancada titular do programa vai usar o mesmo tom inquisitório em suas demais entrevistas. Na terça (23), com Ciro Gomes (PDT); na quinta (25), com Lula; e na sexta (26), com Simone Tebet (MDB). Em nome da equidade, agora não pode mesmo fazer diferente.
Mas, ao jornalismo brasileiro e a eleições menos tensas, o JN prestaria um imenso favor se fosse mais Roberto D’avila e menos William Bonner.