Uma doce loucura
Por Moacir Cabral(*)
Sempre tive uma Folha no caminho.
Parece que foi ontem, mas lá se vão quase 45 anos que, pela primeira vez, pisei na redação de um jornal. Era a Folha do Comércio, que funcionava no velho casarão da Praça São Salvador, sede da Associação Comercial. Foi ali, aos 19 anos, que me envaideci quando soube que naquele jornal – feito com linotipos e chumbo – trabalharam os imortais José Cândido Carvalho e Raimundo Magalhães Júnior, em épocas distintas.
O tempo voava. De repente, eis que era anunciada uma nova era de modernidade na imprensa campista com o nascimento da Folha da Manhã, com o então inovador sistema de impressão offset. Bem que merecia, achava eu, ser convidado para a empreitada. Mas não fui contemplado com o chamado do mestre Aluysio Cardoso Barbosa – eu o chamava de Barbosão, mesmo ele não gostando tanto do apelido.
A princípio, portanto, me mantive no jornal onde era o editor: A Notícia – o melhor da cidade, antes da Folha. Mas com um objetivo em mente: tentar fazer sempre o melhor para conquistar a atenção de Barbosão.
Certa vez, enchente braba, o Rio Paraíba jogava água na cadeia pública, na Avenida Quinze de Novembro. Coisa de doido. Barbosão, prestigiadíssimo, conseguiu helicóptero para algo jamais visto na imprensa da cidade: uma foto aérea.
E agora? Eu e o fotógrafo — não recordo exatamente se foi Leudo ou Peninha — partimos para a tal caixa d’água ao lado da ponte General Dutra, alta o suficiente e com escada que iria permitir a foto que Barbosão queria: a água entrando na velha cadeia.
No dia seguinte, capas semelhantes e fotos idênticas. Barbosão, dizem, chegou bufando no jornal. Afiando um generoso bigode, foi dando esporro:
— Quem deu esta foto para Cabral?
Não demorou para eu acumular a chefia da sucursal de O Fluminense e a geral da Folha da Manhã. Verdadeiramente, uma doce loucura. Outra vez, o fotógrafo Zé César Castro me seduziu a ficar quase um dia inteiro em Atafona para uma matéria xoxa. Preferimos a cachaça com pitanga. Acho que fomos demitidos.
Irritar José Cunha era um deleite, assim como rir das trapalhadas de Péris Ribeiro. Melhor ainda era apavorar Angela Bastos, que, aliás, era de outra linhagem, mais próxima dos experientes Celso Cordeiro e Saulo Pessanha.
Estávamos mais para revoltosos sem causa, como Aloysio Balbi, Orávio, Maurício Guilherme, Esdras Pereira, Zé César, Antônio Roberto, o Capitão, e outros.
Se fui demitido pelo menos três vezes, também por três ou mais fui guindado a cargos de chefia. Entre os belos trabalhos da Folha, a irretocável cobertura da crise da igreja, com a ruptura entre tradicionalistas e progressistas. Mas isso hoje é apenas história.
Lembram-se como tudo começou? O tempo passou. E, há 28 anos, cá estou em outra Folha: a Folha dos Lagos.
(*) Jornalista e empresário de comunicação, ex-editor da Folha da Manhã e proprietário da Folha Lagos, de Cabo Frio
Publicado hoje (14) na Folha da Manhã