Tecer considerações sobre os princípios ideológicos do controle social que, em tese, adentra aos espaços do político e do econômico com a perversidade neoliberalista do discurso dominante, poderia ser tarefa fácil, isso se a escola pública, enquanto entidade produtora de informação e de conhecimento, não falhasse, em sua maioria, no empenho sacrossanto do aprendizado.
A sociedade brasileira, sob a égide da doutrina judaico-cristã, tenta explicar (e se explicar) diante de fatos lamentáveis que envolvem, com o respaldo da “Carta Cidadã” de 1988, longas investigações com o rótulo da Lava Jato, com suas ramificações, mas com resultados discutíveis, porquanto não abrangem todos os corruptos, dos variados partidos políticos, no arcabouço da culpabilidade.
Com exceção de alguns do MDB, os inquéritos têm o objetivo de pegar o Lula, e seus comparsas do PT, em atos ilícitos com empreiteiras, escândalos na Petrobras, compra de sítio e tríplex como acerto de propinas e outras defecções. Ficam de fora figurinhas carimbadas do PSDB, com ênfase para Aécio Neves, a quadrilha de Geddel atuando em benefício da caixinha 2 do Michel Temer – sem dúvida um articulador habilidoso na orquestração do impeachment de Dilma, tendo como acusação principal as chamadas pedaladas fiscais.
A maioria não percebe, por imposição do sistema, que o país reflete um controle social plenificado pelo ranço da retórica neocolonialista, que protege quem está na bolha social e pune os que protestam com a espada da rebeldia e da insatisfação. Michel Foucault (1926-1984), no livro “Vigiar e Punir”, nos propõe uma reflexão: “Todo sistema de educação é uma maneira política de manter ou de modificar a apropriação dos discursos, com os saberes e os poderes que eles trazem consigo”.
O escritor espanhol, Ortega Y Gasset (1883-1955), em “A Rebelião das Massas”, nos faz refletir sobre o chamado homem-massa, e sua forma de dominar o mundo, a partir do início do século XX. Essa figura está entre intelectuais, nas elites econômicas, nos mais ricos e mais pobres, atuando nos três poderes, nos tribunais e até mesmo nas conversas etílicas nos botecos periféricos, onde as classes aquinhoadas gostam de tergiversar sobre temas sobre os quais pouco entendem.
A ideologia formata, com o carimbo da ordem, da lei, e do progresso, uma sociedade apta em vigiar, denegrir e punir os contrários, até mesmo, no caso da intervenção na segurança no Rio de Janeiro. Os que pertencem ao crime organizado, cujo sistema desorganizado, com apoio dos paspalhos e das mídias, impõem uma solução pela força, pasmem, com o uso de tanques, canhões e revista nas mochilas das crianças. No complexo do Alemão, por exemplo, pode acontecer outro fato desastroso, como ocorreu com os revoltosos de Canudos, no interior da Bahia.
Bom, já ia nos esquecendo. As ramificações da Lava Jato, aqui descritas como operações nominadas de “Chequinho”, “Caixa D´água” e outras menos votadas, revelam a prática de factoides, cujos “crimes” — caixa dois e políticas sociais — são constantes na vida dos políticos, independente de partidos. No caso, o intuito é desarticular a liderança de Anthony William Matheus de Oliveira, o Garotinho: um rebelde que diz o pensa, um inconformado com o status-quo da cidade, no cerne do qual nunca fez parte do sistema político dominante. E, por isso, paga muito caro por suas ações em favor dos desvalidos que, absorvidos pelo circuito das ideologias, nem saem de seus guetos para defendê-lo, como deveriam fazê-lo.
Constrangedor para os neocolonialistas é admitir que, mesmo assim, o ex-governador, ex-prefeito, ex-deputado federal, ex-estudante do Liceu de Humanidades, depois do presidente Nilo Peçanha, é o mais importante político parido pelo ventre dos movimentos sociais desta terra. Seus inimigos (adversários), pelos menos os mais conscientes e respeitáveis são, em tese, antigos parceiros de jornadas que, em algum momento, escolheram percorrer por outras trilhas.
Albert Camus (1913-1960); na sua obra “O Homem Revoltado”, explica um pouco a saga de Garotinho. Cita que “o homem revoltado, se mostra consciente e se contrapõe à ordem de quem o oprime e, assim, reage quando sente que não deve ser oprimido, além do que pode admitir”. Muitos poderão até argumentar que o radialista da Lapa, leitor de Nietsche (“Assim Falou Zaratustra”) luta desbravadamente em busca do poder. E qual político, de sã consciência, vai atirar a primeira pedra?
Mário Ferreira dos Santos (1907-1968), escreveu um livro interessante, “A Invasão Vertical dos Bárbaros”, no qual diz que “a crise de valores culturais e a superficialidade reinante na sociedade de consumo criam essas diferenças. E faz um alerta para todos aqueles que depositam confiança num mundo civilizado, mas que enfrentam, diariamente, os efeitos perniciosos das barbáries”. E a escola pública? Quanto pior melhor será para consolidar os discursos hegemônicos dos que se localizam no interior da bolha social.
Não foi por nada que o controle social desativou o projeto pedagógico dos Centros Integrados de Educação Pública (os CIEPs), cujo objetivo, segundo o seu preclaro criador, o professor Darcy Ribeiro, era produzir, pela educação, guerrilheiros aptos a lutar pelos seus direitos. O ato da contra-ideologia manteve/mantém viva a guerra entre milícias, policiais, facções organizadas diante de uma cambada política incapaz de resolver os problemas da insegurança da sociedade. Não sabemos, como Quixote, como lutar contra moinhos de vento.