De Lula a Bolsonaro, endeusar políticos é sintoma de transtorno mental

 

(Foto: Eraldo Peres – AP)

 

João Pereira Coutinho, escritor e doutor em ciência política pela Universidade Católica Portuguesa

Endeusar políticos é sintoma de transtorno mental

Por João Pereira Coutinho

 

Todo mundo fala de “fake news”. Poucos falam de “fake readers”. E, no entanto, os segundos sempre me pareceram mais perigosos do que as primeiras.

Produzir informações falsas ou conspiratórias sempre fez parte do DNA da espécie. Até Eva, que era Eva e vivia no Paraíso, não se conteve e foi um pouco “fake” com Adão no episódio da maçã.

Mas é preciso ter uma mente especial, igualmente falsa e conspiratória, para que as “fake news” possam nascer e prosperar. E, nesse quesito, há países e países.

O instituto de pesquisas Ipsos Mori resolveu estudar o assunto, informa o jornal “Daily Telegraph”. Entrevistou mais de 19 mil pessoas em 27 países. E concluiu, entre outras coisas, que os “fake readers” não se distribuem democraticamente pelo mundo.

Quando falamos de “fake readers”, falamos de pessoas com uma certa “tendência” ou “susceptibilidade” para acreditar em tudo que leem. Sem duvidar, sem questionar.

Itália ou Reino Unido, dois países que conheço bem, são pouco crédulos. Entre os italianos, só 29% confessam ter sido enganados por “fake news”. Entre os britânicos, só 33%. Motivos?

Arrisco um: a desconfiança permanente que italianos e ingleses sempre manifestaram em relação ao poder. Por razões históricas ou filosóficas, ambos os povos sempre tiveram aquela centelha anarquista que permite olhar para a realidade com uma dose saudável de cepticismo.

Não é por acaso que Itália, depois da aberração fascista, tenha tido mais de 60 governos desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Há traumas que nunca se esquecem.

E não é por acaso que Inglaterra, nas palavras do historiador Élie Halévy, tenha passado por todas as revoluções — industrial, social, cultural — sem nunca ter feito a Revolução (com maiúscula).

Mas no estudo do Ipsos Mori há um país que se destaca pelo seu impressionante grau de credulidade: o Brasil, que lidera a lista. Os brasileiros, ou 62% deles, são os mais crédulos de todos (a média é 48%). Em segundo lugar, com 58%, vem a Arábia Saudita. Como explicar isso?

Eruditos apressados dirão que a culpa é da colonização (e do atraso educacional); da herança católica (e da reverência cega perante a palavra escrita); ou, então, de ninguém: se o Brasil é um dos maiores consumidores mundiais de internet, é inevitável que o número de otários seja proporcional ao número de usuários.

Boa sorte nesse debate. Uma coisa é certa: se há algo que distingue o período eleitoral que o país vive é a existência de tribos — à esquerda e à direita, sem distinção — que cometem o supremo pecado em política: acreditar em políticos e batalhar obstinadamente por eles.

Atenção: não se trata de repetir o clichê popular (e populista) de que “todo político é ladrão/incompetente/psicopata”. Provavelmente, nem todos. Provavelmente.

Mas existe uma diferença entre cultivar esse advérbio cauteloso e defender, com fanatismo, o dogma contrário: o político em quem eu voto é a encarnação terrena da sabedoria e da salvação.

Uma temporada recente no Brasil só confirmou o que eu já conseguia intuir à distância: do brasileiro mais anônimo ao militante mais sofisticado, todos parecem sofrer da mesma febre — uma confiança cega, e surda, e muda, e até paralítica, no seu candidato.

Observei isso ao vivo: estava no aeroporto de Brasília, aguardando o meu voo para São Paulo (dia 31 de julho, umas 11 horas da manhã), quando uma turba enlouquecida veio na minha direção. Que fiz eu para merecer aquilo?

Ledo engano. Quando olhei para trás, Jair Bolsonaro estava a um metro de mim, vindo sei lá de onde. O que se seguiu foi digno de um encontro religioso.

Não é um exclusivo de Bolsonaro. O mesmo poderia acontecer com Lula — e acontece, à porta do cárcere, onde dezenas, centenas, milhares de crentes são capazes de enfiar a cabeça na guilhotina pela honestidade de terceiros.

Engraçado: eu sou incapaz de arriscar a minha cabeça por pessoas que conheço bem, ou que julgo conhecer. Aliás, para ser honesto, nem por mim arriscaria o bestunto. Como proceder de forma diferente com alguém que eu não conheço de todo — e, ainda para mais, um político, ou seja, um membro da espécie “homo sapiens” que inevitavelmente possui um grau maior de narcisismo e ambição por contingências do ofício?

Votar no melhor candidato é uma coisa; endeusá-lo e canonizá-lo, um sintoma de transtorno mental.

Haverá cura? Não sei. Mas, se houver, desconfio que italianos e ingleses têm a chave do problema.

 

Publicado aqui na Folha de São Paulo

 

Igor Franco — Eleições 2018: Reloaded

 

Reprodução: Twitter/@FlavioBolsonaro

 

O país que encara com certo marasmo os mais de sessenta mil assassinatos anuais também é o país em que certos pudores ainda estão vigentes. Felizmente, a tentativa de homicídio do candidato líder nas pesquisas parece ser uma dessas fronteiras em que não toleramos cruzar. Embora rico em exemplos de ruptura institucional, a cena explícita compartilhada em ritmo alucinante via redes sociais e mídia tradicional extrapolou o que o mais pessimista observador poderia imaginar a respeito da campanha presidencial de 2018.

Tão brutal quanto a cena do homicida potencial cravando a faca no abdômen de Bolsonaro foi a baixeza e a estupidez de diversas reações de pessoas contrárias às ideias do militar. Não importava que houvesse dezenas de vídeos gravados pelos mais diversos ângulos ou que brotassem imagens de Bolsonaro sendo operado. Para os especialistas em medicina formados pelas séries da Netflix, estaríamos diante de uma encenação envolvendo milhares de populares, Polícia Federal, hospital, médicos e grande mídia, todos envolvidos num objetivo maior que, por algum motivo, envolveria uma facada fake em Jair. Tais reações só não envergonharam mais que a torcida explícita pela morte do candidato. Prontos a esquecer os pedidos de “mais amor, por favor” e as declarações a favor da tolerância, muitos buscaram justificar sua torcida pela tragédia maior na postura beligerante do candidato. Buscando algum tipo de equivalência mórbida, alguns chegaram a insinuar que a morte do candidato “compensaria” o assassinato da vereadora Marielle Franco (Psol-RJ), ocorrido no início do ano.

Não cumpre aqui negar que o discurso histórico de Bolsonaro, que em diversos momentos ultrapassou a fronteira do bom senso e da prudência, seja alheio ao caldeirão de intolerância em que ferve grande parte do eleitorado. Porém, a vilania de atribuir à vítima culpa por seu infortúnio significa justificar crimes sempre pela ótica do criminoso — principalmente quando falamos de uma tentativa de homicídio. Para um estuprador, um ladrão ou um psicopata seu alvo sempre terá oferecido um pretexto que justifique sua conduta violenta.

Passado o choque inicial com o ocorrido, cumpre destacar as reações dos adversários eleitorais de Bolsonaro: em uníssono, condenaram a violência e reforçaram que certas condutas são inadmissíveis na democracia e, dentre elas, a eliminação física de opositores. Enquanto convalesce no hospital, o capitão pode esperar pelo menos alguns dias de trégua em relação à campanha negativa que vinha sofrendo durante o horário eleitoral, especialmente partindo do candidato tucano Geraldo Alckmin, que depende da migração para si dos votos antipetistas que hoje pertencem a Bolsonaro. É bem provável que toda a estratégia de campanha dos candidatos do primeiro turno seja revista a partir das primeiras pesquisas que capturarem a percepção do eleitorado a respeito do atentado.

A maior dúvida diz respeito ao efeito da comoção inicial da população em relação à altíssima rejeição do líder. No último Datafolha, divulgado na semana passada, Bolsonaro perdia em todos os cenários simulados — exceto contra Haddad (PT), cenário em que havia empate técnico. Nos poucos minutos restantes de negociação aberta após a facada, alguns grandes agentes do mercado fizeram a leitura de que o ocorrido seria suficientemente forte para amolecer os corações dos eleitores. No fechamento do mercado, o dólar despencou e a bolsa disparou.

O imponderável resolveu, mais uma vez, dar as caras na eleição presidencial brasileira. Enquanto a queda do avião de Eduardo Campos “zerou” a corrida de 2014 e quase foi suficiente para levar Marina Silva ao segundo turno — o que mudaria ainda mais a história do país — podemos estar diante de um novo turning point na política brasileira. À exemplo da guinada que teve início com a “Carta ao Povo Brasileiro” em que inaugurou o figurino “Lulinha Paz & Amor” que lhe rendeu dois mandatos em sequência, resta saber se Bolsonaro será capaz de utilizar a tragédia que lhe acometeu a seu favor, modulando seu discurso e propondo alguma espécie de união que soe sincera aos indecisos e aos que, hoje, enxergam no candidato algo que não desejam para o posto mais importante da política nacional.

Bolsonaro tem, hoje, o domínio da narrativa e grande poder de decidir o seu próprio futuro. A julgar pelas primeiras manifestações pós-cirurgia, entretanto, parece que a facada não lhe deixará outro legado que não seja um grande trauma.

 

Após facada, Bolsonaro chega a 30% das intenções de voto na FSN/BTG

 

Na primeira pesquisa após o atentado a faca contra Jair Bolsonaro (PSL) no dia 6, ele chegou a 30% das intenções de voto. Divulgada hoje de manhã, a nova consulta foi contratada pelo banco BTG Pactual ao instituto FSB Pesquisa, que ouviu por telefone duas mil pessoas, entre os dias 8 e 9.

Líder isolado na pesquisa, Bolsonaro foi seguido na estimulada por Ciro Gomes (PDT), com 12%. Na margem de erro de dois pontos percentuais para mais ou menos, o cearense está empatado tecnicamente com Marina Silva (Rede), Geraldo Alckmin (PSDB) e Fernando Haddad, provável candidato do PT, todos com 8%.

Na pesquisa anterior do mesmo instituto, divulgada no dia 3, Bolsonaro tinha 26% na estimulada: o que configura crescimento de quatro pontos após a facada. Ciro manteve os 12%, assim como Alckmin os 8% da consulta anterior. Marina, por sua vez, tinha 11% e caiu três pontos. Além de Bolsonaro, quem também cresceu foi Haddad: tinha 6% e subiu dois pontos.

Amanhã (11) termina o prazo dado para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para que o PT oficialize seu candidato, depois que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso desde 7 de abril, foi barrado pela Lei da Ficha Limpa. Ainda hoje, é esperada a divulgação da nova pesquisa presidencial Datafolha. Confira abaixo os números da consulta estimulada FSB/BTG:

 

 

Para ter acesso à íntegra da pesquisa, clique aqui.

 

Crônica do domingo — No botequim, Brasil de Bolsonaro a Luzia

 

“Essa cortina de silêncio encobre dezenas de milhares de anos de história. Esses longos milênios podem muito bem ter testemunhado guerras e revoluções, movimentos religiosos arrebatadores, teorias filosóficas elaboradas, obras artísticas incomparáveis. Os caçadores-coletores podem ter tido seus Napoleões governando impérios da metade do tamanho de Luxemburgo; Beethovens dotados, carentes de orquestras sinfônicas, mas capazes de levar as pessoas às lágrimas com o som de suas flautas de bambu; e profetas carismáticos que revelavam as palavras de um carvalho da região em vez das de um deus criador universal.”

(Historiador Yuval Noah Harari, em “Sapiens — Uma breve história da humanidade”)

 

 

 

Brasil de Bolsonaro a Luzia

 

— Não tem jeito. Bolsonaro já está posando para foto no hospital imitando arma com as mãos. E ainda tem gente que prega compaixão — esbravejou Júlio, antes de molhar a garganta com o primeiro gole de cerveja gelada.

— Temos que olhar isso sem paixão, não com — questionou Aníbal, enquanto pousava seu copo menos cheio à mesa do botequim.

— Que diabos quer dizer com isso?

— Simples: até levar a facada no bucho, Bolsonaro tinha cerca de 20% das intenções de voto, correto?

— Sim. E daí?

— E daí que são 30 milhões de pessoas que já tinham decidido votar no candidato que imita arma com a mão. Sem paixão, se vê que é a garantia de Bolsonaro pra estar no segundo turno. Daí ele repetir o gesto na primeira oportunidade. Mas a questão principal não é essa.

— E qual seria?

— É a rejeição. Se segurar ou crescer esses 20%, Bolsonaro está no segundo turno. Mas, uma vez lá, não vence com 44% de rejeição. É consenso no mundo todo: nenhum candidato com 35% de rejeição vence eleição em dois turnos. É por isso que Bolsonaro, passada a arrebentação, morre na praia com Ciro, com Marina ou com Alckmin.

— Pelas pesquisas, Bolsonaro só teria chance se fosse para o segundo turno com Haddad.

— Como Haddad só tem chance no segundo turno se for com Bolsonaro. Lula conta com isso. Por isso a propaganda do PT não disse uma vírgula sobre Bolsonaro. Por isso Janaína Paschoal falou, na convenção dele, que os bolsominions eram o PT ao contrário. E são. Para os dois, política é só paixão. Não há razão. É religião: Lula e Bolsonaro são Deus ou o Diabo.

— E quem vota no Ciro e defende o Lula? Tem eleitor mais irracional? Vota em um candidato e defende quem mais trabalhou para prejudicá-lo. Acende uma vela pra Deus e outra pro Diabo.

— Sou obrigado a concordar. Mesmo da cadeia, Lula serviu a cabeça de Marília Arraes na bandeja ao PSB em Pernambuco. Pra ferrar o Ciro, mandou às favas o legado de Miguel Arraes. Ciro só não falou ainda o que pensa de verdade sobre Lula porque precisa dos votos dele. Se chegar lá, quem espera indulto em Curitiba e governo de esquerda no Brasil pode ter surpresa.

— Governo de esquerda com Kátia Abreu relativizando trabalho escravo em defesa do agronegócio, é coisa de doido. Ou “viagem lisérgica”, como Ciro chamou a insistência do PT com Lula.

— No Brasil tem de tudo. Tem quem acreditou que Marielle era namorada de traficante e ligada ao Comando Vermelho. Tem quem agora acredita que a facada foi fake. É por serem endeusados e demonizados que Bolsonaro e Lula geram os maiores delírios. E rejeições.

— Mesmo se Bolsonaro crescer nas intenções de voto depois da facada, ele já tinha o suficiente antes dela para estar no segundo turno. Só que perde fácil no final para qualquer adversário que não for Haddad. Como você disse, é a rejeição.

— E se a facada também diminuir a rejeição? Aí, Bolsonaro deixaria de ser cavalo paraguaio.

—  Como seria possível?

— O Brasil que foi dormir pedindo a renúncia de Getúlio achava possível acordar querendo linchar Lacerda?

— Mas ali quem sofreu o atentado na rua Tonelero foi o Lacerda.

— Foi. Aí o Getúlio se matou e virou o jogo no emocional do povo. Se facada no bucho vai valer igual a tiro no peito, só o tempo vai dizer. Na segunda, o Datafolha solta pesquisa e sinaliza. É a primeira depois de Juiz de Fora. Tá todo mundo, inclusive os candidatos, aguardando.

— O Alckmin teve até que suspender a propaganda da bala depois da facada.

— Da bala e da grosseria com mulher, que estavam dando certo para aumentar a rejeição de Bolsonaro. Só que ele e Alckmin disputam o mesmo eleitor. O antipetismo cresceu muito no Brasil. Mas não o bastante para colocar dois candidatos no segundo turno.

— Falando de mulher, e a Marina? Ela foi a única até aqui que enquadrou Bolsonaro, no debate da Rede TV.

— Marina e Eduardo Jorge talvez sejam as melhores pessoas entre os candidatos a presidente e vice. São íntegros, republicanos e não têm intenção de se perpetuarem no poder. Mas um governo deles poderia ser igual ao de Roberto Saturnino na Prefeitura do Rio. Era um homem honesto, íntegro e cheio de boa intencão. E fez uma péssima administração.

— O petista de seita também é ressentido com a Marina, depois que ela apoiou o Aécio em 2014 e o impeachment de Dilma.

— Marina não tinha o que fazer, depois da maneira odienta que Dilma, Lula e o PT trataram ela na campanha de 2014. E o fato de ter sofrido isso, depois da morte do Eduardo Campos, indica bem o que Bolsonaro vai voltar a sofrer logo, logo. Antes mesmo da ferida na barriga cicatrizar.

— Rapaz, nem falamos do Museu Nacional. Diz aí: o Psol tem culpa ou não?

— Vai além do aparelhamento partidário pela reitoria da UFRJ. O crânio da Luzia era do ser humano mais antigo da América do Sul. Tinha 13 mil anos e foi consumido pelo fogo. Era uma tragédia anunciada e ninguém fez nada. O que isso quer dizer?

— Que era velho pra caramba?

— Pois é. Ela viveu e morreu aqui uns 10 mil anos antes de Cristo andar pela Terra. E seu crânio chegou até nós, mas não chegará a quem vier depois. O que isso quer dizer?

— Sei lá. Que diabos isso quer dizer?

— Que, em 130 séculos, nós somos o pior tipo de ser humano que já passou por aqui, no que chamamos de Brasil. E não tem ninguém inocente. Nem eu, nem você, nem a família com as crianças na mesa ao lado, nem o garçom — sentenciou Aníbal, enquanto sinalizava com as mãos para pedir outra cerveja.

 

Publicado hoje (09) na Folha da Manhã

 

Márcia Tiburi aposta na Petrobras para gerar empregos no NF

 

Por Aluysio Abreu Barbosa e Arnaldo Neto

 

“Nosso governo assume um compromisso com a autonomia das universidades estaduais”: Uerj, Uezo e Uenf. É o que garante a candidata do PT a governadora, Marcia Tiburi, que lembrou a condição de professora universitária para endossar sua promessa. A entrevistada também se comprometeu com a recuperação do rio Paraíba do Sul, a retomada da produção nos campos maduros da Bacia de Campos e um projeto próprio: a construção de uma ferrovia ligando a zona metropolitana do Rio de Janeiro ao Porto do Açu. Com a própria candidatura a governadora, tudo está entrelaçado à perspectiva do PT voltar ao governo federal. As perguntas foram enviadas antes da quinta (06), quando o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) sofreu um atentado a faca em Juiz de Fora, e foi divulgada a última pesquisa Datafolha ao Palácio Guanabara.

 

 

Folha da Manhã – No debate da Band, dia 16, a senhora fez várias críticas aos políticos, digamos, mais tradicionais com os quais concorre. Isso não é uma reprodução do discurso anti-política que o PT tenta combater?

Márcia Tiburi – Não. Me filiei ao PT e fui convidada pelo presidente Lula e aceitei o desafio de ser candidata ao governo do Estado do Rio de Janeiro. Acredito na política e na democracia como o melhor caminho para melhorar a vida das pessoas, sobretudo a vida daqueles que mais precisam.

 

Folha – Não só por ter usado a camisa de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a imagem dele num colar, mas pelo que disse no debate da Band, a senhora passou uma impressão mais de militante do que candidata. Em que essa visão está equivocada? 

Márcia – Todos somos militantes do PT, do presidente Lula ao militante do núcleo de base.

 

Folha – A senhora já disse várias vezes que é candidata a governadora por um pedido do ex-presidente Lula. Sua campanha era encarada como uma trincheira de defesa da candidatura dele a presidente, impugnada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Qual é agora o seu objetivo? Como viu a decisão?

Márcia – O presidente Lula é vítima de uma perseguição de um sistema que não aceita um governo popular, que melhore a vida dos mais pobres, como os governos do PT melhoraram. Vamos lutar pelo registro da candidatura do presidente Lula até as últimas instâncias da Justiça. Como tem dito o Fernando Haddad, vice de Lula, temos o compromisso de lealdade com o presidente Lula.

 

Folha – Como seu palanque poderá ajudar o presidenciável Fernando Haddad (PT) na conquista do eleitor fluminense? Se ele conta com a transferência de votos de Lula para conseguir estar no segundo turno, a senhora também? Como esse processo se dará? Haverá tempo?

Márcia – Lula é o mais querido dos candidatos a presidente. O PT é o mais querido dos partidos políticos brasileiros, com 29% da preferência, mais do que a soma de todos os outros partidos. Caso a Justiça não cumpra os acordos internacionais assinados pelo país na ONU e o presidente Lula tenha sua candidatura impedida, temos a convicção que o PT e seu candidato vão para o segundo turno. As últimas pesquisas já indicam esse resultado.

 

Folha – A esquerda fluminense veio com quatro candidatos a governador: a senhora, Tarcísio Motta (Psol), Pedro Fernandes (PDT) e Dayse Oliveira (PSTU). Velho pecado da esquerda brasileira, a divisão não deveria ser evitada, sobretudo em meio à onda conservadora no país?

Márcia – A esquerda brasileira ganhou as últimas quatro eleições presidenciais. Tenho certeza de que a esquerda brasileira vai se unir no segundo turno e vamos ganhar novamente as eleições. O 13 vai unificar a esquerda mais uma vez.

 

Folha – Flávio Bolsonaro (PSL) está bem nas pesquisas a senador. Embora também seja uma eleição majoritária, não há um candidato a governador declaradamente ligado ao pai dele, o presidenciável Jair Bolsonaro. Que concorrente seu se aproximaria mais desse perfil conservador?

Márcia – Há quatro candidatos ao Senado em empate técnico. Vamos reeleger nosso senador Lindbergh Farias. Sobre quem se aproxima do perfil do candidato do PSL, é uma pergunta a ser feita ao próprio.

 

Folha – Nas três últimas consultas estimuladas, suas intenções de voto ficaram em 2% no Ibope e Datafolha, e 1,7% na Paraná (as perguntas foram enviadas antes da última pesquisa Datafolha, divulgada no dia 6, em que a candidata do PT repetiu 2%). Tarcísio bateu 5% nos dois primeiros e 4,4% no último (na última Datafolha, subiu a 7%). E ele teve bom desempenho tanto no debate da Band, quanto do jornal O Globo, ao qual a senhora não foi convidada, por estar atrás nas pesquisas. O Psol caminha para sair dessa eleição como maior partido de esquerda no Estado do Rio?

Márcia – O Partidos dos Trabalhadores é o partido mais querido do Brasil, inclusive no Rio de Janeiro.

 

Folha – No debate da Band, a senhora disse que era a única mulher ali candidata, e que não havia nenhum negro. Identificação que Romário Faria (Pode) avocou para si. Além da cota, o que a senhora e ele precisam mostrar para ganhar a confiança do eleitor?

Márcia – Vamos trazer para o Rio de Janeiro o jeito petista de governar, que foi aprovado pela maioria dos brasileiros nas últimas quatro eleições presidenciais. Junto com o presidente Lula, vamos trazer de volta os investimentos da Petrobras para o Rio de Janeiro, gerando empregos e beneficiando especialmente a região Norte Fluminense. Uma atenção especial vai ser dada ao complexo do Porto de Açu, que tem o potencial de se transformar num polo de desenvolvimento da região. Vamos resgatar a indústria naval e retomar os programas sociais interrompidos por Pezão, apoiado por Eduardo Paes. Criaremos o programa Mais Médicos estadual e reabriremos a rede de Farmácias Populares. Serão criados dois programas de transferência de renda, o Mais Família, complemento do Bolsa Família, e o Segunda Chance, programa de bolsas para incentivar os jovens a permanecerem no ensino médio, e trazer de volta os 380 mil fora das escolas. A bolsa será entregue prioritariamente à mãe e o estudante vai contar ainda com uma tutoria.

 

Folha – Sob intervenção militar do governo federal, a Segurança é hoje um dos principais problemas do Estado. As execuções da vereadora Marielle Franco (Psol) e do motorista Anderson Gomes estão ainda hoje impunes. Ironicamente, o problema é uma das principais bandeiras de um presidenciável como Bolsonaro. Há solução? Como?

Márcia – Não há ironia na tragédia que o Rio de Janeiro vive hoje. Tem gente morrendo de todo lado. A intervenção foi uma jogada eleitoral que não tinha como dar certo e não deu. Só com inteligência e planejamento vamos conseguir prender quem mais lucra com a criminalidade e a violência.

 

Folha – Além da violência, o Estado do Rio vive também um quadro de insolvência financeira. O que pensa sobre o regime de recuperação fiscal firmado entre os governos Michel Temer e Luiz Fernando Pezão, ambos do MDB. Propõe algo diferente?

Márcia – Com o PT na presidência, vamos ter um parceiro que vai facilitar a saída da crise. Vamos negociar com a União um novo acordo. Vamos propor um encontro de contas entre o estado do RJ e a União. Só da Lei Kandir, a União deve bilhões ao Rio de Janeiro. A União tem o dever de ajudar o Rio de Janeiro a sair dessa encruzilhada provocada pelas políticas recessivas de Temer, pelos ataques dos privatistas à Petrobras. Vamos equipar a receita estadual e combater a sonegação. Junto com a bancada do Rio de Janeiro no Congresso Nacional, vamos propor uma reforma tributária que vai permitir aumentar a arrecadação sem onerar os mais pobres.

 

Folha – A face mais cruel da falência financeira do Estado se dá sobre os servidores ativos e inativos. Qual o seu compromisso em honrar mensalmente esses vencimentos?

Márcia – Vamos negociar com a União um novo acordo que vai permitir uma folga maior no nosso orçamento, e garantiremos o pagamento dos vencimentos dos servidores.

 

Folha – Outra face do caos financeiro se dá sobre o abandono da Uenf e do Colégio Agrícola Antônio Sarlo. No debate da Band, quando perguntados sobre a Uerj, apenas Garotinho, Paes e Tarcísio lembraram que a Uenf também existe. A senhora, não. Por quê?

Márcia – Nosso programa de governo defende o respeito ao pagamento do duodécimo para todas as universidades estaduais, Uerj, Uenf e Uezo. Vamos reverter o processo de desmonte e precarização dos governos anteriores, garantir as condições adequadas, prover recursos humanos, equipamentos para o funcionamento de ambientes de pesquisa e desenvolvimento tecnológico. Sou professora universitária e nosso governo assume um compromisso com a autonomia das universidades estaduais.

 

Folha – Quais são seus planos para Porto do Açu na questão do desenvolvimento específico do Norte Fluminense?

Márcia – O Porto de Açu é um dos polos de desenvolvimento do nosso Estado. Vou articular junto ao governo federal a construção de uma ferrovia ligando a região metropolitana do Rio de Janeiro ao Porto de Açu.

 

Folha – Com sua foz em Atafona assoreada, o rio Paraíba do Sul sofre em período de estiagem. Há registro de língua salina já no distrito de Barcelos. Há vida para Campos, São João da Barra e São Francisco de Itabapoana sem o rio que os formou? Como recuperá-lo?

Márcia – O rio Paraíba do Sul é o rio da integração do Estado do Rio de Janeiro. É do rio Paraíba que vem a água potável da região metropolitana do Estado. Salvar o rio Paraíba é uma prioridade do nosso programa de meio ambiente. O rio está assoreado na foz e poluído em todo seu curso. Vamos reflorestar as margens do rio, investir em saneamento em parceria com os municípios da bacia do rio Paraíba do Sul e proteger as praias e a pesca no entorno da foz, em Atafona. Vamos reforçar o papel dos comitês de bacia hidrográfico, envolvendo e capacitando os comitês municipais de meio ambiente.

 

Folha – O que Campos, Norte e Noroeste Fluminense devem esperar de Márcia Tiburi governadora?

Márcia – Com o PT na presidência, a Petrobras vai voltar a investir no nosso Estado. Vamos brigar pelo aumento do conteúdo nacional. Há um imenso potencial nos campos maduros da Bacia de Campos. Com isso empregos e renda serão criados na região de Macaé e Campos. Nosso governo vai apostar na criação de novas centralidades no nosso Estado, como a região de Campos, Macaé e do Porto de Açu, entorno de Itaperuna. A Uenf terá um papel estratégico na promoção do desenvolvimento local, apoiando as vocações e potencialidades da região.

 

Página 2 da edição de hoje (09) da Folha

 

Publicado hoje (09) na Folha da Manhã

 

Hamilton Garcia — A miséria do social-desenvovimentismo

 

 

 

Se, como vimos no artigo anterior, a tradição de esquerda implica em alguma forma de regulacionismo econômico, de modo a redirecionar as políticas públicas (no capitalismo) em prol das necessidades sociais — o que propicia a sustentabilidade do desenvolvimento (pleno emprego) em proveito também da estabilidade democrática e social —, é certo que não é qualquer improvisação política oportunista, feita em seu nome, que pode garantir tal resultado.

A fórmula lulopetista de superação do nacional-desenvolvimentismo — quer de viés furtadiano (CEPAL), quer nacional-democrático (PCB) —, que ficou conhecida como “social-desenvolvimentismo”, tinha como objetivo priorizar o desenvolvimento social (inclusão) em contraposição ao mero desenvolvimento econômico do passado — concentrador de renda e difusor de miséria urbana —, além de libertar as classes populares da tutela do “Estado burguês”, historicamente conservador e “comprometido com o capitalismo”.

Como se sabe, a tutela teve apenas uma mudança de titularidade, em prol de um novo personagem cuja fórmula política é velha conhecida: o caudilhismo benfeitor (populismo). A operação, fadada ao sucesso entre as camadas mais pobres, em função da persistência das desigualdades sociais e políticas, também encontra eco na intelectualidade, como outrora (Estado Novo), dada sua marginalização em face do poder, além de funcionar como poderoso anteparo para o sistema de dominação via concessões, nos termos de Pedro Bastos[i], de um “mercado interno ativado pelo aumento imediato do salário real acima da produtividade” e “gastos correntes e em infraestrutura de cunho mais social do que vinculados ao mercado externo” (produção de ponta), provocando, no médio-prazo, o desencontro, verificado no Governo Dilma, entre consumo aquecido e gastos públicos elevados, e o crescimento da renda e da riqueza associada à produção interna capaz de financiá-los.

A estratégia sedutora, misto de idealismo utópicosocialista com oportunismo neopopulista, fizeram a festa de um amplo arco de setores sociais — do bolsa-família ao bolsa-rentista, passando pelo bolsa-Miami — às expensas do desenvolvimento, possibilitando ao PT manter-se no poder por 13 anos ininterruptos sem ameaçar os alicerces da dominação neopatrimonial[ii] e, muito ao contrário, promovendo a renovação e o empoderamento de seus atores na esfera burocrática, parlamentar, empresarial e sindical.

O logro doloso — reconhecido, mesmo que por um lapso, por Frei Beto[iii] —, edulcorado pelo “combate à pobreza”, impulsionou a mais ampla e legitimada aliança neopatrimonialista desde Sarney, de olho fixo no voto dos mais pobres, para cativá-los sem elevá-los a formas sustentáveis de autonomia, ao mesmo tempo em que comprou a aquiescência dos mais ricos (rentistas e associados), instituindo uma ordem consumista/concentracionista ampliada que se apresenta como o importante obstáculo, por cima e por baixo, para a efetiva mudança política.

A alternativa à armadilha lulopetista não conta, como seria de se esperar dada a falta de tradição, com um caminho compartilhado — sequela da morte prematura da ANL em 1935 (a evolução da esquerda – II) e da fragmentação da frente democrática em 1979 (a evolução da esquerda – IV) —, nem tampouco com instituições partidárias adequadamente constituídas — dada as deformações conhecidas do sistema político-eleitoral —, o que torna o desafio atual bastante complexo. É certo, porém, que ela pode se impor por cima das impotências e deformações existentes, dada a gravidade da situação criada pelo esgotamento do Estado neopatrimonial ampliado inaugurado em 1985 (Nova República).

Os pródomos desta saída já se vislumbram, fragmentariamente, nas dissidências partidárias do petismo (Marina Silva), do lulismo (Ciro Gomes) e do peessedebismo (Álvaro Dias); a primeira se destacando na propositura frentista, o segundo na explicitação de um programa econômico abrangente/coerente e o terceiro realçando a necessidade da refundação ético-institucional do país.

Cada um deles acrescenta um tijolo fundamental para a construção de uma alternativa democrática para crise, mas terão que se coligar no futuro para dar competitividade a seus propósitos. O cimento desta coalizão em germe, todavia, está, como se sabe de longa data, na variável infraestrutural do programa, onde se assentam as classes sociais fundamentais em meio à multiplicidade de determinantes e grupos de variadas origens. É nele que se ancoram as diversas perspectivas do progresso social desde o alvorecer do capitalismo.

É por esta razão que o candidato do PDT (Ciro Gomes), não obstante suas ambiguidades políticas e de seu partido, vem se destacando como uma possibilidade vigorosa para virar a página do anacronismo político que dominou a esquerda até aqui, eludindo a necessidade urgente das reformas para a retomada do progresso econômico-social nos últimos 16 anos.

Sua pregação, em linha com o pensamento do Prof. Bresser-Pereira[iv], converge para “a formação de uma coalizão de classes desenvolvimentista que associe empresários empreendedores, trabalhadores e a burocracia pública”, cujo principal desafio seria o de reverter a asfixia do setor público causada pelo descontrole dos gastos ordinários, das isenções tributárias, da predação rentista sobre a dívida pública, da armadilha corporativista sobre o setor público e do parasitismo patrimonialista arraigado – gerador de corrupção e de desvios de função –, que compõem o sistema dominante que desestabiliza o país desde a Segunda República (1930) e que o PT tratou de totemizar na figura de um líder condenado e preso pelos crimes correlatos ao status quo.

 

[i] Social­-desenvolvimentismo (carta ao Prof. Bresser), in. <www.bresserpereira.org.br/Works/Letters/10.Pedro-Z-Bastos-Social-des.pdf>, em 31/08/18.

[ii] Definida por Simon Schwartzman como “uma forma de dominação política gerada no processo de transição para a modernidade com o passivo de uma burocracia administrativa pesada e uma sociedade civil (….) fraca e pouco articulada”; Bases do Autoritarismo Brasileiro, ed. Publ!t/RJ, 2007, p.11.

[iii] Que criticou o amigo LILS, ainda no poder, por ter trocado “um projeto de nação por um projeto de poder”; vide Estadão, 09/03/2009, in. <http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,para-frei-betto-bolsa-familia-e-projeto-de-poder,335703>, em 27/06/16.

[iv] Reflexões sobre o Novo Desenvolvimentismo e o Desenvolvimentismo Clássico, in. Revista de Economia Política, vol. 36, nº 2 (143), abril-junho, 2016, pp. 240-241.

Paes cresce e lidera isolado a governador. Disputa acirrada ao Senado

 

 

Paes lidera isolado

Ontem, o triste episódio da facada desferida no presidenciável Jair Bolsonaro (PSL), durante passeata de campanha em Juiz de Fora, tomou grande parte da coluna. E sobrou apenas uma nota para analisar a última pesquisa Datafolha a governador do Rio. Divulgada no mesmo dia do atentado é a que torna mais clara a disputa ao Palácio Guanabara, na urna de daqui a exatamente 29 dias. Foram duas consultas Datafolha feitas até aqui: a primeira, de 20 e 21 de agosto; a última, de 4 a 6 deste mês. Entre as duas, Eduardo Paes (DEM) está em franca ascensão e se isolou na liderança, pulando de 18% para 24% das intenções de voto.

 

Romário e Garotinho caem

No melhor cenário possível ao ex-prefeito carioca, seus dois concorrentes mais próximos estão em queda: nas duas Datafolha, Romário Faria (Podemos) passou de 14% para 10%, enquanto Anthony Garotinho (PRP), desidratou de 12% para 10%. No bloco inferior, mas já pedindo passagem, está o único candidato que cresceu além de Paes: Tarcísio Motta (Psol) passou de 5% para 7% e já está empate técnico com Garotinho. Na margem de erro de três pontos percentuais para mais ou menos, o político campista fica junto tanto de Romário, na briga pelo segundo lugar, quanto de Tarcísio, na disputa entre terceiro e quarto.

 

Desafio de Tarcísio

Por sua vez, Tarcísio também está em empate técnico com Indio da Costa (PSD), que manteve seus 5%. Na margem de erro, os dois estão juntos de Pedro Fernandes (PDT), 3%; Márcia Tiburi (PT), 2%; e Marcelo Trindade (Novo), Wilson Witzel (PSC), André Monteiro (PRTB) e Dayse Oliveira (PSTU), todos com 1%. Com a maioria estacionada em seus baixos índices de intenção de voto, o único cuja ascensão ameaça o bloco de cima é o candidato do Psol. Pela consistência que apresenta nos debates, e repetiu ao falar de questões regionais em entrevista à Folha, publicada no dia 1º, Tarcísio tem muito potencial, mas pouco tempo até o voto.

 

Momento certo

Todos os dados são da consulta induzida, a que vale em período próximo à urna, mas a espontânea Datafolha é útil para se avaliar a consistência dos votos. Nela, Paes também é líder isolado, com 12%. E vem seguido por Romário e Garotinho (ambos com 6%), Tarcísio (3%) e Indio, Fernandes e Witzel (todos com 1%). Quando comparadas as duas Datafolha, fica também evidenciado a solidez do crescimento do candidato do DEM: ele tinha 7% na espontânea, índice em que cresceu cinco pontos entre o eleitorado fluminense nos últimos 15 dias. A menos de um mês das urnas, parece ser o momento certo.

 

Garotinho inelegível

Ao que tudo indica, ou Paes conseguiu se livrar do ônus da ligação com o ex-governador Sérgio Cabral (MDB), ou seus principais opositores conseguem ter defeitos ainda piores, na visão do eleitor. Em contrapartida, apesar de se ufanar de ser o denunciante de Cabral, Garotinho vive mais um inferno astral. Depois de ser condenado pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), na última terça, por formação de quadrilha armada, ele ainda teve sua inelegibilidade decretada por unanimidade pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE), na quinta.

 

Pior do que 2014?

Com base na Lei da Ficha Limpa, a decisão do TRE se deu pela condenação de Garotinho no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), relativa ao desvio de R$ 234,4 milhões, quando era secretário do governo estadual Rosinha. Ele vai poder fazer campanha, enquanto recorre ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas concorrerá sub judice. Líder na rejeição (subiu de 45% a 46%), em queda nas intenções de voto, distante do líder Paes e ameaçado por Tarcísio, o político de Campos pode ter cometido um erro ao se candidatar novamente a governador — ainda mais grave do que em 2014, quando não foi nem ao segundo turno.

 

Briga ao Senado

Aparentemente mais indefinida do que a disputa a governador, é a corrida pelas duas cadeiras que o Estado do Rio elegerá no Senador Federal. Entre as duas últimas Datafolha, quem aparece liderando é outro ex-prefeito carioca: César Maia (DEM), que subiu de 18% a 21% nas intenções de voto. Ele está empatado tecnicamente com Lindbergh Farias (PT), que manteve seus 18%; e Flávio Bolsonaro (PSL), que diminuiu de 18% para 17%. Quem também está na briga é Chico Alencar (Psol), mas ele caiu de 17% para 14%, ficando próximo a Miro Teixeira (Rede), que teve leve crescimento: de 11% a 12%.

 

Publicado hoje (08) na Folha da Manhã

 

Guiomar Valdez — Ainda não somos uma Nação: a Colônia está dentro de nós

 

 

Isso não me tira a esperança. Sinto às vezes impaciência, confesso. À luz da História nada está determinado a priori, disso alimento minhas utopias. O presente do meu país está ainda mergulhado nas estruturas do passado…

Quando ‘nascemos’ há 518 anos, em pouco tempo nos tornamos o melhor negócio não para Portugal, mas, na verdade, para a Inglaterra e um pouco para a Holanda também! E ser o melhor negócio significava ter uma estrutura de produção caracterizada pela grande propriedade — latifúndio, pelo trabalho escravo, pela economia primário-exportadora. Ah, mas nós éramos colônia! Sim é verdade. Até a chegada da independência foram 322 anos voltados para atender exclusivamente ao que é externo, este era o ‘nosso sentido’, a ‘razão da nossa existência’, enquanto sociedade. Uma natureza subalterna. Uma condição para ‘o outro’.

Em 07 de setembro de 1822 a Independência chegou. No dia de hoje, há 196 anos. Alcançamos o status de ‘país’, de um Estado ‘Nacional’, que teria que se construir como tal. Infelizmente, mantivemos o nosso ‘sentido’ e a nossa ‘condição’ de ‘tipo colonial e provinciano’. É claro que tivemos resistências à esta situação! Sempre! E em todos os campos do mundo material ao mundo imaterial! Não se tem dúvidas sobre isso. Tivemos sonhos, projetos, e, até experimentos. Mas não enraizou!

Por quê? Por quê? Algumas ‘pinceladas’:

Na ECONOMIA, a ‘natureza’ primário-exportadora, de nenhum valor agregado, predominou até os dias de hoje. A transição para uma economia urbano-industrial, inicia-se com Vargas (1930-45 /1951-54 / = 18 anos), com características de um projeto de matiz nacionalista; vai se avançando nos outros governos (+- 10 anos), na mesma proporção que se afasta de um projeto de nação soberana. Mas avança e a ‘virada’ se dá durante a Ditadura Civil-Militar (1964-85 = 21 anos) – um modelo de modernização de tipo ‘associado’, numa nova e superestruturada relação subalterna entre capital nacional e capital estrangeiro, sob a hegemonia do último. A crise econômica mundial dos anos de 1970 e seus desdobramentos não acabaram até hoje. As soluções dos governos da Nova República, de Sarney a Temer, passando por FHC/Lula-PT, aprofundaram a nossa dependência econômico-financeira, desindustrializaram o país, reafirmando a continuidade da ‘natureza primário-exportadora em latifúndio’, agora sofisticadamente conhecida como ‘setor de commodities’. O ‘sentido’, o ‘negócio bom para o outro’, é vender commodities, é entregar ‘ao outro’ o patrimônio estratégico de nossas estatais e as riquezas também estratégicas e de altíssima qualidade. 196 anos de independência com apenas 50 anos (com interrupções) exercitando uma modernização urbano-industrial, que se provou dependente, conservadora quiçá reacionária, frágil e sem aderência a ideia de um projeto de nação soberano. A colônia ainda está dentro de nós!

Na POLÍTICA, experimentamos muito pouco o exercício de um ‘Estado Democrático de Direito’. Da independência para cá, ‘de fato e de direito’, esta experiência não vem imediatamente com a Proclamação da República (1889), ela se dá em dois breves espaços de tempo: 1945-1964 = 19 anos e 1985-2018 = 33 anos. O que predominou, então, nas relações de poder? A permanência do paternalismo, do clientelismo, do patrimonialismo e da violência de ‘todo tipo’. Estranhar corrupção? Estranhar privatização do que é público? Estranhar eleições como um grande negócio, onde a troca de favores e a compra de ‘todos os tipos’ de votos predominam? Estranhar a despolitização/analfabetismo político? Estranhar o avanço do desânimo com a Política? Estranhar a violência e o ‘ressurgimento’ de relações e atitudes ‘neofascistas’? 196 anos de independência com apenas 52 anos de frágil exercício democrático, mediados por 21 anos de ditadura, construiu até aqui uma imensa dificuldade de se estabelecer e consolidar relações democráticas em todos os espaços humanos/sociais/institucionais. Lembro que dificulta mais ainda consolidar Democracia em tempos de crises econômicas. A ‘ordem e o progresso’ é para perpetuar o autoritarismo, infelizmente. A colônia ainda está dentro de nós!

Na dimensão SÓCIO-CULTURAL, diante das características da economia e da política apresentadas, numa relação dialética, e, não, estanque, vivenciamos o predomínio para a maioria, da visão de mundo de quem dominou e domina estas duas dimensões da nossa sociedade, ou seja, a classe dominante. Classe essa de ‘vontade fraca’ para criar um Estado Nacional e Sociedade autônomos; sua cabeça valoriza o que é ‘de fora’, aos moldes das características coloniais e de seus negócios e ao mesmo tempo desvaloriza e desqualifica o que é ‘de dentro’; sua ‘alma é vendida’, ou melhor, é negociada; ela não é moderna, não é empreendedora; ela criou uma ‘síntese’ atraso-moderno, que se relaciona o tempo todo, como face da mesma moeda, e, nisso, tudo é possível: trabalho ao estilo de escravidão, subemprego, analfabetismo, valorização da cultura exógena, rejeição aos direitos do trabalho e sociais, entendidos por ela como privilégios. Esta classe até aqui, não acredita em nossas potencialidades enquanto Nação, com letra maiúscula. Ela é envergonhada, esteticamente feia, porque não tem ‘rosto próprio’, ela não se vê no povo que habita este país. 196 anos de independência se passaram e ainda predomina a desigualdade extrema, a luta para a concretização dos direitos constitucionais, os preconceitos e as discriminações advindos de uma sociedade escravista, patriarcal e arcaica. Autoritarismo com os complexos de superioridade ‘para dentro’ e de inferioridade ‘para fora’ da nossa classe dominante, é, no mínimo, um desafio ‘psicanalítico-social’ a ser entendido e superado. É inibidor de qualquer projeto de nação soberano! A colônia ainda está dentro de nós!

Relacionem sem ‘pré-conceitos’ e como uma totalidade ECONOMIA-POLÍTICA-SOCIEDADE-CULTURA, a partir, por exemplo, deste breve ‘sobrevoo’ apresentado, é um bom exercício para sonhar com a ‘viabilidade de um Brasil soberano’. A ‘vontade fraca’ é de quem quis e quer o nosso país apenas como negócio e negócio barato para os outros. Não há determinismo histórico. Temos viabilidade, sim!

César Benjamin (2007) nos provoca: “Nunca foi tão grande a distância entre o que somos e o que poderíamos ser”, disse recentemente Celso Furtado, antes de nos deixar. Todos esses processos estão aí, a nos desafiar, exigindo de nós um esforço de análise talvez mais árduo do que aquele realizado pelas gerações dos nossos mestres. Ainda não sabemos bem até que ponto tais processos alteraram definitivamente   as condições sociológicas da nossa existência, e em que direção. Não temos uma teoria do Brasil contemporâneo. Estamos em voo cego, imersos em uma crise de destino, a maior da nossa existência. A História está nos olhando nos olhos, perguntando: “Afinal, o que vocês são? O que querem ser? Tem sentido existir Brasil? Qual Brasil? ” (In: “Uma certa ideia de Brasil” — artigo para o livro ‘Enciclopédia de Brasilidade’ — Carlos Lessa // http://www.contrapontoeditora.com.br/)

Hoje fazemos 196 anos da nossa Independência e somos o que foi construído de nós e por nós. Gostemos ou não, o Brasil existe e é este que está aqui e agora! E eu quero vida longa para o meu país! E eu quero uma vida longa diferente para todos, profundamente democrática, justa, bela, criativa e criadora, segura, cuidadosa, ou seja, feliz!

 

PS: SOBRE O CLIMA ELEITORAL 2018 (que muito tem a ver com o artigo de hoje)

— Desejo a recuperação de Messias Bolsonaro. Não concordo com nenhum tipo de violência para com quem quer que seja.

—Não concordo com piadas, memes, ironias, sarcasmos, julgamentos e ‘sentenças’ com a dor do outro. Este não é o novo caminho democrático e emancipador de se fazer política. 

Nada acho impossível acontecer na atual política brasileira. Mas penso ser improvável uma ‘armação/conspiração’ neste caso específico vivido pelo candidato do PSL. Se for…quem será(ão) o(s) beneficiário(s)?

Penso no imponderável.