Enquanto TSE não julga HC de Garotinho, disputa na família resume a cidade

 

Na ausência do blogueiro, desde quinta (21) passada, pouca coisa parece ter mudado em Campos. A grande expecatativa em torno do pedido de Habeas Corpus (HC) do ex-governador Anthony Garotinho (PR), da sua prisão domiciliar na famosa “casinha da Lapa”, que será julgado daqui a pouco, a partir das 19h, no plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília.

Enquanto não se decide se Garotinho recorre livre ou em prisão domiciliar da condenação (aqui) de nove anos e 11 meses pelos crimes de corrupção eleitoral, associação criminosa, supressão de documento e coação no curso do processo da Chequinho, o clima quente da cidade ficou evidenciado numa disputa coadjuvante e familiar na blogosfera goitacá. O superintendente de Trabalho e Renda de Campos, Gustavo Matheus (PV), escreveu (aqui) no Blog do Bastos. E foi respondido (aqui) pela prima, a secretária de Desenvolvimento, Emprego e Inovação do Rio de Janeiro e deputada federal licenciada, Clarissa Garotinho (PRB), no Blog do Ralfe Reis.

Para saber quem levou a melhor, sem ainda saber quem parecerá melhor ao final do dia, confira abaixo:

 

 

 

Nunca foi tão fácil criticar Garotinho

Por Gustavo Matheus

 

Nunca foi tão fácil criticar e jogar pedra no ex-governador Anthony Garotinho. Recordo-me, no entanto, de uma época em que os poucos que o faziam eram taxados de loucos ou corajosos, tendo em vista o arsenal de possibilidades de retaliação que o então poderoso Garotinho possuía guardado em seu estalar de dedos. Rádios, jornais, jornalistas, políticos, desembargadores e tantos outros, todos, em sua “folha de amizades e favores”.

Este humilde interlocutor mesmo “sofreu” com as alcunhas por dizer o que pensava, assim como outros poucos.

“Este menino é louco”, alguns diziam. “Rapaz corajoso”, outros bradavam. Enquanto isso, minha caixa de correios transbordava de notificações, intimações e processos, pois o exército jurídico do ex-deputado não dormia no ponto. Até porque, sua motivação era abastada, e bem abastada, por milhões e mais milhões oriundos, sem escrúpulos e meias palavras, de nosso atual sofrimento, do sangrar da máquina pública.

É fácil, muito fácil, cutucar um leão “desjubado”, sem garras, dentes, fome e, sobretudo, orgulho. Mas cantei esta pedra há bastante tempo, no auge do rei da selva. Narrei o fim do ex-deputado, o mesmo que hoje se desenha, enquanto a sua filha, a então deputada Clarissa, dizia, às gargalhadas debochadas, que a oposição em Campos não fazia nem “cosquinha”. E também quando sua mãe, dona Rosinha, ganhava no primeiro turno.

Mas, como dizia minha vó, tudo que antecede um “mas” não passa de vento. Porém, se o “mas” é assassino de contexto, a memória é curta e o saudosismo cego. Por vezes nos esquecemos do que sempre soubemos e acabamos lembrando com carinho do que nunca existiu. Só precisamos tomar cuidado, porque o leão não morreu e a juba cresce.

 

 

 

Carta aberta ao primo Gustavo Matheus

Por Clarissa Garotinho

 

Prezado primo Gustavo,

Fiquei pensando se deveria responder a este “humilde interlocutor” como você se refere. Mas resolvi fazê-lo apenas para corrigir um equívoco do seu texto publicado pelo Blog do Bastos.

Você diz que hoje é fácil criticar o Garotinho, um “leão desjubado”. E conta vantagem dizendo que você destemidamente já o criticava quando ele “estava no auge e era o Rei da Selva”.

Quanta bobagem, primo…

Seu tio Garotinho denunciou à Procuradoria Geral da República mais de 150 políticos, agentes públicos, empresas e juízes.

O seu tio Garotinho denunciou a Globo ao vivo quando foi entrevistado por aquela emissora. Denunciou a CBF e Ricardo Teixeira e o todo poderoso ex-presidente do TJ do Rio, Luiz Zveiter.

Primo, fala sério! Ele não está preocupado com você…!

Mas vamos ao que interessa, primo.

No seu texto você diz que aqueles que criticavam o Garotinho eram taxados de “loucos” ou “corajosos”. Esqueceu de falar dos “aproveitadores”, daqueles que utilizam a crítica como trampolim. Esqueceu de falar dos “invejosos”, que não se conformam com o sucesso de um garoto humilde, de uma cidade do interior, que cresceu sozinho e se tornou prefeito, governador e teve mais de 15 milhões de votos para a presidência da república.

Primo, o seu tio Garotinho, irmão da sua mãe Ketinha, construiu o Trianon, um dos maiores teatros do interior do Brasil. Reabriu o Ferreira Machado, construiu a importante ciclovia da 28 de março, fez o calçamento de grande parte de Guarus. O seu tio Garotinho pediu ao ex-governador Brizola e a Darcy Ribeiro para fazer a UENF em Campos, além de ter feito quase 70% da obra desta Universidade. Fez uma centena de creches e postos de saúde.

A sua tia Rosinha Garotinho construiu aquela ponte que diziam que “ligava nada a lugar nenhum” mas que foi a salvação da nossa cidade na última grande enchente. A Rosinha construiu o CEPOP, que mudou a cara do nosso carnaval e passou a abrigar muitos eventos como a nossa Bienal do Livro. Duplicou a RJ que liga a baixada ao centro campista e construiu milhares de casas.

Eu entendo, primo! É comum muitos jovens almejarem a fama, o sucesso… tem gente fazendo de tudo pra aparecer.

Mas você, primo! Faça como o seu tio. Use o seu talento para construir, para fazer a diferença na vida das pessoas! Pois até agora o seu único “feito” tem sido criticar a sua família. Isso também faz parte do comportamento de muitos adolescentes. Neste caso você já passou um pouquinho da idade.

A sua bronca, primo, é porque você tinha sido contratado, a pedido do nosso tio Nahim, por uma empresa terceirizada que trabalhava para o setor de licitação da prefeitura. A Rosinha não concordou porque não era conveniente um sobrinho da prefeita trabalhando nesse setor e você ficou chateado. Mas não misture as coisas.

Primo, o seu tio Garotinho está injustamente sendo condenado por garantir o alimento na mesa de famílias pobres que precisam do amparo do Governo. Não tem nada mais terrível para um ser humano que a fome.

Seus textos agressivos contra o seu tio Garotinho ainda são recheados de ingratidão. Pergunte à sua mãe tudo o que seu tio fez pela sua família pelo tempo que foi preciso.

Por fim, primo, lembro de quando a gente era criança e fazíamos uma dupla cover: eu era a Sandy e você o Júnior! Época boa em que a gente não se preocupava com a política, essa que separa amigos e até mesmo parentes.

Torço por você, cara! A “juba” do seu tio vai crescer de novo. Você pode estar ao lado dos leões, não precisa se juntar aos caçadores!

Sua prima Clarissa.

 

Ocinei Trindade — O terror, o empoderamento, a tornozeleira e a despedida

 

 

 

O crime encurrala governos e cidadãos de bem. Nos últimos dias, na favela da Rocinha, capital do Rio de Janeiro, traficantes de drogas e armas demonstraram, mais uma vez, do que são capazes. Por outro lado, o governador Luiz Fernando Pezão, o secretário de Segurança Pública e a Polícia Militar demonstraram outra vez do que são incapazes: combater ou impedir crimes de violência urbana. Chamem o Exército. A falência do estado do Rio de Janeiro serve como indicador da falta de autoridade das autoridades legitimadas e do colapso político iminente em todo o Brasil.

Governos que não governam, legislativos e judiciários que atendem a interesses corporativistas (incluindo os de criminosos), e não os da população: para que servem? Estão no poder e têm acesso a bilhões, trilhões, zilhões de reais em orçamentos públicos, mas a tal da corrupção e os desvios de recursos da Nação são práticas recorrentes, utilizadas sob o estigma do “rouba, mas faz”.  Até quando a sociedade aguenta estas violências todas de uma “guerra” que parece não ter fim? O Rock in Rio e a “Rockcinha” in Rio apavorante dividiram holofotes. Festa e guerra genuinamente cariocas.

É mera sorte estar vivo em meio ao terror imposto por bandidos, pela omissão e ineficiência do Estado. A insegurança pública, seja na capital fluminense, em Campos ou em qualquer lugar do Brasil, é só um dos problemas graves enfrentados pela população.  O desemprego, a desigualdade social, a péssima educação oferecida, a saúde pública em constante agonia, além da destruição de nossos recursos naturais, deterioração de cidades e espaços púbicos, o caos nosso de cada dia nos sufoca e nos mata de um jeito ou de outro. A presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, disse que os problemas dos brasileiros só podem ser resolvidos pelos brasileiros. Como?

Penso que, se os representantes eleitos democraticamente, e se as instituições legalmente constituídas não solucionam coisas básicas como escola, hospital, transporte, segurança, desenvolvimento e bem-estar, caberá à sociedade desunida, estratificada, hierarquizada e individualista achar uma saída? Os acontecimentos que sinalizam para uma convulsão social afligem e afastam entendimentos, diálogos e confiança a curto prazo, me parece. Otimismo não costuma funcionar no meio de tiroteios, balas perdidas ou direcionadas.  Se alguém leu este texto até aqui, merece ser cumprimentado. Afinal, vivo está. Sorte. O pior está por vir, já avisou o mega traficante preso Fernandinho Beira-Mar.

Até setembro de 2017, mais de 100 policiais morreram no estado do Rio de Janeiro em confrontos com bandidos. Por dia, em média, 16 pessoas são vítimas de criminosos por balas perdidas, assaltos e assassinatos na capital, a deslumbrante Cidade Maravilhosa, “purgatório da beleza e do caos, capital do sangue quente, do melhor e do pior do Brasil”, segundo Fausto Fawcett. De dois em dois anos, elegemos homens e mulheres para governarem as cidades, os estados e o país, além de representantes nos parlamentos municipais, estaduais e federal. Não tem funcionado.

Por termos políticos ineficientes e corruptos, o fantasma dos golpes militares volta a rondar o país (como se militar fosse sempre sinônimo de honestidade e garantia de qualquer coisa boa e ordeira, veja que ingenuidade). Pessoas sem instrução ou com bastante escolaridade apelam para os extremos de esquerda ou de direita, se valendo de discursos raivosos e intolerantes, como o do presidenciável Jair Bolsonaro. Apontado por alguns como o novo salvador da Pátria, considero-os, me perdoem, no mínimo imbecis. Sei que está difícil eleger qualquer político brasileiro. Não culpo simpatizantes de Bolsonaro, Lula, Ciro ou Marina, pois temos tradição em eleger messias imbecis para nos salvar, ou, para nos dar alguma vantagem pessoal. Figuras como Temer, Lula, Garotinho, Rosinha, Dilma, Aécio, Cabral, Cunha, Maia e seus pares representam o pior de uma sociedade investida de malícia, astúcia, encenação, gana para perpetuação no poder, além de mentiras e traições contratuais.

Estamos no fundo do poço, mas alguém ainda acredita que eleições diretas já ou em 2018 mudarão alguma coisa. Infelizmente, ainda não. Quem precisa mudar (e muito, e para muito melhor) é o povo brasileiro cheio de qualidades e de graves defeitos. Quem estará disposto a sacrificar-se a si próprio, a família, os bens ou os sonhos em favor de um país?

Não faz muito tempo que a palavra “paradigma” passou a fazer parte do vocabulário de nove entre dez pessoas que se diziam informadas, instruídas e convictas de mudanças ou transformações sociopolíticas. O termo vinha precedido do verbo “quebrar”. Virou lugar comum a expressão. Repetida diversas vezes na mídia, nas palestras, nas salas de aula, nas igrejas, nos partidos políticos, a necessidade de “quebrar paradigmas” ficou batida pelo caminho. Com as trapalhadas da política brasileira e a incompetência de diversas instituições, arrisco dizer que, esfarelaram os paradigmas já antes quebrados.

Com modelos fracassados e desmoralizados, estamos agora em busca de “empoderamento”, a nova expressão de ordem, da vez ou da hora. O empoderamento da mulher, o empoderamento dos gays, o empoderamento dos negros, o empoderamento de religiosos, o empoderamento de ateus, o empoderamento das minorias, o empoderamento dos sem voz e dos sem vez. Assim como “paradigma”, o tal do “empoderamento” me irrita, confesso, devido à uma certa vulgaridade ou vã repetição exercidas em rodas intelectualizadas e em discursos de ativistas.

Sou a favor dos que defendem qualquer causa, veja bem, da liberdade de expressão, da escolha e da prática de qualquer idioma ou vocabulário que sirvam para comunicar, educar, transformar, elevar a vida de qualquer pessoa, animais ou da própria Natureza que carece de todos os cuidados, zelos e ações. Todavia, ainda me baseio na Constituição Federal cidadã que diz “todo poder emana do povo”. Ingenuidade e poesia textuais? O povo poderoso e empoderado não é legitimado pela Carta Magna? Revestido de tanto e de todo o poder, por que ainda vivemos atolados em sujeiras e chiqueiros, submetidos às minúsculas elites que se apoderam de tudo?

Confesso não entender até hoje a necessidade de empoderamento das mulheres nos últimos anos no Ocidente, pelo menos. Desde pequeno, minha mãe e as mulheres da minha família sempre foram de personalidade forte, além de grandes gestoras de pessoas e de finanças, donas de opiniões e argumentos. Eram e são referências de mulheres de poder, apesar de não se intitularem feministas (talvez desconheçam o significado). Não é muito diferente o matriarcado brasileiro, pois há décadas, mulheres chefiam famílias e administram casa e trabalho como nenhum homem consegue. Se elas recebem salários menores que os homens, também não entendo.

Ainda não compreendo como uma sociedade pode ser machista quando é de maioria feminina. Se temos homens educados sistemática e significativamente por mulheres (mães, avós, tias e professoras), por que o nível de igualdade entre homens e mulheres não se equipara? Historicamente, temos (poucas, é verdade) mulheres que se destacaram à frente de influentes países. Na antiga Inglaterra, Elizabeth I; Em Israel, Golda Meir; no Reino Unido, Elizabeth II e Margaret Thatcher; na Nicarágua, Violeta Chamorro; no muçulmano Paquistão, Benazir Buttho; na machista Índia, Indhira Gandhi; e mais recentemente, a icônica chanceler Ângela Merkel que governa a Alemanha há doze anos e terá mais quatro de mandato. Mulheres empoderadas causam inveja ou servem de exemplo para outras mulheres e outros homens do mundo? Algumas dessas líderes mundiais experimentaram poder e perseguição, algumas morreram assassinadas. Empoderamento ou poder têm muitos riscos.

Talvez, por influência de Nossa Senhora, costumamos olhar para mulheres poderosas como Maria, mãe de Jesus, associando-as à figura idealizada da mulher sinônimo de força, nobreza e pureza incorruptível. As mulheres já foram apontadas como uma solução moralizadora na política. Entretanto, não é bem assim. A atriz Marília Pêra, que já foi ridicularizada por ter votado em Fernando Collor em 1989, passou a ser patrulhada a cada nova eleição presidencial pelo voto infeliz que declarou. Quando Dilma Rousseff se tornou candidata à presidência, um jornalista procurou a atriz para que opinasse sobre as mulheres no poder. Temerosa por novas críticas, e julgando-se ignorante politicamente, a grande diva brasileira respondeu assim ao jornal O Globo: “Não sei de onde tiraram a ideia de que mulheres na política significa mais honestidade. Isto não é uma garantia, pois as mulheres são terríveis, e eu sei disso, sou uma mulher”.

Sem querer gerar intriga feminina e feminista, não posso deixar de questionar: afinal, o que querem as mulheres? Eu penso que mulheres, homens, gays, negros, deficientes físicos, religiosos e ateus, todos, não carecem de mais empoderamentos, mas antes de qualquer coisa, precisam de respeito, respeitarem e serem respeitados em suas diferenças e semelhanças.

Se todos merecem respeito, os ex-governadores Rosinha e Anthony Garotinho também merecem, desde que respeitem outras pessoas, as instituições e as autoridades judiciais, como qualquer cidadão com ou sem foro privilegiado. A sentença que condenou Garotinho à prisão domiciliar com uso de tornozeleira eletrônica vem causando mexericos, piadas, discussões, críticas e ataques via mídias sociais. Grandes comunicadores e mobilizadores de massas, o casal Garotinho protagoniza mais um episódio barulhento na política.

Poderosos ou empoderados, marido e mulher fazem história há algumas décadas em acontecimentos escandalosos em suas gestões, e nas grandes disputas eleitorais. Ainda não sabemos se o casal chegou ao fim de carreira. Rosinha vem aparecendo como uma espécie de viúva de marido vivo, em tom dramático, quase argentino, de viúva de marido morto, como a ex-presidente da Argentina, Cristina Kirchner um dia se fez. A ex-governadora do Rio diz que ela e seu marido sofrem perseguição e são vítimas de injustiças por parte daqueles que condenaram Garotinho.

Por ser uma mulher poderosa e empoderada, Rosinha não se intimida em denunciar “a injustiça” sem maquiagem e sem retocar a raiz do cabelo, seja na porta de casa, em entrevistas coletivas ou no Facebook com vídeos caseiros, assumindo, aliás, que tem dopado o marido com calmantes para ele não sofrer ou morrer de tristeza pela “injusta” condenação que o mantém isolado, proibido de usar telefones ou internet, e de receber visitas apenas da família e advogados.

Entre as denúncias de perseguição, Rosinha se defende em vídeo desesperado e histérico, da acusação de violação da tornozeleira utilizada pelo ex-governador. Confessa que contrariou orientações de advogados para que não fizesse vídeos e não postasse nas redes sociais. Porém, devido ao “terrorismo” que vem sofrendo, ela precisava compartilhar com a população, com seus eleitores, com a imprensa e com as autoridades, a “mentira” que inventaram de Garotinho ter deixado a prisão domiciliar sem autorização da justiça ou polícia federal. Rosinha me comoveu, confesso. Qual homem que não se constrange quando uma mulher chora?

Não sabemos ainda o desfecho ou os desdobramentos das acusações e julgamentos de processos que envolvem o casal de políticos mais emblemático do estado do Rio de Janeiro. A calçada em frente à casa rosa da Lapa virou ponto de peregrinação e muro das lamentações. Porém, Garotinho foi dopado. Adormecido, deve sonhar com a liberdade e à volta aos braços do povo se reelegendo ao governo estadual, se elegendo presidente do Brasil ou da ONU, um dia.

Ainda não compreendo a falta de tornozeleiras eletrônicas no Brasil ou a falha do equipamento utilizado por criminosos condenados pela Justiça. O Supremo Tribunal Federal e o Ministério da Justiça poderiam assistir ao filme americano de 1991, Aliança Mortal (Wedlock), dirigido por Lewis Teague, e estrelado pelo extraordinário ator holandês Rutger Hauer, para solucionar o grave problema das cadeias e prisões brasileiras com um super equipamento eletrônico.

Na trama cinematográfica, cada prisioneiro tem um parceiro desconhecido e todos usam um colar explosivo. Caso o preso se afaste do grupo ou do par anônimo por uma determinada distância. o explosivo é acionado matando os dois condenados. Bum!!! Fuga possível, mas com risco de morte provocada pelos próprios criminosos sem a participação do Estado. É ficção, mas como diz Rita Lee, a rainha das mulheres poderosas e empoderadas do Brasil, “toda lenda é pura verdade” (ou deveria ser, penso). Fica a dica para os magistrados. Por falar em Rita Lee, a roqueira genial de Sampa é autora de uma canção extraordinária chamada “Todas as mulheres do mundo”, de 1993. O refrão diz o seguinte:

“…Toda mulher quer ser amada, toda mulher quer ser feliz, toda mulher se faz de coitada, toda mulher é meio Leila Diniz…”

A letra diz ainda “Elas querem é poder”, em outro trecho. Se elas querem, elas podem. Se Rita Lee pode; se Rosinha Garotinho pode; qualquer mulher pode, qualquer homem também pode. Ou não podem?

Não vai dar tempo de falar muito sobre a “cura gay” (que não existe). Eu apoio qualquer pessoa que se sinta infeliz com sua sexualidade e queira buscar apoio em qualquer consultório de psicologia, psicanálise, igreja, templo, terreiro de umbanda e afins. Tudo é valido para que ninguém seja infeliz, porém, que fique bem claro, ser homossexual não é motivo de vergonha, não é doença, não é anormal e não tem remédio ou cura. Ser heterossexual ou bissexual também não tem cura, e não deveria incomodar a ninguém.

A sexualidade é uma característica individual. Dá para ser feliz praticando sexo ou abrindo mão de sexo (esta não é a coisa mais importante da vida, pois cedo ou tarde, todo mundo broxa). Bom mesmo é se apaixonar, amar e cultivar amizade. Ninguém deve ser obrigado a nada, mas se amar e se aceitar do seu jeito, creio, é bem melhor. É algo poderoso desfrutar a liberdade, as bênçãos da vida e o prazer do corpo e da mente. Amor sempre ajuda em qualquer ocasião. Nossos governantes poderosos precisam aprender o que é amar seu país e sua gente. A população também precisa aprender o mesmo.

Depois de 36 textos, de dezenas ou centenas de opiniões distribuídas nesses escritos, despeço-me do blog Opiniões hoje. Por um ano e meio, escrever neste espaço me renovou e me motivou. Agradeço a generosidade de Aluysio Abreu Barbosa, amigo que admiro, ao jornal Folha da Manhã que publicou e imprimiu alguns destes textos, aos colegas escritores-colaboradores, e especialmente aos leitores, pois sem estes nada faz sentido para quem escreve. Foi uma honra. Fernando Pessoa diz que “viver não é preciso”, mas eu necessito viver e navegar outros mares imprecisos, cuidar da saúde e seguir adiante. Aporto um dia.

 

Igor Franco — Rock in Rio: Lacre Edition

 

 

 

Terminou ontem a sétima edição do Rock in Rio. Conto apenas as brasileiras, obviamente, até porque pensar em “Rock in Rio Madrid” soa tão antagônico quanto “inferno” e “céu”. Nessa Era Trans, seria ótimo podermos acordar e decidir que, a partir de então, o Rio não seria mais Rio, mas Madri. E todos os que não permitem que o Rio seja Madri deveriam, imediatamente, parar de impedir a Cidade Maravilhosa de transformar-se numa cidade maravilhosa: políticos, bandidos, malandros…

Artistas revezavam-se nos palcos do festival em favor da salvação da Amazônia, passando por pedidos de fim à corrupção e deposição do presidente. A etapa da “defesa da diversidade” teve como destaque a apresentação de Pabllo Vittar. Enquanto as editorias de todos os portais de notícias festejavam o cantor, muitos comemoravam o “choro da família tradicional brasileira” — a mesma que viu o festival nascer com Freddie Mercury, Cazuza, Elton John, George Michael e outros de maior talento.

O auge da lacração, entretanto, só seria atingido com o deprimente “abraçaço” comandado pelo Jota Quest em favor da paz no Rio. Enquanto o público do RiR se abraçava nos gramados, algum pai abraçava sua família na favela da Rocinha, como se a protegesse dos tiros. Naquele mesmo dia, quase mil homens do exército terminavam o desembarque da megaoperação hiper-improvisada para pôr fim à guerra de traficantes que sequestrava o pouco da liberdade dos moradores e adicionava mais tensão ao caldeirão de violência que transborda há décadas no Rio.

Até este momento, o balanço da operação conta com 10 presos, três mortos e quase 20 fuzis apreendidos. Pelo visto, a estratégia da gambiarra militar seguirá a filosofia cabralina das UPPs: poucas prisões e mortes ostentadas como sinônimos de sucesso. Aliás, a política de combate ao crime sem bandidos mortos ou presos é aprovada por 11 em cada 10 “especialistas em segurança pública”, incapazes de entender como a população refém dos mesmos bandidos vivos e soltos não pensa o mesmo.

O descolamento da vida real sempre foi uma marca de artistas em todo o mundo e todo o tempo. Noves fora o inebriante efeito da fama, talvez determinante para esse fenômeno seja o que na psicologia e nas finanças comportamentais chama-se viés da confirmação. Como artistas tendem a conviver com seus pares, a homogeneidade de visões de mundo prevalece sobre as dissidências. Ao verificar que suas posições são compartilhadas por seus pares e, principalmente, endossadas pelo seu público cativo, passam a tratar aquilo como uma verdade absoluta contra a qual não pode haver contestação. Esse efeito é potencializado pelas redes sociais, em que curtidas e compartilhamentos instantâneos parecem adicionar ainda mais verdade a opiniões e gestos com a profundidade de um pires.

No campo das finanças comportamentais, o risco dos vieses é a tomada em série de decisões erradas que levam para um acúmulo de risco que, mais cedo ou mais tarde, pode ter resultados devastadores. Para nossa sorte, os artistas (ainda) não estão em posição de tornar o abraçaço uma política pública­­­ — embora os intelectuais, esses sim, mais perigosos, proponham coisas tão ineficazes quanto.

Com o festival encerrado, muitos artistas espantaram-se ao perceber que a manifestação não surtira efeito nos traficantes, que ainda não haviam se rendido.

Talvez um “beijaço” pudesse ter funcionado.

 

Alexandre Bastos — Fanatismo rosáceo e a profecia do fim do mundo

 

Rosinha e Dorothy

Em artigo publicado (aqui) no jornal “O Globo”, o cineasta José Padilha lembrou que, na década de 1950, três sociólogos americanos entraram para um culto que previa o fim do mundo para o dia 21 de dezembro de 1954. O culto se baseava nas palavras sagradas da “profeta” Dorothy Martin, que recebia mensagens psicografadas. Segundo Dorothy, suas mensagens vinham do planeta Clarion. Os habitantes deste planeta teriam dito que um disco voador viria à Terra à meia-noite do dia 20 de dezembro de 1954, e que salvaria as pessoas que seguissem as orientações de Dorothy.

E, como existem muitas pessoas dispostas a acreditar no impossível, muitos abandonaram seus empregos e cursos universitários para esperar o fim do mundo. Teve até gente que deixou a família para se juntar a Dorothy. Foi assim que, no dia 20 de dezembro de 1954, um grupo se reuniu na frente da casa de Dorothy Martin, em Chicago, para esperar uma nave espacial que viria à Terra buscá-los. Na hora marcada, após muita ansiedade, não apareceu disco voador algum. Mas o que Dorothy disse nesse momento? Rápida, ela simulou um desmaio e depois escreveu uma carta com uma nova mensagem do espaço. Segundo a carta, os alienígenas desistiram de passar pelo local porque a terra foi salva pela fé daquelas pessoas.

Os três sociólogos americanos atribuíram a relutância dos seguidores de Dorothy em aceitar a realidade a um fenômeno psicológico denominado de dissonância cognitiva. Eles optaram por negar a verdade a sofrer a vergonha de ter que reconhecer o erro que cometeram, mesmo que, para isso, precisassem criar explicações absurdas.

E o que esse caso tem a ver com a nossa planície goitacá? Por aqui, a ex-prefeita Rosinha Garotinho, que nunca psicografou cartas do planeta Clarion, consegue reunir seguidores em frente a sua residência para “lutar contra injustiças”. Para os seguidores, o ex-governador Garotinho é um pobre coitado perseguido por poderosos.

Os seguidores não acreditam em prejuízo de R$ 11 milhões no escandaloso esquema da Chequinho, em de R$ 12 milhões disponibilizados pela Odebrecht, rombo de R$ 400 milhões na PreviCampos, e uma dívida de R$ 2,4 bilhões deixada para atual gestão. Eles preferem repetir o mantra da perseguição e ignorar a presença do líder em escândalos como Lava Jato, Chequinho e caso JBS. Ou seja, são inúmeras denúncias e ele é inocente e perseguido em todos os casos. Mas pensando bem, a comparação com o caso Dorothy Martin é um pouco exagerada. Afinal, é mais fácil acreditar que os alienígenas irão passar por aqui do que aplaudir o teatro rosáceo.

 

Guiomar Valdez — Brasil entre o freio civilizatório e a esperança

 

 

 

Nesta era ‘acelerada’, de vínculos frágeis, de ‘just in time’, de unidades fragmentadas, etc, etc, oriunda do ‘jeito de ser e de estar’ das demandas do sistema produtivo do capital e sua necessidade de auto sobrevivência, não está sendo fácil de viver na ‘compressão espaço/tempo’. Como consequência, é visível nas sociedades, a angústia, a ansiedade, o desânimo, a histeria, dominando nossas mentes e corações, bloqueando nossa capacidade de refletir e de agir de maneira mais ampliada, profunda e articulada. Atingindo elementos fundantes da natureza humana, como, por exemplo, a capacidade de desenvolver a razão crítica e a necessidade ontológica de se relacionar, de se integrar, de desenvolver o afeto, a liberdade, o respeito, o crescimento em conjunto. Porque é ‘do humano’, ser único, ser uma unidade na diversidade.

Daí, vivenciarmos uma era que me parece ‘anti-humanista’, portanto, um estado de barbárie, de torpeza, de estupidez e de aberração à vida e unidade humanas. Esse ‘fio condutor’ presente na interpretação das relações humanas nos faz concluir, mesmo que provisoriamente, que a saída para esse quadro, consciente, ou não, tem sido a competição e o individualismo exacerbados como premissa e ação, desdobrando-se na também exacerbação do fundamentalismo, da intolerância, da polaridade, do desrespeito ao que é humano e de suas relações. Paz, solidariedade, bem-comum, bem-querer, respeito, verdade, etc, passam a ser vividos apenas como retórica.

É um ‘freio civilizatório’, é um ‘brake nas utopias e esperanças’. É a vitória do conformismo, do enquadramento, do ‘salve-se quem puder’, para que se realize a perpetuação do sistema capital como ‘ordem e progresso’ na vida societária. Na verdade, não só a ‘história acabou’, como também, ‘a história nunca existiu’, é o ‘presente contínuo’ que vale, não há passado nem futuro. Há o ser humano sufocado e inerte, uma mercadoria à deriva.

Entretanto, e, muito, entretanto, o ‘freio civilizatório’ que passamos não é natural. Ele é histórico, é movimento, é movimento contraditório em suas faces. Essa tem sido uma das grandes dificuldades que temos hoje – enfrentar respeitosamente a dialética em nossas vidas! Chegamos ao fim, pensamos assim. Buscamos argumentos muitas vezes fundamentalistas para desesperadamente termos respostas. Mergulhamos numa insanidade social, numa culpa sem sentido, respondendo de forma messiânica os desafios colocados.

É neste contexto, ou ‘pano de fundo’ que percebo o meu país. Reconheço que os tempos estão sombrios. Parece que desmoronou tudo ou quase tudo no ‘universo brasileiro’ em todas as suas dimensões. Parece que a nossa História perdeu sentido como caminho hermenêutico. Inundamos nosso trajeto de correria, de pressa por respostas e proposições. Parece que não há espaço para o desenvolvimento de uma razão crítica, portanto, não passional; que não há espaço para o contraditório, para a autocrítica, para (re)construção de laços marcados pela lealdade, capazes de formular um projeto de nação. Reconheço que mergulhamos bem fundo nos elementos do ‘freio civilizatório’.

Como vivemos num ‘presente contínuo’, esquecemos completamente que em 517 anos predominaram o arbítrio, o clientelismo, o paternalismo, o patrimonialismo, a mão-de-obra escrava, a cultura exógena/subalterna, a economia dependente primário/exportadora. Pensando em democracia, tivemos um ‘ensaio geral’ de 19 anos (1945-1964), intermediado por 21 anos de Ditadura Civil-Militar, para retomarmos a vivência deste ‘modo de vida’ e seus símbolos, que não chegaram ainda aos 30 anos: 29 anos da Constituição Cidadã (1988), 28 anos da 1ª eleição direta à presidência da República (1989)! Assimilando, na nova síntese histórica, elementos conservadores ou reacionários, vivenciados e acordados na ‘transição lenta e gradual’. Esquecemos que nos 517 anos sempre tivemos um lugar periférico no sistema/mundo!

Pensamos o quê? Que vivíamos numa democracia plena e longeva? Que a corrupção terminaria por si só, ou com as leis? Ou que não seria tão grande? Que os conquistados direitos do trabalho, direitos sociais e direitos humanos, estariam seguros? E que por tudo isso, diante desta profunda e ampliada crise estrutural, a ditadura seria melhor? Ou que só temos o ‘caminho único’ para solucionar nossos problemas?

Pensamos o quê? Que éramos uma economia urbano/industrial autônoma? Que atingimos a equidade na distribuição da riqueza, da terra, do fruto do trabalho? Que construímos, diante da nossa diversidade, uma cultura em síntese? Que reconhecemos a diferença como elemento fundante da unidade? Que o trabalho foi valorizado como a atividade humanizadora? Que teríamos ultrapassado o tripalium? Que, se tudo isso fosse verdadeiro, teríamos extirpado a intolerância, o preconceito e a discriminação?

Poderia continuar fazendo perguntas simples, como essas. Mas não precisa. Elas nos ajudam a reafirmar que o ‘freio civilizatório’ é construção em todas as suas facetas, não é destino, nem o fim. Ele é ‘projeto de classe’ desnudado, que aliena e impõe o medo, o desespero e o conformismo, porque ainda não foi construído uma alternativa visível e robusta para combatê-lo. Vivemos em tempos de ‘interregno’. Por isso está valendo tudo, até o inimaginável!

Um exemplo desta ‘crise de alternativa’ de caráter civilizatório, são as eleições de 2018! Para o campo conservador e reacionário, está tudo compreendido, pensado a curto, médio e longo prazos. Eles vão à luta buscando sua consolidação. Para o campo progressista, infelizmente só pensado a ‘curto prazo’ (bem ao gosto hegemônico), apresenta-se o ‘caminho único’, sem autocrítica, sem generosidade, sem projeto de nação. O ‘presidencialismo de coalisão’ e a enganosa e frágil ‘conciliação de classes’ já se apresentam superados, tiveram seu sentido histórico ao chegar ao poder, mesmo considerando todas as críticas e devaneios.

Devemos enfrentar esta realidade, não fugir dela. Não buscar argumentos que acalentam mais o coração individualizado, do que a esperança de construção de um projeto de nação que busque o bem-comum. Não devemos aprisionar o ‘tempo’ e seu fardo, nem mesmo a História, ao nosso desejo. Não ao ‘messianismo’, não ao ‘populismo’, não ao ‘presente contínuo’, não à alienação tão desejada pelos conservadores e reacionários como elemento forte de continuidade!

Daí que precisamos retomar com altivez e esperança equilibrista, de onde partimos, nas origens da extinta Nova República, tão cheia de sonhos e de viabilidade para nosso país. Mas, também, encharcadas do ‘velho travestido de novo’, de perpetuidades, que bloquearam e podaram o amadurecimento das forças progressistas. Por isso o final dessa etapa histórica, é melancólico. Mas não é o fim da História.

Para esta retomada exige-se tempo, não o tempo acelerado, promíscuo e de vínculos frágeis. No período de ‘interregno’ é fundamental aprendermos e exercitarmos a dialética enquanto possibilidade interpretativa de formulações, de mudanças e de novas sínteses. O ‘freio civilizatório’ e o que vier das eleições de 2018 não deverão congelar ou abalar a nossa esperança. Pelo contrário, muitas vezes, quando há um brake, perdemos a estabilidade, encontramos obstáculos, rodopiamos, mas podemos, dependendo do condottiere coletivo, voltar à estrada rumo a um ‘destino’ construído por homens e mulheres generosos, solidários, pacientes, tolerantes e sem preconceitos!

 

Guiomar Valdez e Alexandre Bastos estreiam nestas sexta e sábado no Opiniões

 

Nos últimos meses, alguns colaboradores foram deixando o blog, cada qual por sua demanda. E já passou da hora deste “Opiniões” recompor seu time. Não por outro motivo, quem pessa a escrever amanhã (22), quinzenalmente, é a historiadora e professora do Instituto Federal Fluminense (IFF) Guiomar Valdez. No sábado seguinte (23), quem estreará neste espaço, também em colaboração quinzenal, é o Alexandre Bastos, chefe de gabinete do governo Rafael Diniz (PPS), mas que ficou mais conhecido na cidade como jornalista e blogueiro.

As novidades não param por aí. A próxima semana trará mais novidades, assim como o mês seguinte de outubro. Mas elas serão anunciadas no tempo devido. Por ora, vamos saber, em palavras próprias, um pouco mais do que são e do que pretendem trazer a você, leitor do blog, a Guiomar e o Bastos:

 

Guiomar Valdez e Alexandre Bastos (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

Guiomar Valdez —  Em primeiro lugar agradeço o convite feito e aceito. Pretendo contribuir neste espaço jornalístico, virtual e em rede, com opiniões, proposições e debates, em temas livres ou consensuais que tenham relevância para desnudar os males que assolam o nosso mundo/país/região. Meu objetivo é ajudar mediar pensamentos e ações que busquem consolidar uma outra maneira de ‘ver o mundo’, em escalas e tempos diferenciados, portanto, menos desigual, mais democrático, alimentador da liberdade, da solidariedade e do bem-comum. Graduada em Hisótria na Faculdade de Filosofia de Campos (Uniflu), é mestre em Educação pela Universidade Federal Fluminense (UFF), com especialização em História Moderna e Contemporânea (PUC/MG) e História do Brasil (Uniflu/Faculdade de Filosofia de Campos). Docente do IFF na pós-graduação lato sensu, nas licenciaturas e na educação básica. Docente coordenadora de disciplina em EaD na Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf) na graduação em pedagogia. . Tem experiência no ensino, pesquisa e extensão nas áreas de história contemporânea, educação brasileira, educação profissional e tecnológica, educação de jovens e edultos, gênero, cultura brasileira e regional, sindicalismo docente, agroecologia e direitos humanos. Possui artigos/capítulos publicados em livros, revistas e jornais. Possui experiências de gestora acadêmica e institucional:  pró-reitoria de Desenvolvimento Institucional, Coordenações de Área e Níveis de Ensino (superior e Mmdio), em formulação, gestão e execução de Cursos, de Projetos, de Programas Institucionais e Plano de MetasAcumula experiência em movimentos sociais e sindicais.

 

Alexandre Bastos —  Já são quase 15 anos no jornalismo. As primeiras matérias publicadas foram na revista Caraca, depois passei a ser articulista da Folha durante a tumultuada eleição de 2004. No início de 2005 comecei a trabalhar como repórter da Folha Dois. Sete meses depois já estava na editoria de política, como repórter. Em agosto de 2006 deixei o jornal para atuar como assessor de imprensa. Em 2007 voltei ao jornal como editor da Folha Dois. Fiquei até o fim daquele ano e voltei a atuar como assessor de imprensa. Em novembro de 2008 retornei à Folha. Entre 2008 e 2016 fui repórter de política, editor, blogueiro, colaborador do Ponto Final e colunista. Durante as três passagens pela Folha fui articulista, blogueiro, repórter e editor da Folha Dois, repórter de política, crítico de cinema, colaborador do Ponto Final, editor de política, colunista e participei de coberturas no Esporte. No final de 2016 deixei o jornal para participar da transição entre a gestão Rosinha e o atual governo municipal. Já atuei como assessor de Comunicação da Câmara de Campos, da Fundação Estadual do Norte Fluminense e, atualmente, exerço a função de chefe de gabinete do prefeito Rafael Diniz. Neste espaço, assim como tenho feito no Blog do Bastos, irei comentar sobre temas que envolvem o cenário político de Campos e da região. Além disso, neste ambiente virtual cada vez mais democrático, muitas vezes um texto gera comentários que servem como bússola para auxiliar na condução de importantes ações. A ideia é estimular debates sobre o cenário local, sobretudo neste momento em que a participação de todos os segmentos é fundamental no processo de reconstrução da cidade.

 

Guilherme Carvalhal — Promessa de amor

 

 

 

Poucos dias após a morte de meu avô, a vovó chamou-me ao canto. Não demonstrava sinais de abalo, pelo contrário: diria agora mais lívida, em um respirar folgado após os meses de luta do marido contra o câncer de próstata. E me disse em uma confissão levemente envergonhada:

— Seu avô nunca me amou.

De imediato não captei sentido dela dizer um despautério desses. Vovô fazia de tudo para agradá-la. Jamais a deixou na mão nem por um instante. Por que agora dizia algo assim?

— Ele amou outra mulher. Uma certa Jurema. Namoraram na juventude, mas o pai dela a obrigou a casar com outro. Seu avô se conformou comigo, mas no fundo jamais deixou de amá-la.

Toda a dedicação de vovô, então, nascia não do amor, mas do sentimento de culpa. Por isso ele se levantava cedo para colocar o pão na mesa e sempre a abordava com um sorriso nos lábios, pelo seu incômodo consigo mesmo por trazer no peito a lembrança constante daquela com quem primeiramente pretendeu casar.

Pareceu-me algo um tanto quanto perturbador saber disso, e, mais ainda, a única pessoa a quem ela contou isso fui eu, em um estranho voto de confiança para quebrar em mim toda a crença na beleza da estrutura familiar. Como olhar os almoços de domingo sem mais imaginar o clima de amor e companheirismo antes reinante?

Vovó então, levando mais além essa revelação de segredos do passado, mostrou-me uma carta antiga, de papel bem amarelado, onde em letras apagadas os dois jovens amantes impunham os termos de sua paixão por toda vida. Infelizmente não se poderia ler o final, de tão apagada estava.

Duas semanas depois recebi uma ligação de uma moça chamada Ana Maria. Parecia aturdida e desejava encontrar com alguém da família de meu avô. Afirmava tratar de algo referente a ele e que preferia falar comigo, contanto que distante da minha avó.

Concordei em reunir-me com ela em uma lanchonete em local público, temendo cair em algum tipo de armadilha. Ela chegou e sentou na minha mesa, como se houvesse entre nós dois alguma intimidade. Não tirou os óculos escuros, como se escondesse marcas de choro.

Contou-me sobre as últimas vontades de sua vó, falecida há duas semanas. Disse que relembrou de uma aventura da juventude, e pediu que suas palavras de amor chegassem a seu antigo amante, em uma transmutação derradeira de sentimentos. E, ao procurar saber, se assustou ao descobrir o óbito de meu avô pouco antes.

Lamentei pelo ocorrido, contei a versão de minha avó acerca dos fatos e disse não entender o porquê dela querer abordar tal assunto. Tratava-se de um caso de amor pretérito, algo enterrado nas suas sepulturas, que não precisava vir à tona.

Eis então que ela sacou uma carta, a mesma carta que eu possuía, a cópia de sua avó, bem mais conservada. Consegui ler até o fim e me espantei e compreendi a expressão desgastada de Ana Maria: os últimos termos daquele documento firmavam um pacto de morte juramentado por ambos há mais de cinquenta anos. Prometeram um ao outro morrerem juntos e, da forma mais absurda e funesta, cumpriram com suas palavras.

Jamais compreendi ao certo como aquilo poderia acontecer, nem nunca comentei com mais ninguém minha descoberta. E, portador de um segredo inexplicável, me perdi em pensamentos, imaginando a união desse casal apaixonado no mundo dos mortos.