Daqui a menos de 10 meses, o que se pode esperar das urnas presidenciais de 2 de outubro de 2022? A partir da divulgação mensal de pesquisas de vários institutos, as entrevistas que o Grupo Folha tem promovido com uma série de personagens nacionais sobre o pleito tem ajudado a constatar algumas tendências e antecipar outras. Até as convenções partidárias entre 20 de julho e 5 de agosto, quando serão definidas as chapas e seus arcos de aliança, tudo será formalmente especulação.
Desde que Lula (PT) entrou oficialmente no jogo em 8 de março, com a decisão do ministro Edson Fachin de anular as condenações do ex-presidente, depois ratificada pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), ele chegou chegando na segunda posição. Na pesquisa Atlas feita entre os dias 8, da decisão de Fachin, e 10 de março, o líder petista já aparecia com 27,4% das intenções de voto. Largou atrás do presidente Jair Bolsonaro (hoje, PL), com 32,7%.
A condução criminosa da pandemia pelo governo federal seria revelada em detalhes pela CPI da Covid no Senado Federal, entre 27 de abril e 26 de outubro. Na sua condução desastrosa da economia, evidenciada por qualquer brasileiro a cada compra de supermercado, a inflação bateu em setembro os dois dígitos no acumulado dos últimos 12 meses. O que não acontecia desde 2016, na esteira da catástrofe econômica do governo Dilma Rousseff (PT).
Emblematicamente, setembro foi o mês em cujo sétimo dia, como numa missa fúnebre travestida de verde e amarelo, Bolsonaro tentou dar um golpe de estado. Que também demonstrou absoluta incompetência para consumar. Dois dias depois, com o rabo entre as pernas, pediu socorro às pressas ao ex-presidente Michel Temer (MDB). E suplicou em áudio aos caminhoneiros que o apoiavam para liberarem as estradas. E, na piada de si mesmo, foi incialmente tratado como fake news por seus apoiadores nelas amestrados.
Desde a redemocratização do país, Lula foi oposição aos governos José Sarney (MDB), Fernando Collor de Mello (hoje, Pros), Itamar Franco (MDB, quando presidente), Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Temer. E, até a autofagia voraz de Bolsonaro, o petista nunca precisou fazer tão pouco para ganhar tanto. Pela mesma série de pesquisas Atlas, o ex-presidente passou o atual nas intenções de votos desde julho: 39,1% a 35,9%. Liderança cada vez mais isolada em todas as consultas de todos dos demais institutos.
Lula não só deixou Bolsonaro para trás. Tudo até aqui indica que também feriu de morte a outra pré-candidatura relevante da esquerda: do ex-governador do Ceará Ciro Gomes (PDT). Ambos, Bolsonaro e Ciro, ainda seriam duramente golpeados com a chegada de outro adversário à disputa: o ex-juiz federal Sergio Moro. Antes mesmo de se filiar ao Podemos no último dia 10, a referência da Lava Jato assumiu do pedetista a terceira posição nas pesquisas. E o fez avançando sobre o eleitorado do capitão, a quem serviu como ministro da Justiça.
Pelo menos neste último mês, Moro se mostrou uma opção de terceira via eleitoralmente mais viável que Ciro. E mais capaz de tirar votos de Bolsonaro, inclusive em altas patentes das Forças Armadas, do que o cearense em meses de críticas duras conseguiu tirar de Lula. Na pesquisa Atlas mais recente, divulgada na última terça (30), o presidenciável do Podemos apareceu pela primeira vez isolado na terceira colocação, com 13,7%. Foi mais que o dobro dos 6,1% de Ciro. Mas ainda bem atrás de Lula, com 42,8%; e Bolsonaro, com 31,5%.
Na quinta (02), a jornalista Camila Mattoso, da Folha de S. Paulo, noticiou que presidentes de alguns dos principais partidos já avaliam que Moro pode ultrapassar Bolsonaro nas pesquisas dos próximos meses. “Para essas lideranças, a troca de posições já tem prazo para acontecer: Moro estará à frente de Bolsonaro antes de fevereiro de 2022. Eles dizem, em caráter reservado, que têm ouvido ponderações de parlamentares bolsonaristas em relação ao que fazer caso o cenário se confirme, ou seja, se pulam do barco ou seguem com o presidente até o fim. Bolsonaro tem dado sinais claros de que se vê afetado pelo crescimento de Moro. Nesta quinta, o presidente o chamou de palhaço e sem caráter”, registrou a repórter a reação do mandatário chamado de “Bozo” por seus detratores.
Antes mesmo de Moro entrar no jogo, o jornalista Fernando Gabeira, da Globo News, deu o caminho das pedras no Folha no Ar de 8 de outubro: “Tenho a impressão de que Bolsonaro pode não ir ao segundo turno, porque as crises se sucedem no governo federal. Existe uma possibilidade de o Bolsonaro perder energia nesse processo, progressivamente. Responsável que ele é pela condução do país e incapaz como ele é de dar solução a esses problemas todos que nós estamos vendo, é possível que um outro candidato possa ameaçá-lo. E, ameaçando, possa derrotá-lo, indo para o segundo turno. E, uma vez indo ao segundo turno o Lula contra um candidato que não seja o Bolsonaro, pode acontecer alguma coisa também”.
Na manhã de ontem (03), foi a vez de outro grande jornalista brasileiro falar à Folha FM 98,3. Colunista da CBN, O Globo e Estadão, Pedro Doria observou já com o ex-juiz federal no jogo: “Se você parar para pensar o que o eleitor queria em 2018, ele votou no Bolsonaro pensando no Moro. A maior parte dos eleitores brasileiros não é de extrema-direita. O que uma imensa parcela dos eleitores votou quando escolheu o nome do Bolsonaro, viu no Bolsonaro o reflexo da Lava Jato. E uma repulsa ao PT, aquilo que a gente chama de antipetismo. É por isso que votaram no Bolsonaro. O Bolsonaro não entregou nada disso. O Moro entrega isso, o Moro é da Lava Jato. Então, se por um acaso o eleitor ainda estiver naquele clima de 2018, eu acho que a candidatura do ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro tem um potencial imenso de crescer”.
Como consta na entrevista reproduzida nas páginas 2 e 3 desta edição, em resumo da concedida ao Folha no Ar de ontem, Doria (o Pedro, não o João) também ressalvou corretamente: “Bolsonaro é favorito para estar no segundo turno. Existe espaço para um outro candidato de direita ou centro-direita ocupar o lugar dele e crescer em cima dele. Num segundo turno contra Bolsonaro, acho muito difícil que o ex-presidente Lula perca. No segundo turno contra outro candidato, acho que qualquer coisa pode acontecer, inclusive a derrota do Lula. Agora, pode ser que em março do ano que vem eu tenha outra opinião. Isso é um filme, não é uma fotografia”.
Publicado hoje na Folha da Manhã.