Pregão eletrônico e agropecuária são alternativas à crise financeira de Campos

 

Desde 18 de julho, a Folha da Manhã abriu uma série de painéis (confira cada um deles aquiaquiaquiaquiaqui, aquiaqui, aqui, aqui e aqui) que chega hoje à sua 11ª edição. E nele se dedicou a discutir e buscar alternativas à questão mais importante que o resultado das urnas municipais daqui a exatos 50 dias: a grave crise financeira de Campos, talvez a pior em seus 185 anos de história. Por conta dela, com R$ 0,00 de participação especial de agosto, fato inédito desde que a antes milionária receita petrolífera começou a ser paga há 20 anos, o poder público municipal tem atrasado pagamento de RPAs, servidores aposentados e pensionistas. E as promessas dos 12 candidatos a prefeito estão mais realistas, sem a irresponsabilidade que em passado recente conduziu o município à presente situação.

Hoje, em ordem alfabética, foram ouvidos o empresário Francisco Roberto de Siqueira, presidente da Firjan-Campos; o advogado e servidor público José Renato Duarte e o petroleiro Tezeu Bezerra, coordenador-geral do Sindipetro-NF. Antes deles, dedicados ao mesmo debate, passaram por aqui especialistas de economia, finanças, ciência política, antropologia e sociologia, além de juristas, jornalistas, gestores universitários e outros empresários e sindicalistas. Apesar das suas diferenças de formação, experiência, valores e visão, todos concordam com a seriedade do quadro econômico de Campos. Que afeta e continuará a afetar diretamente a vida das suas mais de 507 mil almas, muito depois das eleições de novembro. A adoção integral do pregão eletrônico nas compras do poder público municipal e a retomada da secular vocação agropecuária goitacá foram apontadas como alternativas.

 

Empresário Francisco Roberto de Siqueira, presdiente da Firjan-Campos; advogado e servidor municipal José Renato Duarte e petroleiro Tezeu Bezerra, coordenador-geral do Sindipetro-NF

 

 

Folha da Manhã – O governo Rafael Diniz (Cidadania) enviou à Câmara a previsão orçamentária de R$ 1,7 bilhão para 2021. Mas, em painel da Folha publicado em 1º de agosto, o economista Alcimar Ribeiro, professor da Uenf, calculou em R$ 1,57 bilhão. Projeção classificada como “otimista” em painel de 29 de agosto, pelo também economista Roberto Rosendo, diretor da UFF-Campos. O fato é que R$ 1,1 bilhão desse dinheiro já está comprometido com folha de pagamento, dentro de uma projeção total de gastos de R$ 2 bilhões para o próximo ano. Há solução aritmética para Campos? Qual?

Francisco Roberto de Siqueira – Acredito que a principal ação seja atrair mais investimentos, seja por meio da instalação de novos negócios, seja por projetos em infraestrutura. Para isto as PPPs podem uma ferramenta imprescindível. Cada R$ 1 bilhão investido na construção civil representa um potencial de geração de mais de 14 mil empregos. Há também grandes possibilidades a serem vislumbradas como os novos marcos do saneamento e do gás que podem afetar positivamente o cenário econômico do município.

José Renato Duarte – Mesmo trabalhando com a previsão orçamentária que o prefeito enviou para à Câmara de R$ 1,7 bilhões para 2021 e com despesas de R$ 2 bilhões, a conta não fecha. E para piorar, com pagamento dos servidores sendo realizado por categoria e sempre partir do dia 10 de cada mês em diante, resta mais que claro que o mês de dezembro e o 13º ficarão para 2021. Somam-se ainda os vencimentos dos aposentados e pensionistas, sem computar a dívida desconhecida, com os fornecedores. Portanto, é grave a crise, e a solução passa pelo binômio: corte de despesas e aumento na receita.

Tezeu Bezerra – Campos chegou a ser o 6º município com maior PIB no Brasil em 2012, perdendo somente, naquele ano, para São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Belo Horizonte e Curitiba. Desde então, o município caiu no ranking nacional e ocupava, em 2017, a posição de número 41 entre 5.570 municípios no Brasil. O “tombo” ilustra a situação de crise do município, que foi agravada pela pandemia. A curto prazo não tem solução aritmética para a cidade. Sentiremos na cidade um gosto amargo de crise por mais alguns anos e só com a retomada de investimentos teremos a médio prazo um novo equilíbrio das contas do município.

 

Economistas Alcimar Chagas, professor da Uenf, e Roberto Rosendo, diretor da UFF-Campos

 

Folha – Com atraso recorrente no pagamento de RPAs, aposentados e pensionistas, mais um inédito R$ 0,00 de participação especial em agosto, desde que a renda petrolífera começou a ser paga em 2000, o quadro local tende a se agravar se a partilha dos royalties já aprovada no Congresso passar também no julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF), remarcada em 3 de dezembro. Qual a sua expectativa?

Francisco Roberto – A Firjan sempre alertou para os graves impactos econômicos, financeiros e sociais aos estados e municípios produtores caso a lei seja implantada. Afinal, os municípios é que são penalizados com a atividade, podendo ser uma questão ambiental, crescimento populacional e todo o seu impacto. A parcela maior a ser recebida pelos produtores segue a lógica do ônus territorial e do risco. Agora, há um movimento defendido pelos estados produtores, a partir de uma proposta do Espírito Santo, que cria uma linha de corte para a implementação da redistribuição e tenta evitar perdas maiores. Espero que o STF tenha sabedoria ao analisar a questão e faça justiça aos estados e municípios produtores.

José Renato – É necessário voltar um pouco no tempo. Assim que o atual prefeito assumiu, herdou empréstimos feitos e despesas a pagar. A previsão era que não haveria receita para pagamento dos servidores no mês de março de 2017. É uma crise financeira que se arrasta a mais de três anos e meio. As medidas amargas, Rafael não quis aplicar e, na próxima gestão, quem assumir e não fizer o dever de casa, com a expectativa das despesas já apontadas e com a provável redução da receita, com a decisão do STF, a perspectiva é infausta.

Tezeu – A minha expectativa é que o Supremo legitime a lei de partilha e essa crise se agrave. Campos possui royalties da grande maioria dos campos da Bacia, cerca de 35, por isso o descaso recente da Petrobras atinge diretamente a cidade. A produção da Bacia de Campos ficou estável de 2010 até 2015, em torno 1,8 milhão de barris equivalentes por dia. Em 2016 essa produção despenca, passando para 1,5 milhão em 2017 e chegando ao patamar de 1,1 milhão, em 2019. A crise da pandemia da coronavírus acelerou ainda mais esse processo, chegando a 853 mil de barris equivalentes em maio de 2020. As lideranças políticas de Campos e região acreditam na historinha que se privatizar as plataformas de campos maduros os investimentos voltam e a produção aumenta. Hoje temos clareza que aconteceu exatamente o contrário.

 

Empreendedores Joilson Barcelos, Renato Abreu e Ricardo Paes Teixeira

 

Folha – Em painéis anteriores, os empreendedores Joilson Barcelos, Renato Abreu e Ricardo Paes Teixeira propuseram em 8 de agosto um pacto com os servidores para cortes na máquina, inclusive em pessoal. Em 15 de agosto, os sindicalistas Edson Braga, Elaine Leão e José Roberto Crespo se colocaram contra qualquer corte de pessoal. Há meio termo? Ele teria que ser encontrado através de um “pacto”, tecla em que bateu o professor Raul Palacio, reitor da Uenf, tanto no painel do dia 29, quanto no Folha no Ar do dia 31 de agosto?

Francisco Roberto – A discussão sobre a administração eficiente dos recursos públicos, ainda mais se envolve o pagamento de salários de servidores, é crucial para o desenvolvimento de qualquer município, principalmente se a administração pública encontra dificuldades em honrar seus compromissos com o pagamento do funcionalismo e demais despesas. A pergunta que se faz é qual o tamanho das despesas de pessoal no orçamento municipal e como reverter a situação? A dificuldade para equilibrar o orçamento resulta na precarização dos serviços públicos, na baixa competitividade para geração de empregos e atração de investimentos.

José Renato – O servidor municipal está a mais de oito anos sem reajuste, em detrimento do reajuste anual do salário mínimo. Portanto, já vem dando sua parte. Contudo, a estabilidade do servidor não engessa o gasto com pessoal. É o que elenca a Carta da República de 1988, em seu artigo 169, §4º. Então, para redução dos estáveis, é necessário primeiramente: 1- redução em 20% dos cargos em comissão e funções de confiança e 2 – que sejam exonerados os servidores não estáveis. E, quanto ao “pacto”, este deve ser feito entre a sociedade, os eleitores, com o futuro alcaide que terá nas mãos o poder de mudança.

Tezeu – O “pacto” mencionado pelo Prof. Raul Palacio sugere a ampliação da simbiose entre a Prefeitura e as universidades, ampliando possibilidades de estágio de alunos, entre outras propostas. Não o vi mencionar corte de pessoal. No entanto, há gatilho para isso na Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas primeiro o município precisa colocar em prática uma série de tentativas para equilibrar o orçamento, dentre as quais a diminuição dos cargos indicados. Para além disso, há a “demonização” do servidor público. Saúde e educação, áreas que todos concordamos que são fundamentais, não são feitas com robôs, mas servidores públicos.

 

Edson Braga, do Sepe; Elaine Leaõ, do Sirprosep; e José Roberto Crespo, do Simec

 

Folha – No último painel do dia 12, apenas com juristas, o promotor Marcelo Lessa defendeu que qualquer corte em pessoal só poderia ser dar após a cobrança, via execução fiscal, de todo o ativo tributário pendente do município. Já o advogado Cristiano Miller, presidente da OAB-Campos, e o juiz Rodrigo Rebouças disseram não ver alternativa que não passe pelo enxugamento da folha. Enquanto o defensor público Tiago Abud falou em “abrir um canal de negociação”, também defendendo o pacto. Como você vê?

Francisco Roberto – Um pacto, envolvendo toda a sociedade, é salutar para discutir o desenvolvimento e crescimento econômico do município, de forma a atrair novos investimentos e renda para os trabalhadores. Mas não podemos esquecer que o ajuste de contas do município é um primeiro passo. Por isso, a Firjan defende em todos os planos, municipal, estadual e federal, a implementação das reformas estruturais, como a tributária e administrativa, de forma integrada. Isso envolve, além dos governos, as Casas Legislativas, como o Congresso Nacional, Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro e a Câmara Municipal.

José Renato – O ativo tributário segue em execução, sob pena de responsabilidade por parte dos procuradores municipais. Mas com a crônica lentidão do Judiciário, não se pode prever qualquer receita neste sentido. O servidor estável concursado é o guardião da administração pública, é seu maior patrimônio. A coalizão tem que ser firmada com toda sociedade, neste momento democrático eleitoral. A futura gestão está obrigada ao pacto da eficiência, legalidade, impessoalidade e principalmente da criatividade.

Tezeu – Em momentos difíceis como esses, sem dúvida o diálogo é fundamental e saber ouvir posições divergentes também. Um pacto requer um grupo realmente multidisciplinar, mas às vésperas das eleições vemos os atuais representantes estão mais preocupados em mantes os seus mandatos, do que de fato com o futuro do povo de campos.

 

Cristiano Miller, presidente da OAB-Campos; promotor Marcelo Lessa, juiz Rodrigo Rebouças e defensor público Tiago Abud

 

Folha – Arquiteto do ramo da construção e incorporação, Ricardo Paes Teixeira falou da necessidade de impor ponto biométrico rigoroso, suspensão de benefícios e programa de demissão voluntária, como já é feito nas estatais. Em painel de 22 de agosto, o empresário José Francisco Rodrigues, presidente da CDL-Campos, também. Na gestão Rafael, o ponto biométrico e a suspensão de gratificações geraram reação na categoria médica, cuja última greve só foi interrompida por conta da pandemia. Essas medidas não são inevitáveis?

Francisco Roberto – Acredito que eficiência na gestão pública é fundamental e, para isto, é necessário dispor dos melhores instrumentos. Mas essas ferramentas e condutas só podem ser implementadas depois de um profundo diagnóstico da estrutura administrativa do governo municipal. Acredito que esse é um passo imprescindível para quem quer que assuma a Prefeitura nos próximos quatro anos. Só com esse conhecimento é possível verificar qual o melhor caminho a seguir.

José Renato – Um programa de demissão voluntária (PDV), desde que seja rentável ao servidor e vantajoso para a administração, é perfeitamente aceitável dentro do pacto proposto, servindo de pacificador para os que não aceitam o ponto biométrico. Mas, é preciso atenção, para que não sejam posteriormente “substituídos” politicamente pelos que se valem do Regime de Pagamento Autônomos, os RPAs. A redução do quantitativo de RPAs e DAS é tão necessária, quanto inevitável. Porém, não podemos demonizar o servidor, a culpa não é sua. O servidor não contrata ninguém.

Tezeu – Vivemos uma grande hipocrisia, com pessoas falando mal de políticos e do serviço público, acusando-os de corrupção e defendendo privatizações. E ao mesmo tempo vemos esses mesmos fraudando ponto e fazendo corpo mole para trabalhar. Claro que toda generalização é ruim e injusta, mas a tão falada ineficiência da máquina pública é uma falácia, pois ainda garantem atendimento ao nosso povo. É dever do servidor público prestar um bom serviço e cumprir seu horário de trabalho, logo existirem ferramentas de acompanhamento eficientes é totalmente justo e correto, porém não posso corroborar com programas de demissão voluntária.

 

Página 10 da edição de hoje da Folha da Manhã

 

 

Tezeu, José Renato e Francisco Roberto

 

Folha – Os empresários se colocaram contra a possibilidade aumento da carga tributária. Já entre os sindicalistas, não houve consenso quanto à possibilidade do enxugamento dos equipamentos. Edson e José Roberto se mostraram abertos à análise racional da questão, enquanto Elaine defendeu até o Cepop e a Cidade da Criança. De novo, é necessário um pacto? Em que termos?

Francisco Roberto – Nós, da Firjan, somos contra o aumento de carga tributária e também acreditamos que nosso sistema tributário precisa ser mais eficiente. Por isso, sempre falamos da necessidade da inclusão dos impostos estaduais e municipais, como ICMS e ISS, no IBS, Imposto sobre Bens e Serviços. A desoneração da folha de pagamento, ainda que parcial, também é fundamental para um sistema tributário mais eficiente. Nosso sistema tributário brasileiro gera extrema desigualdade entre os setores econômicos, regressividade e guerra fiscal entre os estados. Apenas a indústria da transformação paga 44,6% do seu PIB em impostos. Sem dúvidas, aumento de impostos não é o caminho.

José Renato – IPTU, ISSQN, ITBI, taxa de iluminação, repasse do IPVA, repasse à Receita Federal, participação de ITR, repasse fundo do especial dos municípios, repasse de verbas do SUS, royalties, repasse do Fundeb, recuperação de créditos judiciais. É preciso dizer um gigantesco NÃO para aumento de impostos ou taxas. O município precisa caber no seu novo orçamento com redução de despesa, tais como: implantação do sistema digital de processos, pregão eletrônico, agências digitais do Procon, ouvidorias, entre outros. Concessão do Cepop, Cidade da Criança, Trianon e Aeroporto.

Tezeu – O papel do Estado é justamente escolher de quem e quanto vai recolher em imposto e para quem, quanto e como ele vai repassar essa arrecadação. E, sim, precisamos de uma reforma tributária que coloque taxação em grandes fortunas e taxação sobre lucros. Culpabilizar o funcionalismo público pela crise financeira do Brasil é mais uma das mentiras da burguesia nacional, que acostumada com sua formação escravocrata se nega veementemente em arcar com um projeto nacional que garanta saúde e educação de qualidade para sua população. As análises sobre a situação econômica de Campos são, de modo geral, feitas de maneira equivocada, por duas razões principais. A primeira é a má leitura sobre as políticas realizadas com os recursos dos royalties. E a segunda é sobre o próprio movimento da economia do petróleo na região.

 

Construído por R$ 100 milhões, o Cepop é considerado pela população como monumento a desperdício de dnheiro público (Foto: Folha da Manhã)

 

Folha – Campos tem 14 mil servidores concursados na ativa, ao custo de R$ 60 milhões/mês. E outros 4,5 mil inativos, ao custo de R$ 15,5 milhões/mês.  No último dia 3, o governo Jair Bolsonaro (sem partido) enviou ao Congresso sua proposta de reforma administrativa. Os acordos já feitos têm que ser respeitados? Como impor produtividade com as regras atuais?

Francisco Roberto – Os recursos humanos que os municípios precisam hoje são diferentes dos de décadas atrás. É necessário entender isso que para se adequar a essa nova realidade. É preciso aproveitar o momento em que o país discute questões relacionadas ao federalismo fiscal para que também repensar o Fundo de Participação dos Municípios. Não cabe mais permanecer com o critério apenas de repartição com base no tamanho da população. É preciso incluir nos debates a capacidade de arrecadação de receita dos municípios por meio da economia local. Isso forçará as prefeituras a cobrarem mais eficácia em seus processos.

José Renato – Quem é o servidor número 1 do município? O prefeito é o servidor mais dispendioso aos cofres. Recebe o maior salário, tem o maior gabinete, assessores, secretarias, carros com motorista, carro com seguranças, etc. O local menos provável de encontrá-lo é em seu gabinete. Tem sido assim nos últimos tempos. Como cobrar produtividade com o exemplo que se dá? Mesmo assim, acordos têm que ser observados e cumpridos. Em casos de inassiduidade habitual, improbidade ou insubordinação grave em serviço, o servidor público pode ter rescindido o contrato com o devido processo legal administrativo.

Tezeu – A atual reforma administrativa proposta pelo governo federal nada mais é do que mais um passo para a destruição do serviço público no país. Quando se realiza corte nessa magnitude no funcionalismo público, o que se faz em realidade é destruir a saúde e a educação pública. Obviamente o grande empresariado nacional, sem nenhum vínculo com um projeto de nação, encabeça esse processo para poder lucrar com os planos de saúde e as escolas privadas. A proposta ainda será debatida pelo Congresso Nacional e, mesmo se aprovada, ela só pode valer somente para novos concursos. Isso não depende da minha vontade ou da de ninguém, é a lei.

 

Congresso Nacional recebeu no dia 3 a proposta de reforma administrativa do governo Jair Bolsonaro (Foto: Daniel Marenco – Agência O Globo)

 

 

Folha – Em painel do último dia 5, a diretora do Isecensa, Beth Landim, propôs a reengenharia do serviço público municipal. “Ter métricas de desempenho permite a reavaliação do trabalho e não do emprego, para melhor atender ao cidadão. Digitalização de serviços prestados e autoatendimento. A rede privada precisa cortar custos de pessoal e aumentar a produtividade”. Qual a sua opinião?

Francisco Roberto – A Firjan sempre defendeu medidas que buscam simplificar a burocracia do serviço público, trazendo melhoria operacional e corte de custos. Tais medidas ajudam na atração de novos negócios. Há diversos tipos de ações públicas de integração, como registro empresarial e informatização dos processos, que agilizam o aumento da produtividade e a competitividade empresarial. Com a pandemia, as empresas e o serviço implementaram inovação e tecnologia no dia a dia das suas atividades. Não podemos perder essa oportunidade e devemos avançar ainda mais para facilitar a vida do empresariado e do cidadão campista.

José Renato – Perfeito. Comungo efetivamente com este mesmo sentido. Digitalização dos serviços é a chave mestra da eficiência, moralização, transparência e com redução de pelo menos 40% dos custos, em aquisição de serviços e produtos. Estamos na era do token e o setor público ainda usa o carimbo. Resta saber se o lobby dos fornecedores e principalmente dos empreiteiros locais não vão impedir a implantação, uma vez que com os processos digitais vai acabar com aquela história de só o amigo do amigo do prefeito realizar obras e terem a preferência no recebimento. É o toma lá, dá cá!

Tezeu – Sempre há espaço para inovar, ampliar a digitalização e a eficiência no setor público, provendo um serviço mais rápido e de melhor qualidade para o cidadão. Devemos investir em inovações nesse sentido em Campos. Mas a pergunta parte do pressuposto de que não há produtividade atualmente no setor público. De onde sai esta informação?

 

 

Folha – Em entrevistas ao programa Folha no Ar quase todos os pré-candidatos a prefeito de Campos entrevistados falaram em necessidade de redução da máquina municipal. Mas nenhum deles deu detalhes de como e onde. Qual a sua visão?

Francisco Roberto – Acho que estruturas administrativas sempre precisam de constante revisão e reavaliação, seja no setor público ou no setor privado, porém, como dito anteriormente, apenas com um diagnóstico bastante aprofundado da estrutura é possível definir como fazer isso com eficiência e sem prejudicar os serviços prestados à população.

José Renato – Quando o candidato a prefeito bate à sua porta, para conquistar o voto, ele faz um trato com o eleitor, apresentando suas promessas. Proponho um contrato social a ser firmado com todos os candidatos, formulado pela sociedade civil organizada, com as seguintes cláusulas: 1 – redução em 30% dos cargos de confiança; 2 – redução em 30% dos RPAs; 3 – implantação do pregão eletrônico de forma geral e irrestrita; 4- implantação dos processos administrativos digitais; 5 – redução em até 50% dos imóveis locados; 6 – redução em até 30% da frota de veículos; 7- acordo para reduzir repasse à Câmara.

Tezeu – Analisando a trajetória econômica do município de Campos, fica muito claro que a questão não está em reduzir o funcionalismo público. Pelo contrário, são justamente esses trabalhadores que garantem parte importante da economia da região. A questão fundamental é fortalecer a renda e o consumo dos trabalhadores, o que passa tanto pelo fortalecimento da Petrobras e da retomada dos seus investimentos, quanto da utilização dos royalties e participações especiais para a população. Por isso cabe à Prefeitura de Campos uma pressão direta na Petrobras para a retomada dos investimentos nos campos da região, assim como um projeto de desenvolvimento regional que tenha os trabalhadores como eixo central.

 

Folha – Um ponto questionado é o número atual de mil DAS, ao custo de R$ 3,2 milhões/mês, e de 4 mil RPAs, ao custo de R$ 6 milhões mês. Presidente do Siprosep, Elaine Leão denunciou: “A maioria dos cargos RPAs e de DAS são indicados pelos vereadores”. No painel de 22 de agosto, ela foi endossada pelo sociólogo José Juiz Vianna da Cruz: “que os prefeitos e vereadores desenvolvam outras fontes de poder político-eleitoral que não a drenagem dos recursos do município para seus interesses particulares”. Como vê a questão? Esses não concursados deveriam ser os primeiros atingidos por um eventual corte?

Francisco Roberto – A questão de pessoal é um problema crônico das cidades brasileiras. Segundo o último IFGF (Índice Firjan de Gestão Fiscal), 49,4% dos municípios do país estão em situação crítica, ou seja, cidades gastam mais de 54% da receita com pessoal. Por isso, independente das questões políticas envolvidas, é necessário repensar essa estrutura para manter a capacidade de investimento.

José Renato – Conforme já dito, a Constituição Federal prevê, se necessária, a dispensa de pessoal para não exceder os limites estabelecidos em lei. Por óbvio, aqueles que são contratados somente por extrema necessidade e por tempo determinado são os RPAs, serão os primeiros no corte. Após, vem à redução dos cargos e função de confiança (DAS) e por fim os novatos em cargos concursados. É a ordem legal. Sem qualquer tipo de perseguição ou politicagem. Nenhuma fonte de verba municipal deve ser usada para atender os apadrinhados do prefeito. Isso é uma utopia, eles se colocam como dono do cofre.

Tezeu – Há uma demonização dos cargos de assessoria ao Legislativo e ao Executivo, nos âmbitos municipal, estadual e federal. Em geral, assessores cumprem um papel importante na formulação de propostas legislativas e no acompanhamento das necessidades do município. Estas funções não constituem “interesses particulares” dos vereadores, mas sim necessidades do exercício do mandato, pois o vereador não dá conta de tudo sozinho, precisa de uma equipe competente e eficiente. No entanto, sim, é preciso que a capacidade do município em arcar com cargos de RPA e DAS se ajuste à capacidade fiscal do município.

 

FRed Machado, Nelson Nahim, Marcão Gomes e Rogério Matoso

 

 

Folha – No painel de 26 de agosto, com o presidente e ex-presidentes da Câmara Municipal, o atual, vereador Fred Machado (Cidadania), questionou: “Afirmar que os DAS e RPAs são indicações de vereadores não é verdadeiro”. Já seu antecessor e ex-prefeito, Nelson Nahim (MDB) admitiu: “Quanto à indicação de nomes para cargos comissionados por indicação de vereadores, sempre existiu na formação de uma base parlamentar”. Por sua vez, hoje deputado federal, Marcão Gomes (PL) ressalvou: “Sem essa força de trabalho (DAS e RPAs), o município não consegue manter todos os serviços”. O que concluir?

Francisco Roberto – Qualquer reforma deve ser pensada com foco na eficácia administrativa. As reduções de pessoal devem ser feitas levando em conta que os serviços prestados à população não podem ser prejudicados. Mas acredito que seja possível, sim, fazer ajustes para tornar a administração municipal mais eficiente.

José Renato – Realmente nem todos que são da Direção Assessoria Superior, os DAS, ou RPAs, são indicação dos vereadores ou dos vereadores derrotados. Mas eles não têm asas, não surgiram no setor voando. Alguns são da indicação do próprio prefeito, aqueles que o serviram na campanha, os famosos “companheiros de caminhada”. São os que entram primeiro. Depois vêm às indicações dos vereadores, mas essas nomeações são concedidas a conta gotas, afinal eles têm que ficar “amarrados ao prefeito” por quatro anos. Alguns são até necessários, mas para cada RPA que entra um concursado descansa.

Tezeu – É uma cópia do modelo utilizado entre Legislativo e Executivo federais, onde existem concursados especialistas nas áreas. E estas pessoas, de acordo com o currículo, são colocadas em gabinetes de parlamentares, ministros e secretarias para desenvolver o trabalho técnico necessário. Porém, sem que exista um modelo de substituição por concurso ou por realocação de pessoal, fica impossível retirar os RPAs e DAS. Eles devem ser reduzidos ao máximo, pois acabam servindo, sim, de “toma lá, dá cá” para políticos indicarem “os seus”. Claro que estou falando em redução e não em extinção, pois deve haver uma equipe de confiança dos gestores.

 

 

Folha – No painel com o presidente e ex-presidentes do Legislativo goitacá, sobre a possibilidade deste funcionar abaixo do teto máximo de 25 cadeiras, ao custo de R$ 100 mil por mandato, Nahim e Rogério Matoso (DEM) foram favoráveis, enquanto Fred e Marcão, mais reticentes. Fora da política partidária, todos os ouvidos até aqui, entre sindicalistas, empresários e professores universitários, são favoráveis à redução de vereadores. E você?

Francisco Roberto – A Firjan sempre defendeu a aplicação correta da Lei de Responsabilidade Fiscal para o controle do orçamento público. A busca por uma gestão mais eficiente, que garanta a transparência, a ética e a eficiência na utilização dos recursos públicos, é uma constante para a Federação. No entanto, os poderes são independentes. O país possui mais de cinco mil municípios, muitos dependentes das transferências federais. É fundamental que o Congresso Nacional discuta o tema, tornando a máquina pública cada vez mais eficiente para o cidadão.

José Renato – A Câmara é o Éden na terra, o paraíso político. Com R$ 33.501.000,00 só para gastar, tem rádio Câmara, tem TV Câmara, tem escola, gasta 26 milhões de reais só com pessoal.  Com a função constitucional de fiscalizar o Poder Executivo, não vejo necessidade alguma de mais de 15 cadeiras para tanto. Mas, sabemos o que importa mesmo é o coeficiente eleitoral. Divide-se o número de votos válidos pelo número de cadeiras, acha-se o mínimo necessário para fazer um vereador. Logo, quanto mais cadeiras, menos votos necessários para eleger um. No fundo, é isso que interessa.

Tezeu – Apesar de ser uma possibilidade aparentemente boa quando se tem um maior número de cadeiras no parlamento o povo fica mais representado, logo eu sou contra redução. E comentando a posição dos que defendem isso, é preciso garantir que os futuros mandatos que “deixem de existir” não sejam aqueles que representam os mais pobres, as mulheres, os negros, os trabalhadores, ou seja, a possível redução não pode comprometer a representação daqueles que já são sub-representados na política.

 

(Infográfico: Eliabe de Souza, o Cássio Jr com dados levantados por Joseli Mathias)

 

Folha – Em valores corrigidos pelo INPC, Campos recebeu de royalties e participações especiais R$ 4,67 bilhões de 1999 a 2004, nos governos Arnaldo Vianna (PDT); 6,94 bilhões de 2005 a 2008, nas gestões Alexandre Mocaiber (sem partido); e 12,06 bilhões de 2009 a 2016, nas administrações Rosinha Garotinho (hoje, Pros). Em conta que desce a ladeira para 2021, Rafael teve, até o primeiro trimestre de 2020, R$ 1,84 bilhão. Juntos, os três prefeitos anteriores tiveram 23,67 bilhões. Acredita que os mais de 507 mil campistas tenham a noção da chance histórica que a cidade desperdiçou?

Francisco Roberto – Como citado em resposta anterior, a Firjan sempre defendeu a aplicação correta dos royalties e participações especiais, trazendo dinamismo e desenvolvimento para o município. Esse recurso finito deve ser investido para reforçar ou criar novos polos econômicos na cidade, gerando renda e trabalho, e evitando que o município seja dependente dessas transferências. A fiscalização para o bom uso do recurso público é função de toda a sociedade. Agora mesmo, a Petrobras anunciou a descoberta de óleo em área de Pré-Sal na Bacia de Campos. Ou seja, novos recursos vão chegar e devem ser bem aplicados pela gestão municipal.

José Renato – R$ 23,67 bilhões são valores que impressionam. Mensurar isso tudo com o retorno necessário para a realização em obras, ao pacto social, da necessária qualidade nos transportes públicos, em saneamento básico, moradia, cultura e geração de emprego. Contudo, quando você anda pela cidade, bairros e distritos, se pode observar facilmente que nada funcionou. Olhe para os dados sociais, os índices da educação que patina, e nada é 100%. Penso que o povo não tem essa noção.

Tezeu – De fato, Campos poderia ter utilizado melhor os recursos de royalties e participações especiais quando estes estiveram no auge, criando formas sustentáveis que garantissem riquezas também para as próximas gerações, como na forma de fundos em saúde e educação. A visão generalista dos recursos do petróleo é de que houve muita corrupção e desperdício com um inchaço na máquina pública. Essa análise é equivocada. A bonança que Campos passou no começo dos anos 2000 foi fruto das políticas do governo federal. A economia do setor de petróleo e gás é apresentada em muitas análises como algo dado naturalmente, com começo, meio e fim imposto por causalidades geológicas. Entretanto, o grande diferencial para a descoberta e duração de um campo de petróleo, principalmente em águas profundas como na Bacia de Campos, está no nível de investimento e de conhecimento acumulado.

 

Colheita mecânica da cana na Coagro (Foto: Divulgação)

 

Folha – Campos começou sua colonização contínua em 1632, com o plantio da cana, seu eixo econômico até o ciclo do petróleo, cujo primeiro carregamento comercial se deu em 1977, em campos hoje maduros. Que não retomarão o auge de produção e com a perspectiva de aprovação da partilha dos royalties no STF. Foi um erro abandonar a vocação agropecuária do município? Retomá-la é uma saída?

Francisco Roberto – Sem dúvida, acredito que é necessário criamos formas de incentivar a indústria sucroalcooleira, que sempre foi um setor estratégico e essencial da economia do município. Este ano temos a expectativa é de moer 1,7 milhão toneladas de cana, 40% a mais que no ano passado. Porém, este número ainda deixa nosso parque industrial com capacidade ociosa. É menos da metade de nossa capacidade. Tudo isso porque falta matéria prima. Sendo assim, é preciso pensar em incentivos e maneiras eficazes de fazer com que a agroindústria se torne cada vez mais estratégica e o município tem papel fundamental nesse processo.

José Renato – Sim, sem sombra de dúvidas. Hoje a população campesina é de apenas 9,71%, segundo o IBGE. Mas com a modernidade e as vias existentes, não é impedimento para as atividades e produção no campo. Deve ser retomada com incentivo financeiro e técnico para agricultura familiar e o pequeno agricultor. Exemplo de sucesso na produção agrícola é o 5º Distrito do município vizinho de São João da Barra, que fornece alimentos para o Ceasa Rio, com produção de hortifrutigranjeiros de causar inveja. O mercado é tomador. Ao se produzir com qualidade e eficiência, a renda é certa e o emprego garantido.

Tezeu – Apesar de termo que combater veementemente a raiz escravocrata que até hoje é enraizada na cultura da elite campista, não podemos confundir os papeis, pois a agropecuária é um forte braço da economia do país e deveria, sim, ter sido preservada. É uma saída super possível para retomada nesse momento de crise. Temos o açúcar, o álcool e a própria pecuária que poderiam e deveriam ser fomentadas com um forte incentivo dos governos municipais e estaduais, já que o federal, absurdamente, está abrindo cada vez mais as portas para importação de álcool vindo dos Estados Unidos.

 

 

Folha – Além da retomada da produção do campo, uma opção até aqui unânime para diminuir despesas nas compras e dificultar a corrupção é o pregão eletrônico. Cujo adoção o governo federal tornou obrigatória por decreto, condicionando sua utilização aos repasses a estados e municípios. Nas prefeituras de Macaé e Niterói, gerou economia de até 40% nas compras. Há motivo confessável para ainda não ser integralmente adotado rem Campos?

Francisco Roberto – Qualquer ferramenta que torne a estrutura pública mais eficiente e menos burocrática deve ser adotada de forma sistemática. O pregão eletrônico é uma dessas ferramentas. Acredito que deva ser uma opção a ser levada em conta na próxima gestão, sem dúvidas.

José Renato – Vamos confessar os motivos pelos quais ainda não foi e talvez nem seja implantado o necessário pregão eletrônico. As licitações de grandes valores, tanto para serviços como para materiais são sempre “combinadas”. O pregão eletrônico é a forma mais democrática, moral e transparente para aquisição das necessidades publicas gerando uma economia considerável. Mas, como ficam as empreiteiras locais ou não que “ajudaram na campanha”? O lobby é forte e os interesses inconfessáveis, maiores!

Tezeu – Não há desculpas para ainda não ter sido feita essa mudança. Na minha visão deve constar no plano de governo de todos os candidatos esse compromisso.

 

Folha – Seja para gerar receitas ou diminuir as despesas do município, enxerga alguma alternativa até aqui não tratada? Qualquer uma delas não teria que passar e aproveitar a condição de polo universitário de Campos?

Francisco Roberto – A pandemia da Covid-19 e o isolamento social trouxeram muitos desafios. Porém, em pouco tempo, vimos o poder de resiliência de algumas indústrias. O uso da inovação e dos recursos tecnológicos avançaram décadas nestes 10 meses. Não podemos ficar de fora desse movimento. A Firjan integra o TEC Campos, que abriga empreendimentos de base tecnológica. É fundamental apoiar e avançar nessa área, que pode fornecer soluções tanto para o campo quanto para empresas de óleo e gás, um setor altamente demandante de tecnologia avançada e profissionais qualificados.

José Renato – A questão é que sempre ficamos nas mãos de um só: o prefeito. É o nosso sistema presidencialista. A única alternativa que vejo seria os candidatos assinaram compromisso dentro do pacto social, de implantar parte do que a sociedade que o elegeu quer: redução das despesas. O polo universitário, como fonte inesgotável do saber, entrega ao gestor, sem custo, toda criatividade necessária para uma gestão de excelência, mas é preciso sabedoria, honestidade e humildade para consentir.

Tezeu – De fato, Campos é um polo universitário, o que estimula não só a atividade econômica do município como também faz com que a cidade abrigue muitas pessoas com escolaridade alta, que aqui fazem a sua formação. Campos pode pensar em alternativas para ser não só cidade de passagem para estes estudantes, mas pode também pensar em retê-los, pois são mão-de-obra extremamente qualificada.

 

Página 11 da edição de hoje da Folha da Manhã

 

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